Espiritualidades

Rute – As cinco “nada ortodoxas” mães de Jesus

Dentre as “nada ortodoxas” mães de Jesus, Rute é uma das mais conhecidas. Tem um livro com seu nome e sua história na Bíblia. Em quatro capítulos se desenrola uma trama novelesca. No primeiro capítulo se narra o drama da familia do israelita Elimelec. Uma verdadeira tragédia abalou a estrutura patriarcal daquela familia. Morreram todos os homens, e as únicas sobreviventes foram as mulheres: A israelita, Noemi e suas duas noras moabitas: Rute e Orfa. As mulheres viúvas na estrutura patriarcal eram impedidas de desenvolver qualquer atividade econômica e acessar qualquer herança familiar. Portanto, a vida das três mulheres viúvas estava inviabilizada. Reuniam todos os requisitos de marginalização social: Eram mulheres, pobres, viúvas e sem filhos. Não havia pior desgraça que esta. O esquema patriarcal não deixava saída para essas mulheres. Suas vidas dependiam da existência dos homens, fossem pais, maridos ou filhos homens. Portanto, a morte dos homens da casa patriarcal de Elimelec, decretava, também a morte social e econômica das mulheres. Noemi, aceitando sua desgraça, pede que suas noras retornem à “casa da mãe”. A “casa da mãe” é a chave para compreender a virada contra patriarcal da história.
A morte dos homens que deveria decretar a morte das mulheres, acabou por provocar a insurreição delas ao sistema patriarcal, e o nascimento da “casa da mãe”. Enquanto, Orfa retornou à casa da sua mãe, Rute ficou, e junto com Noemi construíram uma proposta de casa não patriarcal. Juntas, sogra e nora, israelita e moabita desafiaram os esquemas patriarcais. Primeiro, elaboraram um plano de sobrevivência. Rute, a mais jovem foi colher espigas nos campos deixadas para os pobres. Trabalho duro e perigoso! Muitas mulheres eram estupradas nestes campos. Por isso, logo entenderam que precisavam fazer mais do que sobreviver à fome. Recolher sobras era pouco. Era preciso converter esmola em direito! Precisavam lutar por direito e dignidade. Qual a saída? No campo onde Rute colhia as sobras, encontraram a saída. Boaz, dono do campo, era da familia de Elimelec, e pela a lei do Levirato poderia ser o resgatador (goel) da terra e da descendência de Elimelec para Noemi. Mas, Noemi era avançada de idade. O que fazer? Ela mesma traçou o plano e orientou a jovem Rute. É preciso sabedoria das velhas mães para subverter os esquemas patriarcais!
Na eira de Boaz, uma noite de subversão. No final da colheita, Rute passou a noite na eira que era espaço proibido para mulheres. Noemi deu todas a dicas: “Tome banho, passe perfume, vista seu manto e desça a eira. Quando ele for dormir, veja o lugar onde ele estará deitado, aproxime-se e descubra os pés dele e deite-se. Assim fez a Rute. A palavra hebraica réguel (geralmente traduzida por “pé”) dentre algumas de suas traduções possíveis estão: pé, planta do pé, perna, órgãos genitais. O plano subversivo teve total êxito. Depois de superar obstáculos legais e estruturais para realizar o Levirato, Boaz casa-se com Rute e dessa maneira, “nada ortodoxa”, Rute, a migrante moabita, entrou na história do povo de Israel e torna-se uma das mães genealógicas de Jesus: “Boaz gerou Obede, cuja mãe foi Rute. (Mateus 1:5)
A novela de Rute termina com uma louvação das mulheres à velha matriarca Noemi, exaltando Rute, a moabita, como a verdadeira “goel”, redentora: “Sua nora que ama você vale mais do que sete filhos!”. Em uma cultura religiosa patriarcal onde Deus era controlado e usado contra as mulheres, a novela de Rute, anunciava que a sororidade política entre mulheres era caminho de redenção. Trazia o grito e o protesto das mulheres e dos grupos marginalizados pela teologia patriarcal-sacerdotal, que neste período, demonizava as mulheres estrangeiras, expulsando-as de suas fronteiras e do meio seu povo. Rute é protagonista de uma história “nada ortodoxa” que desafia e desmantela as casas e projetos patriarcais de ontem e de hoje!
Por Odja Barros.

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