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Massacre de Pau d´Arco: Jane Júlia, presente!

por CEBI Publicações*

Este é o relato da única pessoa sobrevivente da chacina de Pau d´Arco, no Pará, episódio que aconteceu em 2017, e segue sem a identificação dos supostos mandantes da operação. O texto comovente que você vai ler em seguida integra o livro Bem-aventuradas as vidas que defendem os Diretos, a Justiça e a Paz, disponível na Livraria Popular do CEBI.

Boa reflexão!

Jane Júlia, presente!

Era tarde do dia 23 de abril de 2017 quando alguns poucos e resistentes acampados e acampadas decidiram voltar às terras das quais há pouco haviam sido despejados/as pela força policial, na Fazenda Santa Lúcia – município de Pau d´Arco (Pará). Foi a sensação de abandono que os tomou por inteiro, ao visualizarem a devastação de seus antigos lares. Destroços das casas, roçados, pequenas criações. Agora, existiam apenas fragmentos do que se foi. Com a desistência de alguns, pouco mais de uma dezena de pessoas decidiu permanecer no local e recomeçar a dar vida a sua comunidade.

A noite caiu e o amanhecer do dia 24 de abril de 2017 ficou marcado como o momento em que ocorreu o 2º pior massacre por conflito agrário desde a chacina de Eldorado dos Carajás, em 1996. Dez trabalhadores rurais (uma mulher e nove homens) foram brutalmente assassinados na fazenda Santa Lúcia.

Os assassinatos integram uma estatística que coloca o Pará como o Estado em que mais se cometem assassinatos contra defensores e defensoras de direitos humanos.

O Brasil, em si, é campeão de assassinatos de ativistas e defensores do meio ambiente no mundo, de acordo com a ONG Global Witness. Entre 2010 e 2015 ocorreram 210 mortes e 300 tentativas de homicídio devido a conflitos de terra. Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostram que dos 846 assassinatos ocorridos no Estado do Pará desde 1980, 65% deles sequer foram investigados. Em 2017, foram assassinadas 70 pessoas em conflitos no campo no Brasil – 21 delas só no Pará.

Um dos sobreviventes do massacre de Pau d´Arco (cuja identidade será preservada por motivo de segurança) é prova-viva do que significa lutar pela terra nos rincões do estado. Acampados na fazenda Santa Lúcia, sob forte chuva e dividindo uma lona improvisada, o grupo ouviu a chegada da polícia – mas não se assustaram, porque era comum a passagem dela para acompanhar a situação do acampamento. “Dava pra ouvir eles chegando. Daí escutei: ‘não corre não, se não vai morrer, bando de bandido. Foram falando e atirando, não deu chance nenhuma. Ali, como a gente estava, dava pra prender todo mundo, sem ter matado e batido em ninguém. Foi um susto tão grande, que o pessoal se embolou por cima da lona, um caindo por cima do outro. Quando eu consegui levantar pra correr, levei um tiro nas costas e caí. Eu olhei, tinha um matinho, uma moita, eu consegui ir pra lá.

Escondido atrás de babaçus, a uns 15 metros do local dos assassinatos, a fonte ouviu o espancamento e morte violenta de cada um do grupo de dez pessoas. “Se eu olhasse pra trás, dava pra eu ver, mas eu estava em choque, só ouvindo eles pisando, massacrando, batendo nos meninos, muita pancada e tiro e humilhação. E a dona Jane [Jane Júlia de Oliveira, a única mulher entre os assassinados], ‘não, não faz isso com os meninos, não’. E eles, ‘era tu que nós queria mesmo’ [ela era liderança do acampamento].

Eles atiraram muitas vezes na dona Jane [que também teve a perna quebrada]. Eu escutei os meninos chorando, dizendo ‘por favor, a gente não vai correr não, a gente está quieto, senhor’. E aí começaram a atirar. Atiraram muito. Mas foi coisa de muito tiro, fiquei sufocado com aquele cheiro de pólvora. Fiquei escondido no capim, esperando, a polícia rodeando, atirando. Eles riam, riam”, destaca, desolado.

Ao todo foram executados: Jane Júlia de Oliveira, Oseir Rodrigues da Silva, Hércules Santos de Oliveira, Regivaldo Pereira da Silva, Ronaldo Pereira de Sousa, Bruno Henrique Pereira Gomes, Antônio Pereira Milhomen, Nelson Souza Milhomem, Weldson Pereira Milhomem e Weclebson Pereira Milhomem.

Dos 29 policiais que participaram da operação, 17 deles (13 militares e 4 civis) foram os responsáveis pela execução dos trabalhadores. Todos foram denunciados pelo Ministério Público do Estado do Pará e encontram-se presos. A previsão é que o caso vá a júri popular em 2019. Mas passado um ano do massacre, as investigações não conseguiram, ainda, identificar os supostos mandantes da operação criminosa. A impunidade que beneficia os mandantes dos crimes é também uma das causas da continuidade da violência no campo.

A averiguação do processo segue em curso. Assim como a tenacidade do sobrevivente de Pau d´Arco em resistir, denunciar e levar à condenação os executores e mandantes dos assassinatos de seus companheiros e companheira. Assim como as lutas no sul e sudeste do Pará pela reforma agrária, pelo direito à terra; enfim, o direito de assentar a vida. Assim como também insistem em saltar faíscas-resistência dos olhos de trabalhadores rurais daquele bicromático preto-branco das fotografias do livro “Terra”, publicada nos anos 1990 por Sebastião Salgado. É o brilho-propulsor da gana de voltar e fincar o nome do acampamento como “Jane Júlia” e reescrever a história. Só pode ser gente que traz na pele essa marca e possui a estranha mania de ter fé na vida.

Foto de capa: Publicada no site de Koinonia.

Bem-aventuradas as vidas que defendem os direitos, a justiça e a pazEste relato foi publicado originalmente no livro Bem-aventuradas as vidas que defendem os Diretos, a Justiça e a Paz. O livro é uma parceria entre a CESE e o CEBI. Esse texto forte e comovente que você acabou de ler, integra um dos oito roteiros de estudos sobre as Bem-aventuranças.

???? Neste livro você também encontra:
– estudo bíblico sobre as Bem-aventuranças;
– 08 roteiros para estudo individual das Bem-aventuranças;
– 08 depoimentos sobre direitos;

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