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Não somos contra a Copa ou o futebol, somos contra o modelo de organização do evento – Rosilene Wansseto

Não somos contra a Copa ou o futebol

Nesta quinta-feira, 12 de junho de 2014, inicia-se ápice de uma mobilização que, mais fortemente desde ano passado, saiu às ruas do país para questionar atuação do Poder Público em parceria com a Federação Internacional de Futebol (FIFA) para a organização da Copa do Mundo FIFA no Brasil. Juntamente com os jogos de futebol, terão lugar em várias cidades do Brasil uma série de manifestações que demonstram um forte enfrentamento com as forças do capital, que cometem violações aos direitos humanos dos brasileiros desde que foi iniciada a organização para o megaevento no país.

Os protestos deverão ter sua visibilidade potencializada ao máximo em todo o mundo e o desenrolar desse processo ainda não aponta caminhos. Além das 12 cidades-sede do Mundial no Brasil, outros municípios brasileiros e até cidades de outros países anunciam atos públicos que questionam uma organização construída à base de remoções e despejos de comunidades, leis de exceção e ilegalidades, elitização do futebol e dos espaços públicos, discriminação e segregação da população, uso de recursos públicos para interesses privados, criminalização dos movimentos sociais e repressão às vozes dissonantes ao processo, realizado de maneira autoritária e ameaçando a soberania do Brasil.

Coordenadora da Articulação Nacional dos Comitês da Copa (ANCOP), entidade que reúne comitês populares para acompanhamento das ações dos governos, empresários e da FIFA em todas as cidades que recebem o evento, a ativista Rosilene Wansseto concedeu entrevista exclusiva à Adital comentando os preparativos para o momento-chave da luta. A articulação estará fortemente presente durante todo o evento, levando o debate não somente aos brasileiros, mas aos torcedores estrangeiros que hoje visitam o país.

Adital – Todas as cidades-sede estão articuladas e promoverão manifestações? Se não, quais estão mais organizadas e quais menos? Por quê?

ReproduçãoRosilene Wansseto – Em todas as cidades-sede haverá manifestações. Em algumas cidades, devido à enorme visibilidade e os diversos movimentos envolvidos, pode haver mais atos, contudo não significa que esse ou aquele ato seja mais ou menos importante. O importante é que aconteçam manifestações e que possam mostrar os problemas que vivemos desde antes do Mundial e que permanecerão após a Copa. Sabe-se que alguns desses problemas chegaram ou foram intensificados por conta da Copa, como: "higienização” de moradores em situação de rua, remoções, repressão ao direito de livre manifestação, impedimento ao trabalho do ambulante, feirante, como é o caso dos ambulantes do Mineirão em Belo Horizonte [Estado de Minas Gerais]. Destacamos que há muitas manifestações sendo chamadas para esses dias, e muitas delas não estão articuladas com os Comitês Populares, são grupos autônomos e que buscam a seu modo, do seu jeito organizar atos e fazer as denúncias.

Adital – Há estimativa de número de manifestantes participando dos atos públicos?

Rosilene – Não é possível estimar, pois cada cidade é uma realidade. E com a Copa sendo inaugurada amanhã [12 de junho] os atos podem ser ainda maiores, tendo em vista que muitos trabalhadores poderão participar por ser feriado, como é o caso de São Paulo.

Adital – A organização da Copa anunciou um forte aparato policial para atuar durante o megaevento. Os manifestantes estão preparados para lidar com isso?

Rosilene – Realmente, há um forte aparato policial sendo organizado para dar segurança ao megaevento, segurança para as seleções, para a FIFA e para as autoridades que virão, e, de contrapartida, para impedir ou controlar as manifestações. O Estado, que deveria dar segurança, é o primeiro a criar a insegurança. Em todas as manifestações são pensadas formas de dar segurança aos manifestantes, contudo vamos às ruas com nossas bandeiras, com nossas consignas, nosso grito, nossa simbologia. Nossa grande defesa é a verdade, é a luta, é a unidade em torno de nossas bandeiras.

Adital – Houve formação/preparação para os manifestantes lidarem com questões da força policial e questões da mídia?

Rosilene – Há orientação para cuidados, mas preparação, formação não. Temos advogados populares que nos dão orientações, contudo, isso não é uma preparação.

Adital – Como está sendo pensado o diálogo das manifestações com os visitantes do país? E com a população brasileira?

Rosilene – Primeiro, queremos dizer que não somos contra a Copa ou contra o futebol, somos contra o modelo adotado para organizar esse evento e a forma vergonhosa como o governo brasileiro, estados e municípios se curvaram e têm financiado a Copa da FIFA, uma empresa privada que, ao fim e ao cabo, lucrará milhões às custas de uma paixão dos brasileiros e de muitos visitantes, o futebol. Portanto, queremos dialogar com os turistas a partir das manifestações, colocando as nossas reivindicações, nossa agenda, nossa pauta, sem atacar nenhum turista no seu direito de vir ao nosso país e participar da Copa. Queremos que o turista compreenda os nossos motivos, o porquê estamos nas ruas, queremos mais direitos, política pública, basta de remoções, de violência e de violações de direitos. Desejamos que o visitante entenda que estamos lutando por direitos, pois muito antes da Copa já havia remoções e violações de direitos e já lutávamos contra isso saindo às ruas, porém com a Copa esses problemas se intensificaram e, por outro lado, ficaram mais visíveis para o mundo, pois os "olhos do mundo” estão voltados para o Brasil nesse momento. Além disso, sempre foi apregoado pelos governos — independente de partido político — que não havia recursos para investir em políticas públicas, porém vemos uma avalanche de recursos públicos para a Copa. Isso o povo não concorda e não aguenta mais, queremos mudanças estruturais, a preservação e a ampliação/universalização dos direitos e não ao contrário.

 

Adital – Temos informações de que haverá manifestações em outras cidades onde não haverá jogos (Taubaté – São Paulo, Juiz de For e Barreiro – Minas Gerais, Goiânia – Goiás e Juazeiro do Norte – Ceará) e em cidades de outros países (Paris – França e Turin – Itália). Isso procede?

Rosilene – Verdade, em outros países e cidades brasileiras haverá atos. Os Comitês e a ANCOP têm se articulado com outros movimentos sociais e muitas pessoas e organizações parceiras, que atuam em cidades que não são sede da Copa e estão apoiando a luta. Veja, isso reforça a ideia de que estamos com a Copa denunciando um problema que não atinge somente as cidades-sede do Mundial, mas que vai além, são problemas estruturais do Brasil e que não foram resolvidos com ou sem a Copa. 

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