Reflexão do Evangelho

Reflexão do Evangelho: “Senhor, dá-me sempre dessa água!”

Leia a reflexão sobre João 4,1-42, texto de Enzo Bianchi.

Boa leitura!

Depois de nos ter apresentado as tentações de Jesus e a sua transfiguração, no Ano Litúrgico “A”, a Igreja propõe, através de trechos do quarto Evangelho, um percurso que nos ajuda a aprofundar os valores do batismo. Hoje, meditamos sobre o encontro entre Jesus e a mulher samaritana, no qual se revelou o dom da água da vida.

De Jerusalém, Jesus deve voltar para a Galileia e poderia fazer isso subindo novamente o vale do Jordão. A estrada era mais plana, mais segura e permitia não ter que atravessar a Samaria, terra cujos habitantes há séculos eram tão inimigos dos judeus – que os consideravam impuros e hereges – a ponto de atormentá-los quando estes a atravessavam (cf. Lc 9,52-53).

Em vez disso – diz o texto – Jesus “tinha” (édei) que passar pela Samaria, um “dever” que expressa uma necessidade divina: em obediência a Deus, precisamente porque ele foi enviado não só para os judeus, Jesus atravessa essa terra para cumprir a sua missão. Por isso, receberá o insulto daqueles que não o entendem: “Tu és um samaritano e um endemoninhado!” (Jo 8,48). No entanto, Jesus aceita se encontrar com estes que são considerados inimigos e ímpios; ou, melhor, vai buscar esse povo desprezado e se faz samaritano entre os samaritanos, parando junto a um poço, como o samaritano da parábola parou junto daquele que tinha sido espancado pelos ladrões (cf. Lc 10,33-35).

Na hora mais quente do dia, ele chega à Samaria, “cansado da viagem”, e vai se sentar perto do poço de Sicar, o poço de Jacó (cf. Gn 33,18-20). Ele está cansado e com sede, mas não tem nenhum meio para tirar água. Chega, então, também uma mulher, que, talvez por causa do seu comportamento imoral publicamente reconhecido, é forçada a sair pela estrada naquela hora, para não esbarrar com aqueles que a desprezam. Jesus lhe pede: “Dá-me de beber”. Ao ouvir aquelas palavras na língua dos judeus, ela se admira: alguém que está na sua mesma condição de sedenta lhe pede de beber, pede-lhe hospitalidade, mas é um inimigo, alguém que deveria se sentir superior a ela. Uma mulher samaritana só podia esperar desprezo de um homem judeu; ele, ao contrário, faz-se mendicante junto dela. Eis a verdadeira autoridade vivida por Jesus: a sua capacidade – como indica o latim auctoritas, de augere – de aumentar o outro, de fazê-lo crescer.

Atônita, a mulher pergunta a Jesus: “Como é que tu, sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou uma mulher samaritana?”. Que rebaixamento! É isso que a surpreende e acende uma dinâmica relacional, em um face a face cordial, sem mais barreiras. Entre Jesus e a mulher, de fato, caiu um muro de separação (cf. Ef 2,14) ou, melhor, dois: um muro devido à inimizade entre samaritanos e judeus, e um muro cultural e religioso de injusta disparidade, que impedia que um homem, particularmente um rabi, conversasse com uma mulher. Mas, se uma pessoa não pode ir a Deus, é Deus que vai buscá-la, porque ninguém pode ser excluído do seu amor: Jesus narra isso com o seu comportamento.

Ele, intuindo que o diálogo promete ser um diálogo de qualidade, começa a intrigar a mulher: “Se tu conhecesses o dom de Deus e quem é que te pede: ‘Dá-me de beber’, tu mesma lhe pedirias a ele, e ele te daria água viva”. A mulher tem sede, Jesus tem sede, mas, na realidade, quem dá de beber ao outro? Há uma sede de água de Jesus e da mulher, tornada mais urgente pelo calor, mas há também outra sede que emerge lentamente…

Jesus sabe que há uma sede mais profunda e sabe que o poço simboliza a Torá, aquela parte das Escrituras que justamente os samaritanos consideravam como a única que continha a palavra de Deus e à qual deviam recorrer para viver como crentes. Jesus sabe também que essa mulher, figura da Samaria adúltera (cf. Os 2,7), tentou aplacar a sua sede por caminhos equivocados: teve vários homens, bebeu todo o tipo de água, vítima e artífice de amores equivocados…

E, assim, ele lhe revela a sua condição, mas sem condená-la, mas convidando-a a aderir à realidade e, consequentemente, a retornar ao Deus vivo. A samaritana, curiosa, quer saber mais: “Quem és tu que doas essa água viva? Por acaso, és maior do que o nosso pai Jacó? Realmente tens uma água que sacia para sempre? De onde tiras essa água viva?”. O patriarca Jacó não só tinha cavado aquele poço profundo, mas, de acordo com a tradição judaica, também tinha a força de fazer a água subir do poço apenas com a sua presença. Por acaso, Jesus é maior do que Jacó? Por acaso, poderá dar a água que sobe do poço, água viva?

A mulher aceita entrar no jogo e recebe em troca uma promessa extraordinária: “A água deste poço não sacia para sempre, a Lei de Moisés não sacia definitivamente, mas eu dou uma água que se torna fonte de água que jorra, uma fonte inesgotável que dá água para a vida eterna”. Jesus lhe anuncia o inédito, o humanamente impossível: há uma água dada por ele que, em vez de ser retirada do poço, torna-se fonte que jorra, água que sobe das profundezas. Beber a água dada por ele significa encontrar em si uma fonte interior: esta água é o Espírito derramado por Jesus nos nossos corações (cf. Jo 7,37-39; 19,30.34), Espírito que jorra para a vida eterna, que, no coração do crente, torna-se “mestre interior”.

A samaritana começa a intuir alguma coisa e, então, pergunta: “Senhor (Kýrios), dá-me dessa água!”. Aqui, Jesus dá uma virada repentina no diálogo: “Vai chamar teu marido e volta aqui”. O que o marido tem a ver? Na realidade, Jesus conhece bem a situação da samaritana, porque “conhecia aquilo que há em cada homem” (Jo 2, 25). Ele lê na história de amor infeliz dessa mulher a história idólatra dos samaritanos com os ídolos estrangeiros. Lê nela, simbolicamente, a história do Reino do Norte, Israel, chamado pelos profetas de “mulher adúltera e prostituta” pela infidelidade ao Esposo único, o Senhor Deus, e o adultério com os ídolos falsos (cf. Os 2,4–3,6).

A mulher, respondendo que agora não tem marido, que está à procura de pessoas que a amem, confessa não ter encontrado o esposo único, sempre fiel no amor, mesmo em caso de traição (cf. Os 14, 5). Jesus está diante do povo dos samaritanos para lhes dizer que o Senhor nunca os abandonou, que quer atraí-los para si (cf. Os 2,16) e celebrar com eles bodas de aliança eterna. É por isso que a samaritana, para além da água, deve encontrar quem é a fonte, por trás do dom deve descobrir o doador. Na resposta dada a Jesus, reconhece implicitamente as suas inúmeras falhas, a sua sede frustrada de comunhão e de amor; é uma mulher na miséria, que conhece patrões, mas não um esposo, uma mulher explorada e abandonada. Mas descobrindo a si mesma, descobre que Jesus é profeta e logo lhe pergunta onde é possível adorar, onde é possível encontrar Deus e iniciar uma vida de comunhão com ele: em Jerusalém, como dizem os judeus, ou no monte Garizim, como defendem os samaritanos?

Em resposta, Jesus lhe anuncia a hora: “Acredita-me, mulher, está chegando a hora, e é agora, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em Espírito e Verdade”, isto é, no Espírito Santo e em Jesus Cristo mesmo, que é a Verdade (cf. Jo 14,6), a última e definitiva narrativa de Deus (cf. Jo 1,18).

Sim, o lugar da autêntica liturgia cristã não é mais um lugar-santuário, monte, templo ou catedral, mas é a morada do Pai, do Filho e do Espírito Santo, isto é, a nossa pessoa por inteiro, corpo de Cristo (cf. 2Cor 13,5) e “templo do Espírito” (1Cor 6,19).

Diante dessas palavras, a samaritana ousa confessar a própria expectativa: ela e a sua gente esperam o Messias profético, o novo Moisés (cf. Dt 18,15-18), esperam aquele que revelará tudo. E é neste momento que Jesus lhe diz: “Eu sou – o Nome de Deus (cf. Ex 3,14) – que estou falando contigo”. A mulher se revelou na sua miséria, Jesus e revela na sua verdade de Messias, de Cristo, enviado por Deus.

Mas agora o encontro humaníssimo com Jesus transformou essa mulher em uma criatura nova, tornando-a testemunha e evangelizadora. É por isso que, “tendo deixado o seu cântaro” – gesto que diz mais do que muitas palavras! – ela corre até a cidade para testemunhar o que aconteceu com ela. Para a samaritana, testemunhar é, acima de tudo, recordar os eventos, contar a própria experiência: algo decisivo aconteceu na sua vida, e isso provocou nela uma mudança, uma conversão. E, assim, depois de recordar os fatos, sugere uma interpretação: “Será ele o Messias?”. Ela não impõe àqueles que a escutam um dogma, nem uma verdade expressada em termos rígidos, mas propõe uma leitura que lhes permitirá fazer uma escolha na liberdade, movidos pelo amor. Ela sugere mais do que conclui, e assim acende o desejo do encontro.

“A fé nasce da escuta” (Rm 10,17), diz o Apóstolo: da escuta de Jesus, nasceu a fé da samaritana, da escuta da samaritana nasceu a fé da sua gente. E, da fé, procede o conhecimento; do conhecimento, o amor: esse é o evento cristão, admiravelmente resumido no encontro de duas pessoas sedentas!

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