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Literatura Sapiencial, a Sabedoria de Deus na Vida do Povo

por João Santiago*

A Literatura Sapiencial, nas Sagradas Escrituras, parece querer nos dizer que a Sabedoria de Deus se manifesta e se realiza na vida do povo. Em favor do povo! É no dia a dia, nas alegrias e nas tristezas; nas lutas; nas vitórias e nas derrotas; nas esperanças e nas angústias; nas experiências e nas convicções do povo, que a sabedoria se faz: em espiritualidade, em convicções e em desafios e vitórias.

O povo, portanto, aprende enquanto caminha e caminha enquanto aprende. E o que aprende o povo? Aprende a discernir, a distinguir o que é essencial do que é secundário. O que o ajuda e o que o atrapalha na caminhada. Ainda mais, quem o ajuda, sendo apoio, reforço, referência e parceiro de confiança, e quem cria atalhos, bezerros de ouro (cf. Ex 32,1-6), desculpas e o desvia de seu caminho. É sabedoria caminhar com o povo. Desviá-lo, porém, do caminho da Terra Prometida é fraqueza, é adultério, é coisa de cabeça dura (Ex 32,9). É coisa de satanás (Mt 16,23), diria o Sábio de Nazaré.

Assim, é mais fácil entender porque existe um tempo para cada fase da caminhada, para se viver cada situação. Há um tempo para a oração, há um tempo para o ativismo, há um tempo para o estudo e há um tempo para o descanso (cf. Ecl 3,1-8). A Teologia do Êxodo parece querer nos dizer, e efetivamente nos diz, que a caminhada ensinou o povo a conhecer e a reconhecer Javé como seu verdadeiro Deus! (cf. Ex 6,7). Isto é sabedoria.

Na Bíblia dos católicos, são estes os livros sapienciais: Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos (Cantares), Sabedoria e Eclesiástico. É um acervo de experiências comunitárias e produções populares que comunicam um modo de viver e revelam a vivência de uma fé encarnada no dia a dia e na caminhada. Neste acervo, encontramos em Jó, uma nova experiência de Deus; poesia e música de caminhada, inclusive de subida para Deus, como nos Salmos 120 a 134. São os Cânticos de romarias; também temos instruções, conselhos, ditados populares, sabedoria do povo, que na Bíblia são conhecidos como Livro dos Provérbios; encontramos uma sistematização da sabedoria na terra (Ecl 8,16), sempre na alegria de se viver o dia de hoje, tida como sabedoria. É o Livro de Eclesiastes (Coelét); mas a sabedoria se manifesta e se faz presente no amor que se faz poema entre o amado e sua amada. Entre a amada e seu amado.

Ou seria no poema que se faz amor? É o Livro do Cântico dos Cânticos, onde o amor é forte, uma faísca de Javé. Também conhecido como Cantares, nele encontramos uma proposta nova na relação de gênero; a face feminina da Sabedoria está retratada na justiça e na prática do bem. “Amem a justiça, vocês que julgam a terra. Tenham bons pensamentos sobre o Senhor e o busquem na simplicidade do coração” (Sb 1,1). É o Livro da Sabedoria; a Sabedoria como a meditação da Lei e o sábio como aquele e aquela que medita; Eclesiástico (Sirácida) completa a coleção. Nesta coleção, a Palavra criadora e salvadora de Deus é a própria sabedoria.

Continuemos nosso diálogo e com perguntas que nos façam refletir. O que é sabedoria e o que é ser sábio? “É interessante notar que Jó, admirado como sábio e fiel a Deus, é um estrangeiro edomita (cf. Jó 1,1)” (BONH GASS, 2011, vol. 4, p 109). Trazendo uma mensagem muito atual para o nosso tempo, assim dizem os sábios que escreveram o Livro dos Provérbios, “Quando os justos são muitos, o povo se alegra; mas quando o ímpio governa, o povo se queixa” (Pr 29,2). É o povo, pobre, trabalhador, perseguido, exilado, preso e julgado com critérios específicos e condenado por antecipação, o que dá a identidade da justiça, da sabedoria e, por consequência, do rosto de Deus. É a injustiça contra o pobre que chega a Deus em forma de gritos e de lamentos (Ex 23,1-9; Lv 19,15-16).

Em tempos de exceção como o que vivemos em nosso país, onde criminosos e homens sem escrúpulos são chantageados pelas autoridades do poder judiciário para acusarem falsamente a inocentes em troca de benefícios (cf. 2Rs 21,1-16); lembremos o martírio de Estêvão (At 6,8-15); foi assim com Joao Batista (Mc 6,14-29). A sabedoria de Deus, através de sua justiça e de sua misericórdia, jamais foi neutra. Jamais se deixou manipular pela propaganda falsa que faz parecer justo o que é injusto e bom o que é mau. É sabedoria buscar e conhecer a verdade, porque dela vem a liberdade (Jo 8,31-32).

Igualmente, e seguindo a mesma linha de raciocínio, vivemos em uma sociedade que exclui as pessoas idosas e rejeita a sua experiência, sabedoria de vida feita, negando a sua importância e por vezes até a sua dignidade. Sabiamente, no entanto, nos alerta o Papa Francisco, na Exortação Apostólica GAUDETE ET EXSULTATE – GE – (Alegrai-vos e Exultai).

Ao nos lembrar “tamanha nuvem de testemunhas”, assim diz Francisco, mostrando-nos a proximidade entre sabedoria e santidade, “E, entre tais testemunhas, podem estar nossa própria mãe, uma avó ou outras pessoas próximas de nós (2Tm 1,5)” (GE nº 3). É sabedoria saber reconhecer a presença de Deus na beleza de um arrebol, seja ao amanhecer ou ao entardecer de um dia. É sabedoria aprender, seja com a rebeldia de um jovem que exige respeito pelos seus sonhos, seja com as rugas de um rosto que o sol queimou por muitas décadas ou pelos cabelos embranquecidos pela sabedoria do tempo.

Quando plantamos a nossa horta, sempre nasce junto uma erva daninha, mas frequentemente regada por nós mesmos, junto com a nossa lavoura. É sabedoria não querer arrancá-la enquanto o que plantamos ainda não tem raízes fortes. Jesus mesmo nos deixou esta lição ao falar do joio e do trigo (Mt 13,24-30). “Um inimigo é quem faz isso” (v. 28), disse o Agricultor de Nazaré. Assim também acontece quando a nossa lavoura é um grupo de oração de estudo, de lutas comuns ou até mesmo a família. Se a gente interrompe as atividades de interesse comum, para dar atenção a um único interesse, o grupo enfraquece juntamente com a defesa da causa comum. É sabedoria não enfrentar diretamente os que tentam desviar o povo de seu caminho, da mesma forma o é não arrancar a erva daninha no tempo errado. Depois, no tempo certo, cada um tem o seu destino certo.

O trigo vai alimentar o povo e o joio vai para a fogueira. Quando vemos alguém querendo aparecer, seja na Igreja, seja na comunidade familiar ou na luta social e política, a gente se agacha, invés de entrar na disputa. Que apareça a luz do Espírito de sabedoria e brilhe através dos carismas de cada um/a e na unidade repleta de diversidade. É sabedoria ter humildade e vale lembrar o Batista. Raras vezes vemos tanta humildade e tanta consciência da missão recebida. “É preciso que ele cresça e eu diminua” (Jo 3,30).

A Literatura Sapiencial mostra-nos que foi a Sabedoria de Deus quem criou tudo o que existe e que é igualmente ela quem nos chama para cuidar do planeta, como nossa casa comum, reconhecendo a Mãe-Terra como um ser vivo, morada de Deus como o Pai misericordioso de todos e de todas nós. Encerrarei esta breve reflexão, que deseja apenas contribuir humildemente no despertar para uma reflexão sobre a Literatura Sapiencial. E assim, Osvaldo Montenegro nos diz na música “A Lógica da Criação”, onde vemos teologia, poesia e sabedoria juntas: “E a mim que sou tão descuidado, não resta mais nada a fazer. Apenas dizer que não entendo, meu Deus como eu amo você”. Que a Sabedoria de Deus nos persiga.

Texto de João Santiago, Teólogo, Poeta e Militante. Membro do CEBI-Curitiba. Curitiba, 21 de junho de 2018.

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