O Brasil registra um elevado número de assassinatos de defensores de direitos humanos. Somente nos primeiros meses de 2016, já foram registrados oito assassinatos e um alto número de ameaças e ataques contra organizações e movimentos da sociedade civil. Segundo o levantamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da Organização de Estados Americanos (OEA), os números colocam o país à frente de países historicamente violentos, como a Colômbia e o México.
A situação se agrava se analisada dentro de um quadro de retrocessos, iniciado no segundo semestre de 2015, quando uma reforma ministerial uniu secretarias que tinham status de ministérios e fragilizou as políticas de direitos humanos, provocando o enfraquecimento do Programa Nacional de Proteção a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH).
Em entrevista à Adital, Cleber Buzatto secretário executivo do Cimi [Conselho Indigenista Missionário], revela que parte das vítimas é composta por pequenos agricultores familiares, que estão lutando pela terra, contra a implementação de grandes obras; além de lideranças sindicais que lutam por sua sobrevivência.
Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostram que, no ano de 2015, foram 50 mortes, 144 pessoas ameaçadas e 59 tentativas de homicídio em conflitos por terra no Brasil. Os Estados de Rondônia, Pará e Maranhão concentram 90% desses casos.
"Infelizmente, no atual contexto político, considerando ação da força conservadora e a violência mais explicita do agronegócio, a perspectiva para esse cenário é que pode se agravar mais nos próximos períodos” destaca Buzatto.
As regiões Norte e Nordeste são as que mais registram números de assassinatos, pois fazendeiros do agronegócio não respeitam as demarcações de terras e acabam invadindo territórios indígenas e de pequenos agricultores. De 2010 a 2015, ocorreram 219 mortes e 300 tentativas de homicídio, em razão de conflitos agrários no país.
"As investigações estão sendo conduzidas de forma lenta, e menos de 6% dos casos de assassinatos de defensores são investigados, aqui, no Brasil, tornando essa situação alimento para assassinos e mandantes” ressalta Buzatto.
Os números alarmantes levaram o Cimi, a Justiça Global e outras organizações a enviarem um relatório com denúncias à Organização das Nações Unidas (ONU) e à OEA. O documento foi entre a Victoria Tauli-Corpuz, relatora especial da ONU sobre Direitos dos Povos Indígenas, e destaca que órgãos públicos responsáveis pela regularização fundiária no Brasil, como o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Fundação Nacional do Índio (Funai), vêm sofrendo um processo de desmantelamento, com cada vez menos recursos.
É destacado também no documento casos como o de Belo Monte [Estado do Pará], na qual milhares de indígenas tiveram que abandonar suas terras, e a do povo guarani kaiowá, no Mato Grosso do Sul, que luta pela regulamentação de suas áreas, enfrentando a violenta resistência do agronegócio. A relatora também recebeu o relatório "Vale de lama: relatório de inspeção em Mariana após o rompimento da barragem de rejeitos do Fundão” – referente ao rompimento de barragens da mineradora Samarco, da Vela, em Minas Gerais, em novembro de 2015 –, e o informe sobre acordo firmado entre as mineradoras Samarco, Vale e BHP e o poder público. O desastre da barragem de Mariana afetou diretamente a vida dos Krenaks, povo indígena que vivia das águas do Rio Doce, que ficou completamente contaminado pelos rejeitos da barragem rompida.
O relatório ressalta ainda que "as informações aqui apresentadas são extremamente preocupantes e incompatíveis com um país que se legitima internacionalmente sobre uma política de proteção. É necessário e urgente que o Estado brasileiro avance na efetivação de tal política, fundamental para que seu compromisso com a garantia dos direitos humanos seja cumprido, bem como para todo o campo dos direitos humanos”.