Reflexão do Evangelho

A maldição da terra e das mulheres: Reflexões bíblicas Ecofeminista para pensar o mundo pós-pandemia.

A maldição da terra e das mulheres: Reflexões bíblicas Ecofeminista para pensar o mundo pós-pandemia

 Odja Barros

Pastora da Igreja Batista do Pinheiro (Maceió-AL), Teóloga feminista. Doutora em Teologia pela Escola Superior de Teologia (RS) e assessora do CEBI.

A epidemia do novo coronavírus e a COVID-19 nos obrigou a reconhecer a rede de vida que nos conecta com toda a criação. Mas, também revelou a mesma DOR e maldição que atinge o corpo da Terra e das Mulheres. Nas palavras de Vilma Piedade, DORORIDADE se refere a “dor preta” que interpela a noção de SORORIDADE que é política feminista em resposta a ideologia patriarcal que criou a ideia de antagonismo e rivalidade entre mulheres. Dororidade é a irmandade gerado na dor enfrentada pelas mulheres pretas em razão do sistema racista-patriarcal. O conceito de Dororidade, busca oferecer novos termos e pressupostos para o enfrentamento de violências herdadas da colonialidade antropocêntrica, patriarcal e racista que marca ausências, produz silêncio histórico para muitas dores e injustiças e violências sofridas. O racismo e machismo estruturais se conectam, gerando uma experiência de DOR comum do corpo da terra e das mulheres.

Há anos, nós, mulheres do movimento feminista e organização de direitos das mulheres tocam o alarme do impacto adverso provocado pelo sistema capitalista patriarcal. Nenhuma parte desse mundo permanece imune a seus danos.  Há muito também, as teologias feministas denunciam os efeitos danosos de uma teologia patriarcal. A visão dualista Andro-antropocêntrica que entende o ser-humano conjugado no masculino, como algo infinitamente superior e desconectado da natureza é, além de errada, profundamente perigosa. Poderíamos dizer que é suicida, pois nos leva a acreditar que podemos subsistir com base no domínio e no desprezo pelo cuidado, destruindo o tecido social e vital que nos sustenta. A pandemia atual está descaradamente enfatizando a urgência de questionar. desafiar e resistir ao capitalismo global dominante e as teologias sexistas e racistas que nos trouxeram até aqui.  Se não pararmos os efeitos destrutivos dessas “ideo-teologias” devastadoras, nossa existência e existência da terra será intencionalmente inviabilizada.

A narrativa bíblica das origens da criação do Gênesis produziu muitas imagens, símbolos, narrativas, projetos, poderes e maldições.  O modelo explicativo da origem do mal e pecado fornecido pela narrativa bíblicas de Gênesis 3, gerou a metáfora da inimizade entre a terra e a humanidade e lançou  maldição sobre o corpo da terra e das mulheres:  Deus disse ao homem: “Já que você deu ouvidos à sua mulher e comeu da árvores de cujo fruto eu lhe havia proibido comer, por causa sua causa a terra será amaldiçoada. (Gên.3:17). E disse para a mulher: “Vou lhe aumentar muito o sofrimento da gravidez. Entre dores de parti, você dará à luz os filhos. A paixão vai arrastá-la para o seu homem, e ele a governará”. (Gen. 3:16). Está lançada a maldição! Malditas estão a terra e as mulheres submetidas ao governo dominador de homens que buscam submeter e controlar seus corpos. Assim, a grande DOR da terra e das mulheres tem origem na Bíblia e suas leituras fundamentalistas, racistas e patriarcais.

É nessa tentativa de pensar o mundo e a fé cristã no mundo pós-pandemia, que proponho reflexões bíblicas Ecofeminista que possam propor outras linguagens e imagens de Deus que ajudem a romper com as imagens, símbolos e narrativas alternativas as linguagens e imagens colonizadas pela teologia capitalista-patriarcal. Neste sentido, resgato aqui, a linguagem feminina para falar de Espírito de Deus ou espírito criador: “RUAH”.

Ruah é a palavra hebraica para Espírito. No relato da criação, encontra-se em Gn.1:2 “e a Ruah de Deus pairava flutuava sobre as águas…” Também, em Gn. 2:7  “Então Deus fez o ser humano com o pó da terra e soprou-lhe nas narinas a Ruah de vida, e o ser humano tornou-se ser vivente.”  Tem importância o fato da palavra Ruah na língua semítica ser de gênero feminino. Oposta a tudo que é morto e estático, Ruah é termo que traduz movimento. Aquilo que põe as outras coisas em movimento. Remete sempre a algo dinâmico: vento, tempestade, folego, sopro, hálito ou força criadora. Ruah é tudo que supera o que é inerte, morto. Por isso a própria Ruah não é palavra que se defina ou traduza facilmente. Pode-se apenas dizer em movimento o que ela faz, provoca. Talvez por isso, sobre ela se disse: “Ninguém sabe de onde ela vem, e nem para onde ela vai. (João 3:8).

Na experiencia cristã, muita coisa se perdeu quando se traduziu a palavra Ruah para o termo grego “pneuma”, e principalmente mais tarde, quando se traduziu para o termo masculino latim” Spiritus”. É urgente que se recupere a força da palavra e do símbolo Ruah, seu caráter feminino de movimento que gera vida. Neste tempo de pandemia quando a vida respirável no planeta está ameaçada, devemos num grande sussurro e respiro, orar o Salmo 104: “Envias a tua Ruah e renovas a face da terra!”

Segundo escreveu Achille Mbembe, a humanidade, presa no cerco da injustiça e das desigualdades, antes da pandemia, já estava ameaçada de sufocamento e grande asfixia. E o maior entrave para a vida respirável para todas as pessoas no planeta, não é um vírus em particular, mas sim as escolhas que condenaram a maior parte da humanidade “a uma parada respiratória prematura”. Tudo que na longa duração do capitalismo colonizador, patriarcal e racista, vem forçando pessoas, comunidades e grupos humanos inteiros a uma vida pesada de respiração difícil e ofegante.

Para recompor uma terra habitável, com direito a vida respirável para todas as pessoas e comunidade humana, é preciso combater mais do que o vírus da COVID-19. É preciso enfrentar o vírus de uma religião cristã, que a partir de uma visão antropocêntrica e patriarcal desenvolveu uma relação e uma lógica de dominação e exploração da terra e dos seres viventes, que há séculos, vem condenando a morte por sufocamento e asfixia, populações, comunidades e grupos humanos inteiros. Concluo essa reflexão com a oração contida no Salmo 104:29-30: “Quando escondes o teu rosto e lhe retiras o fôlego (Ruah) morrem e voltam ao pó. Quando sopras o teu fôlego (Ruah), e são criados, e renovas a face da terra”. Que o sopro da divina Ruah, venha e renove a face da terra!

Odja Barros, Pastora da Igreja Batista do Pinheiro (Maceió-AL), Teóloga feminista. Doutora em Teologia pela Escola Superior de Teologia (RS) e assessora do CEBI.

Artigo publicado originalmente no Blog Campus do Sávio Almeida

situs judi bola AgenCuan merupakan slot luar negeri yang sudah memiliki beberapa member aktif yang selalu bermain slot online 24 jam, hanya daftar slot gacor bisa dapatkan semua jenis taruhan online uang asli. idn poker slot pro thailand

Seu carrinho está vazio.

×