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Dom Oscar Romero – ícone da luta por justiça

Dom Oscar Romero - ícone da luta por justiça

Dom Oscar Romero
Mártir da Igreja e ícone da luta por justiça

Os 30 anos do assassinato do bispo de San Salvador são lembrados como sinais de esperança na América Latina e no mundo

 

Os 30 anos do assassinato de dom Oscar Romero, comemorados em 24 de março de 2010, denunciam ainda a impunidade que campeia na história da América Latina. O mandante do crime, o major Roberto D'Aubuisson, fundador do partido Aliança Republicana Nacionalista (ARENA, de direita), que governou o país entre 1989 e 2009, morre em 1992, sem sequer responder a processo.  

Um atirador de elite do Exército salvadorenho invade a capela do Hospital da Divina Providência (o Hospitalito, instituição que ainda cuida de pacientes com câncer) e com um tiro certeiro interrompe a celebração da Eucaristia. Dom Oscar Arnulfo Romero, bispo de San Salvador, tomba executado pelas forças de Direita que ainda dominavam o país, como ocorria em toda a América Latina. Era 24 de março de 1980, tempo de quaresma.

O mundo se volta para El Salvador e o sangue do sacerdote suscita sentimentos de indignação e revolta à opressão vivida pelo povo salvadorenho. Tem início a guerra civil que duraria até 1992. O bispo que repetiu o gesto de Cristo, morrendo pelo seu povo e pela coerência com o Evangelho, ao contrário do que planejaram seus opositores, não deixa o embate político em prol da população (especialmente dos camponeses). O momento histórico testemunha a profecia do próprio dom Oscar Romero ao afirmar: "Se me matam, ressuscitarei na luta do povo salvadorenho". O bispo de San Salvador torna-se então mártir da Igreja e ícone da luta pela justiça em seu país e em toda aquela região.

Os 30 anos do assassinato de dom Oscar Romero, comemorados em 24 de março de 2010, denunciam ainda a impunidade que campeia na história da América Latina. O mandante do crime, o major Roberto D'Aubuisson, fundador do partido Aliança Republicana Nacionalista (ARENA, de direita), que governou o país entre 1989 e 2009, morre em 1992, sem sequer responder a processo.

Dos acordos de paz à vitória da esquerda

A Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN) fundada em 1980 como grupo guerrilheiro, passou a reunir as facções de esquerda: Forças Populares de Liberatação Farabundo Martí (FPL), Exército Revolucionário do Povo (ERP), Resistência Nacional (RN), Partido Comunista Salvadorenho (PCS) e Partido Revolucionário dos Trabalhadores Centroamericanos (PRTC). O nome escolhido para a coalizão homenageia o líder comunista Farabundo Martí, fundador e dirigente do PCS em 1930.

A antiga guerrilha converteu-se em partido político após os acordos de paz de Chapultepec (México), que colocaram ponto final nos doze anos de uma terrível guerra civil. No período,  setenta e cinco mil pessoas foram mortas. Dados da Comissão de Verdade criada pelas Nações Unidas, apontam que 85 por cento dos assassinatos foram cometidos pelo Exército e  esquadrões da morte, apoiados financeiramente pelos Estados Unidos e cinco por cento pela guerrilha.

Dezessete anos depois de ter deposto as armas, a FMLN elegeu, em 15 de março de 2009, o jornalista Mauricio Funes como presidente de El salvador.  De tendência social-democrata, ele não participou da luta armada. Em contrapartida, o vice-presidente, Salvador Sánchez Cerén, esteve no comando da guerrilha.

A vitória da Frente varreu do poder a Aliança Republicana Nacionalista (Arena),  partido de extrema-direita fundado por Roberto d'Aubuisson (mandante do assassinato de dom Oscar Romero). As outras duas formações conservadoras derrotadas que haviam se aliado à ARENA eram o Partido de Conciliação Nacional (PCN), representante dos governos militares (1961-1976), e o Partido Democrata Cristão (no poder entre 1984 e 1989).

A aliança de partidos conservadores conduziu uma "campanha de medo",  com apoio dos veículos de comunicação que se utilizavam da linguagem arcaica da Guerra Fria.  A estratégia, entretanto, não convenceu a população. Nas urnas, o povo consagrou a FMLN como principal força política do país, mesmo sem ser maioria da Assembleia  Nacional, ao eleger um presidente de centro-esquerda.

A guinada no quadro político, conforme avaliam especialistas, foi alavancada pela precária situação social. Só para se ter uma ideia da realidade local, dos 5,7 milhões de habitantes mais de 2,5 milhões de cidadãos se viram obrigados a emigrar,  em busca de melhor sorte nos Estados Unidos. Quase metade da população vive abaixo da linha de pobreza e 20 por cento na extrema miséria. O quadro se completa com o desemprego em massa e com a maior taxa de homicídios do continente: 68 assassinatos por cem mil habitantes.

 

União nacional por um país melhor

O atual arcebispo de San Salvador, dom José Luis Escobar Alas, fez um convite à população para que se una ao governo na luta contra a violência e, assim, impeça que o Estado desapareça. Durante entrevista coletiva, dom Escobar afirmou que atualmente o país ainda vive situação de violência inconcebível. Ele condenou os dois recentes massacres no país, nos quais doze pessoas morreram e tiveram os corpos mutilados. "Não vamos perder a fé, não vamos perder a esperança". El Salvador encerrou 2009 com 4.365 homicídios, com média de 12 mortes violentas por dia. Os números se aproximam dos apurados após a guerra civil, em 1992. Este ano, as estatísticas policiais, apontam aumento no número de mortes violentas, com a média de 13 ao dia.

 

A TRAJETÓRIA DE DOM OSCAR ROMERO

• 1917 – Nasce Oscar Arnulfo Romero em uma família modesta em Ciudad Barrios (El Salvador).
• 1931- Aos 14 anos o menino Oscar ingressa no seminário, mas seis anos depois se afasta  para ajudar a família que estava com dificuldades. Passa a trabalhar nas minas de ouro com os irmãos. Retoma os estudos e é enviado a Roma para estudar teologia.
• 1942 – Ordenado sacerdote, volta a El Salvador e assume uma paróquia do interior. Logo é transferido para a catedral de San Miguel, onde fica por 20 anos. Sacerdote dedicado à oração e à atividade pastoral, pobre, dedica-se a obras de caridade, mas sem engajamento reconhecidamente social.

• 1966 – Dom Oscar assume como secretário da Conferência Episcopal de El Salvador.

• 1970 – É nomeado bispo auxiliar de San Salvador. O bispo dom Luis Chávez y Gonzalez busca atualizar a linha pastoral de acordo com o Concílio Vaticano II e a Conferência de Medellín. Romero não se identifica integralmente com a linha pastoral proposta, revelando-se conservador.

• 1974 – É nomeado bispo da diocese de Santiago de Maria, em meio a um contexto político de forte repressão, sobretudo contra as organizações camponesas.

• 1975 – A Guarda Nacional executa cinco camponeses e dom Romero celebra missa em intenção das vítimas. Ele não faz denuncia explícita do crime, mas escreve uma carta severa ao presidente Molina.

• 1977 – A nomeação de dom Oscar Romero como bispo de El Salvador desagrada  os setores renovadores. Mas em 12 de março é assassinado o jesuíta padre Rutílio Grande, engajado na luta do povo e ligado a dom Oscar. Este é o momento em que ele reavalia sua posição e se coloca corajosamente junto aos oprimidos, denunciando a repressão, a violência do Estado e a exploração imposta ao povo pela aliança entre os setores político-militares e econômicos, apoiada pelos Estados Unidos. O bispo denuncia também a violência da guerrilha revolucionária. Suas homilias são transmitidas pela rádio católica dando esperança à população e provocando a fúria dos governantes.

• 1978 – É homenageado com o título de doutor honoris causa das Universidades de Georgetown (EUA) e de Louvain (Bélgica).

 • 1979 – Em outubro, um golpe de Estado depõe o ditador Humberto Romero. Uma junta de civis e militares assume o poder, e nesse cenário, exército e organizações paramilitares assassinam centenas de civis (entre eles sacerdotes). A guerrilha retalia com execuções sumárias.

• 1980 – Em 17 de fevereiro, dom Romero escreve ao presidente dos EUA, Jimmy Carter. O bispo faz um apelo para que ele não envie ajuda militar e econômica ao governo salvadorenho, para não financiar a repressão ao povo.

• 1980 – Na homilia de 23 de março, o bispo se dirige explicitamente aos homens do Exército, da Guarda Nacional e da Polícia e afirma: "Frente à ordem de matar seus irmãos deve prevalecer a Lei de Deus, que afirma: NÃO MATARÁS! Ninguém deve obedecer a uma lei imoral (…). Em favor deste povo sofrido, cujos gritos sobem ao céu de maneira sempre mais numerosa, suplico-lhes, peço-lhes, ordeno-lhes em nome de Deus: cessem a repressão!" Estas foram as últimas palavras do bispo ao país.

• 1980 – Em 24 de março, dom Oscar Romero é assassinado por um franco-atirador, enquanto reza a missa na capela do Hospital da Divina Providência.

• 1994 – Abre-se o processo de canonização de dom Romero em San Salvador.
• 1997 – O processo passa para a Congregação das Causas dos Santos em Roma.

• 2010 – Em 24 de fevereiro, 30 anos da morte de dom Oscar Romero, Organizações sociais e religiosas apresentaram ao Parlamento salvadorenho petição para instituir 24 de março como "Dia Nacional de dom Oscar Arnulfo Romero".  

 

Aos 30 anos do martírio de São Romero

Dom Pedro Casaldáliga, bispo emérito de São Félix do Araguaia, Prelazia do Xingu

Celebrar um Jubileu de nosso São Romero da América é celebrar um testemunho que nos contagia de profetismo. É assumir comprometidamente as causas, a causa, pelas quais nosso São Romero é mártir. Grande testemunha é ele no seguimento da Testemunha Maior, a Testemunha Fiel, Jesus. O sangue dos mártires é aquele cálice que todos, todas, podemos e devemos beber. Sempre e em todas as circunstâncias a memória do martírio é uma memória subversiva.

             Trinta anos se passaram daquela Eucaristia plena na capela do "Hospitalito". Naquele dia nosso santo nos escreveu: "Nós acreditamos na vitória da ressurreição". E muitas vezes, disse ele, profetizando um tempo novo, "Se me matam ressuscitarei no povo salvadorenho". E, com todas as ambiguidades da história em processo, nosso São Romero está ressuscitando em El Salvador, em Nossa América, no Mundo.

            Este jubileu tem de renovar em todos nós uma esperança, lúcida, crítica, mas invencível. "Tudo é Graça", tudo é Páscoa, se entrarmos a todo risco no mistério da Ceia partilhada, da Cruz e da Ressurreição.

            São Romero nos ensina e nos cobra que vivamos uma espiritualidade integral, uma santidade tão mística quanto política. Na vida diária e nos processos maiores da justiça e da paz, "com os pobres da terra", na família, na rua, no trabalho, no movimento popular e na pastoral encarnada. Ele nos espera na luta diária contra essa espécie de "mara" monstruosa que é o capitalismo neoliberal, contra o mercado onímodo, contra o consumismo desenfreado. A Campanha da Fraternidade do Brasil, ecumênica este ano, nos recorda a palavra contundente de Jesus: "Vocês não podem servir a dois senhores, a Deus e ao dinheiro".

            Respondendo àqueles que na Sociedade e na Igreja tentavam e tentam desmoralizar a Teologia da Libertação, a caminhada dos pobres em comunidade, esse novo modo de ser Igreja, nosso pastor e mártir replicava: "Há um ‘ateísmo' mais próximo e mais perigoso para nossa Igreja: o ateísmo do capitalismo quando os bens materiais se erigem em ídolos e substituem a Deus".

            Fiéis aos sinais dos tempos, como Romero, atualizando os rostos dos pobres e as urgências sociais e pastorais, devemos sublinhar neste jubileu causas maiores, verdadeiros paradigmas algumas delas. O ecumenismo e o macroecumenismo, em diálogo religioso e em ‘koinonia' universal. Os direitos dos emigrantes contra as leis de segregação. A solidariedade e intersolidariedade. A grande causa ecológica (Precisamente a nossa agenda latino-americana deste ano está dedicada à problemática ecológica, com um título desafiador: "Salvemo-nos com o Planeta"). A integração da Nossa América, as campanhas pela paz efetiva, denunciando o crescente militarismo e a proliferação das armas. Urgindo sempre umas transformações eclesiais, com o protagonismo do laicato que Santo Domingo pediu e a igualdade da mulher nos ministérios eclesiais. O desafio da violência cotidiana, sobretudo na juventude manipulada pelos meios de comunicação alienantes e pela epidemia mundial das drogas.

            Sempre e cada vez mais, quando maiores sejam os desafios, viveremos a opção pelos pobres, "a esperança contra toda esperança".  No seguimento de Jesus Reino adentro. Nossa coerência será a melhor canonização de "São Romero da América, Pastor e Mártir"

 

Espiritualidade aliada ao compromisso político
O olhar do teólogo

João Batista Libânio, professor na Faculdade jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE)

         Marco simbólico do continente latino-americano. Responde bem à pedagogia de Deus. Não escolhe os grandes deste mundo, mas os pequenos para confundir os fortes. Assim, lá vivia em El Salvador um bispo conservador que assumiu o pastoreio sob o olhar complacente e feliz da burguesia. Homem piedoso e honesto, sim, mas preso nas malhas da tradição, tecida por uma oligarquia impiedosa de longa data. Diante do corpo ensanguentado de Rutílio Grande, sacerdote jesuíta (1977), promotor da libertação dos oprimidos, dom Romero modifica radicalmente sua postura em face do Governo e urge a investigação do crime. Como este fora perpetrado por forças do próprio Governo, tal insistência só produzia ódio contra ele. Daí para frente o arcebispo enceta uma caminhada ao lado do povo sofrido até ser assassinado pelas forças repressivas do Estado em 1980.

            Além do testemunho maravilhoso de vida, de coragem e de entrega, dom Romero deixou-nos magnífica coleção de homilias. Ele criou gênero próprio de pregações. Serviam simultaneamente de informação de fatos acontecidos no país, que a rigorosa censura escondia, e de alimento para a fé do povo simples no meio da terrível repressão e pobreza. Transparece nelas, de modo original e corajoso, uma espiritualidade aliada a sério compromisso político. O bispo de formação religiosa tradicional, sem perdê-la no que tem de piedade popular, assumiu uma linguagem de ponta na linha da libertação. Esta não nasceu de nenhuma crítica a partir da racionalidade moderna, mas da provocação que lhe veio da realidade sofrida de seu povo.

            Ele se sentia verdadeiro mediador entre a Palavra de Deus lida na celebração e a comunidade eclesial da qual era pastor. Articulava maravilhosamente as interpelações nascidas da Escritura com a vida das pessoas. Esta lhe oferecia o olhar crítico para compor as homilias. Algo admirável por provir precisamente da mais alta autoridade eclesiástica do país, onde uma Igreja durante séculos compactuara com as classes dominantes. Agora se produzia a ruptura no espírito do Evangelho de Jesus. Bispo, ele se entendia no espírito do Concílio Vaticano como servidor do povo de Deus.

            Mostrou enorme coerência entre a autenticidade de vida e as palavras até o extremo do martírio. Renunciara habitar luxuosa residência oferecida pela burguesia salvadorenha para ocupar modesto quarto do hospital dos cancerosos de San Salvador. Fazia ecoar, praticamente, a única voz de verdade e profecia naquele momento de censura rigorosa por parte do Governo, mesmo quando ele se dera conta das ameaças de morte. Proclamava-se a "voz dos sem voz" e não temeu cumprir tal missão. E por isso foi assassinado. Sofreu no interior da Igreja discriminação e incompreensão. Tal solidão o acompanhou até a morte em testemunho muito próximo ao de Jesus.

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