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Profecia social em uma assembleia religiosa

por Marcelo Barros*

A profecia social em uma comunidade religiosa (conversa sobre Lucas 4, 21- 30).

O evangelho lido nesse 4º domingo comum (do ano C) continua o relato do domingo passado e nos mostra a reação dos homens da sinagoga à proclamação que Jesus fez de um ano de libertação como anunciava o 3º Isaías (Is 61, 1- 2). Jesus o toma como texto a ser lido no culto e unindo-o a outras profecias como Is 35, proclama um ano de graça, ou seja, um Jubileu extraordinário, um tempo de libertação para o povo.

A reação dos ouvintes é estranha. A maioria das traduções interpretam que, no primeiro momento, todos na sinagoga, ficam maravilhados com a proposta de Jesus. (O verbo grego pode ser traduzido por maravilhar-se, o que é uma reação positiva ou espantar-se, o que é uma reação negativa). Se ficaram maravilhados é porque o acolhem como um terapeuta, um curador popular. (Quem sabe, ele abre uma clínica de cura aqui em Nazaré!).

Nazaré era um dos centros do nacionalismo judeu e do que, na época, se chamava de “mentalidade zelota”, isso é, a postura dos judeus que queriam libertar Israel dos romanos. Por isso, é normal que, em Nazaré, os conterrâneos de Jesus, naquela sinagoga, o acolhem como terapeuta, mas o querem com exclusividade. Acham ótimo a proclamação do Jubileu de libertação, mas para nós. E Jesus os decepciona e mesmo os agride.

Jesus diz a eles que se um profeta é impulsionado pelo Espírito de Deus (o sopro divino), nunca poderá ser profeta só em sua própria terra. Deus o manda sempre para fora e para os outros. Havia muitas viúvas pobres em Israel no tempo de Elias, mas Deus mandou o profeta para a viúva de uma aldeia estrangeira chamada Sarepta. Havia muitos leprosos no tempo de Eliseu, mas Deus o mandou curar Naaman, o sírio. A salvação é para todos e o profeta deve anunciar isso. Nos Atos dos Apóstolos, Paulo tenta pregar nas sinagogas e como os judeus daquelas sinagogas não aceitam que os outros se salvem igual a eles, Paulo deixa as sinagogas e vai anunciar a fé aos de outros povos e religiões. Assim aconteceu com Jesus.

Alguns intérpretes pensam que desde o começo, eles se espantaram com o fato de que do texto de Isaías, Jesus só tomou as palavras de graça. Deixou de lado e não leu as promessas de vingança que Isaías tinha escrito no mesmo texto. Por isso, Lucas diz: “Eles se espantaram (ou se maravilharam) com as palavras de graça que saíam da sua boca”.

De um jeito ou de outro, até hoje, para nós, essa proposta de Jesus nos desafia. No ponto de vista religioso, ainda temos dificuldade de aceitar que Deus manifesta sua presença e sua salvação não apenas na nossa Igreja e na nossa comunidade, mas para todos e especialmente para os de fora. Ainda ignoramos ou mesmo rejeitamos as religiões negras ou indígenas e ficamos fechados na nossa sinagoga.

Essa proclamação que Jesus faz do seu projeto de vida e de ação fundamenta todo o nosso esforço não somente pelo diálogo intercultural e inter-religioso, mas por uma espiritualidade que procura perceber que palavra Deus me dá através do outro e do diferente. Jesus mostra que o pluralismo que existe no mundo de culturas e de religiões está dentro do plano divino e que devemos não somente aceitá-lo, mas aprender com essa boa diversidade. E quem é discípulo/a de Jesus sabe que é chamado a ser como Jesus: enviado/a para servir e dar testemunho do amor divino aos de fora (de outras religiões e outras culturas) e não apenas para os de dentro (das Igrejas e instituições da nossa cultura e religião).

Do ponto de vista social, muitos cristãos até hoje estranham a profecia social. Jesus anunciou a sua missão com palavras que nada tinham de religiosas, (curar doentes, libertar os presos e proclamar um tempo de libertação para todos). Como fica isso em tempos nos quais as pessoas dizem: Deus acima de todos, mas para ser usado para dar poder e servir a interesses pessoais?

Nesse texto do evangelho, as pessoas que vão se indignando contra Jesus e chegam ao ponto de querer matá-lo são as pessoas mais religiosas e que querem matar Jesus porque se sentem agredidas em sua fé religiosa. Jesus enfrentou a animosidade dos religiosos, antes mesmo de ser rejeitado pelos políticos do império.

O texto diz que eles queriam prendê-lo, mas Jesus passou pelo meio deles e saiu. É como se, através desse gesto, Jesus tivesse perguntando: De que lado vocês estão? Eu anunciei que chegou o tempo da libertação dos oprimidos e de todos os que estão sofrendo. Com isso vocês no lugar de se alegrarem, se ofenderam. Que religião é essa? Que Deus é esse que vocês adoram???

Um filme atual que está no circuito brasileiro se chama “O Confeiteiro”. Trata-se de um rapaz alemão que vai a Jerusalém em busca do amante morto e se emprega no bar da viúva do seu amigo. E com sua capacidade imensa de confeiteiro, faz bolos deliciosos que provoca o aumento da freguesia do bar. Mas, os judeus ortodoxos rejeitam que ele use o forno e proíbem às crianças de comerem qualquer coisa que o rapaz der, porque não é kosher (comida pura segundo a lei). E a viúva percebe como a lei religiosa oprime e, em nome de Deus, provoca segregação e não amor e união. Que Deus é esse?

Ontem ou hoje foi o aniversário de nascimento (90 anos) do padre Camilo Torres que ainda jovem deu sua vida pela libertação do seu povo. Ele foi praticamente expulso do ministério presbiteral e isolado pelo seu bispo e por sua Igreja. Foi abandonado pelos religiosos, antes de ser assassinado pelo exército que o encontrou em meio aos jovens que procuravam libertar o país.

Mesmo se não concordarmos com a opção política de Camilo Torres ao entrar na guerrilha, a profecia dele foi revelar que quem é de Deus não pode ficar indiferente ao sofrimento do povo e não pode continuar compactuando com um poder opressor. Essa é a profecia que Jesus traz para nós: a pergunta De que lado, está o Deus no qual cremos? De que lado estamos nós???

Publicado no blog do autor.

Foto de capa: acervo CEBI

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