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Índios Kaingang acampam na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, e bloqueiam BR-285 no RS

Índios Kaingang acampam na Esplanada dos Ministérios
A lua linda ilumina os passos dos guerreiros rumo à Esplanada dos Ministérios. Quando o sol timidamente desponta por detrás do poder, os Kaingang já estão construindo seu espaço de reivindicação e enfrentamento para os próximos dias.
 
Eles vêm do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, onde ultimamente foram proferidos os discursos mais racistas e anti-indígenas e os processos de regularização das terras/territórios indígenas estão totalmente paralisadas.

Aproximadamente 46 indígenas chegaram de 21 terras e acampamentos indígenas e exigem a aceleração dos processos de regularização. “Temos pressa. Chega de papo furado. Vamos ficar aqui acampados até o ministro da Justiça dar andamento aos processos das terras, paralisados há mais de dois anos.Guerra é guerra se é só isso que entendem”, afirmou uma das lideranças.

Cerca de 500 indígenas Kaingang bloquearam a BR-285 na altura do município de Gentil, na manhã de hoje, (17) e ocuparam a regional da Funai, em Passo Fundo-RS. A rodovia interliga os municípios de Vacaria a São Borja. Os indígenas reivindicam demarcação das terras, também manifestam apoio às mobilizações, em Brasília e denunciam os comentários racistas do deputados federais, Luiz Carlos Heinze (PP) e Alceu Moreira (PMDB).

“O bloqueio na BR-285 só vai terminar quando tivermos uma resposta concreta a respeito das terras Kaingang aqui no Sul. Temos vários acampamentos espalhados aqui, mas a Funai e o Ministério da Justiça parecem querer não encontrar uma solução. A manifestação só vai terminar quando tivermos uma resposta. Outra pauta nossa é sobre os comentários anti-indígenas de Heinze e Alceu, pois incitam a violência contra nosso povo, inclusive já enviamos um documento ao Ministério Público Federal manifestando nossa indignação”, aponta Isaías Jacinto Kaingang.

A situação dos indígenas no Sul do Brasil é calamitosa, muitos vivem acampados na beira de rodovias, onde aguardam a demarcação de suas terras. As moradias são de lona e madeira à beira das estradas, onde os indígenas são vítimas constantemente de atropelamentos. Na maioria dos acampamentos a Funai iniciou o processo de demarcação, porém sem finalização do processo administrativo. Em 2012 o jornal indígena, o Porantim percorreu os acampamentos indígenas no sul do Brasil, mas desde a publicação da reportagem a situação na região continua grave. “Faz dois anos que o governo federal não mexe em nenhum processo indígena no Sul do Brasil”, afirma Isaías Jacinto Kaingang.
 
História de luta e resistência

Os Kaingang  e Guarani do Sul do país têm enfrentado situações terríveis de violência e invasão de seus territórios sofrendo discriminação e atitudes racistas por parte do modelo político e econômico de ocupação da região. Chamados de caboclos ou bugres, nunca foram aceitos como cidadãos desse país, muito menos enquanto povos diferenciados com seus direitos étnicos e culturais reconhecidos e respeitados. Seus territórios foram sendo invadidos e tomados pelas frentes de expansão agropecuária e as populações indígenas confinadas em pequenas áreas.

Em 1978, a situação estava dramática. Todas as terras indígenas do Sul do país estavam invadidas, algumas transformadas em áreas de preservação e outras destinadas aos latifundiários ou projetos de colonização.  A Terra Indígena, Nonoai, estava ocupada por mais de 10 mil não indígenas, todos incitados por políticos a ocuparem terras dos índios, pois o governo se comprometera a legalizá-la para os latifundiários. Diante disso, os Kaingang exclamavam: “Ou morremos pelas invasões ou recuperaremos nossas terras”. E partiram para a luta. Uma verdadeira guerra de expulsão dos invasores. Numa mesma noite queimaram as cinco escolas de vilas de colonos dentro da área. Estrategicamente colocaram todos os invasores para fora sem apelo à força ou armas, a não serem as armas da cultura e a coragem guerreira.

“É nós mesmos que resolvemos. Agora teremos que resolver novamente a recuperação e demarcação de nossas terras”, reiterava os indígenas. Hoje existem dezenas de acampamentos Kaingang e Guarani, sem que o Governo Federal dê qualquer sinal de regularização dessas terras. “Não aceitaremos essas vergonhosas e enganosas mesas de negociação. Direito não se negocia!”, os indígenas exigem a imediata retomada da regularização – identificação, portaria declaratória, demarcação e homologação dos processos paralisados, nas mesas e gavetas do ministro, Funai e presidência da República.

Índios e colonos na mesma luta

Uma realidade promissora neste acampamento é a presença de agricultores que estão unidos aos índios para exigir solução da questão da terra, devolvendo a terra aos índios, indenizando e reassentando os pequenos agricultores.

Aliás, essa tem sido a bandeira do movimento indígena e de seus aliados, especialmente o Cimi, cobrando sempre uma ação efetiva do Estado brasileiro no sentido de reconhecer os direitos originários dos índios e os direitos dos pequenos agricultores: a terra para plantar e viver. Foi desse processo de Nonoai  que nasceu o  MST.

A agenda do acampamento vai sendo construída na medida em que forem se desenrolando as atividades junto aos diversos Ministérios, no Congresso. Os indígenas já solicitaram uma audiência com o ministro da Justiça, do qual exigem respostas imediatas. Um documento com as reivindicações será entre ao ministro, José Eduardo Cardozo.

Homenagem à guerreira Ana Fortes Fendô

Há duas semanas, faleceu uma das baluartes  guerreira, com mais de cem anos de idade, lutadora pela terra, razão pela qual esteve várias vezes em Brasília. Os Kaingang deste acampamento fazem desse momento de luta uma homenagem a todos e todas que lutaram e possibilitaram a resistência até agora.

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