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Neste tempo de evangélicos em evidência, onde estão os protestantes?

por Magali do Nascimento Cunha publicado em Carta Capital*

Não era bem isso que Martinho Lutero havia imaginado

Esta quarta-feira 31, Dia da Reforma Protestante, é bem propícia para refletirmos. No momento, os evangélicos brasileiros, cerca de 29% da população, estão em evidência.

Pesquisa do Datafolha de 25 de outubro indicou que 59% dos evangélicos votariam em Jair Bolsonaro e 26% em Fernando Haddad. O primeiro pronunciamento de Bolsonaro como presidente da República eleito, no domingo 28, foi antecedido pela palavra e oração do cantor evangélico e senador não-reeleito Magno Malta. Tal destaque a um grupo religioso é fato inédito na história do País.

Este segmento cristão chegou ao Brasil há quase dois séculos e sofreu muitas transformações, em especial com a chegada dos pentecostais, décadas depois. A identidade “protestante” nunca foi bem afirmada por boa parte desses grupos, que sempre optaram por se denominar “evangélicos”, reforçando disputas religiosas com o hegemônico catolicismo romano.

Lamentavelmente, a história explica que a inserção protestante no Brasil se deu, de forma predominante, em perspectiva sectária, para se diferenciar dos católicos, colocando-se como detentores “do verdadeiro Evangelho”.

Em nossos dias, o segmento é tão amplo e diverso, com uma presença significativa e crescente, que é tarefa difícil nomeá-lo, explicá-lo e agrupá-lo por afinidade. Em tese, teria como raiz comum a reforma protestante e seus movimentos originários. Transformações ocorridas na teologia e no jeito de ser de boa parte dos evangélicos brasileiros enfraqueceram, porém, essa raiz.

A maior herança da reforma, em especial aquela pregada por Martinho Lutero, é a radicalidade da graça. Ou seja, o perdão de pecados é resultado do amor incondicional e gratuito de Deus, e para alcançá-lo é preciso ter fé e não obras.

Esta herança está assentada nas cinco frases: Sola Gratia (Somente a Graça), Solus Christus (Somente Cristo), Sola Scriptura (Somente a Escritura), Sola Fide (Somente a Fé) e Soli Deo Gloria (Glória somente a Deus).

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Todos estes cinco princípios representam protesto e oposição aos ensinamentos da então dominante Igreja Católica Romana, que, segundo os reformadores, teria monopolizado os atributos de Deus e os transferido para a Igreja e sua hierarquia, especialmente para o papa.

Deus não pode ser propriedade de um grupo religioso, enfatizavam os reformadores, e a Bíblia deve ser lida nesta perspectiva.

O teólogo luterano alemão do século XX Paul Tillich reconheceu que a dimensão profética, contestatória, protestante é própria do cristianismo, à luz da postura do Cristo.

Para este teólogo, a reforma significou a encarnação deste “princípio protestante”, uma volta às origens do ser cristão. Tillich reconheceu, no entanto, que esse espírito não é propriedade exclusiva dos cristãos, podendo se manifestar em diferentes formas religiosas, culturais e políticas.

No passado da reforma, a aliança dos reformadores com príncipes, latifundiários e burgueses pré-capitalistas europeus comprometeu o caráter profético do movimento.

Isto reforça o fato de o “princípio protestante” ter sido levado adiante por distintos grupos que pagaram até mesmo com a vida o preço deste compromisso de fé, como o reformador Thomas Müntzer na causa dos camponeses na Alemanha do século XVI.

Identificando-se no Brasil mais como “os que têm o verdadeiro evangelho” do que como “profetas que contestam quem quer controlar Deus”, boa parte dos grupos evangélicos se distanciou deste princípio.

A pregação e as músicas que entoam realçam um Deus que age condicionado às ações humanas: pela quantidade das orações, pelo sacrifício que se deve fazer para alcançar as bênçãos (seja por meio de obrigações religiosas ou de ofertas financeiras), como no tempo das indulgências.

A leitura fundamentalista, descontextualizada, tem tornado a Bíblia um livro estéril. O poder e o controle dos líderes religiosos têm sufocado a voz e a ação dos fiéis, com perseguições e exclusões daqueles que manifestam uma compreensão diferente.

A aliança com poderes políticos estabelecidos com base em injustiça, em violência e negação de direitos ou a simples omissão, com desprezo à postura profética e contestatória do Cristo, também marcam esta trajetória dos evangélicos no Brasil. Isto faz esvaecer o protestantismo na sua razão de ser.

Entretanto, é preciso reconhecer e recordar que as sementes do princípio protestante de viver a fé na história foram germinadas no Brasil. Com quem cultua, em comunidade, ao Deus da graça que não faz acepção de indivíduos.

Com aqueles que pagaram com suas vidas o compromisso com a justiça, povoando as prisões das ditaduras militares, resistindo às torturas, enfrentando a morte ou o exílio. Com quem é ativista em várias ações de solidariedade com minorias sociais, dependentes químicos, presos, vítimas de violência.

Como há protestantes nessas frentes em nosso País. Neste processo eleitoral, estes pastores e leigos se colocaram no apoio à candidatura de Fernando Haddad, em consonância com as pautas sociais defendidas.

Ainda que minoritária e não colocada em evidência, uma parcela importante de evangélicos atua na recriação da identidade protestante tão fragilizada em nossas terras.

Eis aí o fascinante poder transformador das crises. É como incentiva a carta aos romanos na Bíblia: “Esperar contra toda a esperança” (4.18).

Artigo publicado originalmente no site da Carta Capital.

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