Neste ano de 2015, registros parciais do Banco de Dados do Centro de Documentação Dom Tomás Balduino dão conta de 46 pessoas assassinadas e 79 ameaçadas até a presente data. O número de pessoas assassinadas é o maior desde 2004.
O grave desta situação é que as ameaças, registradas em Boletins de Ocorrência feitos nas delegacias de Polícia ou denúncias feitas à Ouvidoria Agrária Nacional, à Secretaria de Direitos Humanos ou a outros órgãos públicos, não encontram a merecida atenção e não são elucidadas. Com isso, os que ameaçam ficam impunes e as vítimas desprotegidas. A omissão do Estado é gritante. Poucas das vítimas são inseridas no Programa de Defensores dos Direitos Humanos, que tem se mostrado com sérias fragilidades nos acompanhamentos.
Das 79 pessoas que receberam ameaças em 2015, quatro foram executadas:
– A líder comunitária, Maria das Dores Salvador Priante, ‘Dora’, assassinada no dia 12 de agosto deste ano, em Iranduba, AM. Ela havia registrado dois Boletins de Ocorrência das ameaças que recebia. Também as havia denunciado à Assembleia Legislativa do Amazonas.
– Jesusmar Batista de Farias, assassinado em Anapu (PA) no dia 11 de agosto, havia recebido ameaças em 25 de maio, em sua oficina de motos, por uma pessoa que se apresentou com parente de Zé Iran, um suposto dono da terra em conflito, o lote 83 da Gleba Bacajá.
– José Nunes da Cruz Silva (Zé da Lapada), assassinado em Anapu (PA), em 27 de outubro, diante da esposa, recebera ameaças menos de um mês antes da morte, da parte de Debs Antônio Rosa, que se apresenta também como um dos donos do lote 83.
– Raimundo Santos Rodrigues, Conselheiro do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), na Reserva Biológica do Gurupi e Presidente da Associação dos Pequenos Produtores Rurais do Rio da Onça II, foi assassinado no dia 25 de agosto, em Bom Jardim (MA), numa emboscada. Em 18 de junho, recebera ameaças de Jesus Costa.
Em 2014, cinco das trinta e seis pessoas assassinadas já haviam recebido ameaças de morte. Entre elas, a ex-presidenta do Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura de União do Sul, em Mato Grosso, Maria Lúcia do Nascimento. Ela havia registrado Boletins de Ocorrência das ameaças sofridas e o fato foi comunicado ao Ouvidor Agrário Nacional, desembargador Gercino José da Silva Filho, na Audiência Pública de 05 de agosto, em Cuiabá, uma semana antes do assassinato, que aconteceu no dia 13 de agosto.
Nesta mesma Audiência, o trabalhador rural Josias Paulino de Castro, Presidente da ASPRONU (Associação de Produtores Rurais Nova União) e sua esposa, Ireni da Silva Castro, denunciaram as ameaças que sofriam. Josias afirmara: "Estamos morrendo, somos ameaçados, o governo de Mato Grosso é conivente, a PM de Guariba protege eles, o Governo Federal é omisso, será que eu vou ter que ser assassinado para que vocês acreditem e tomem providências?”. Foram assassinados no município de Colniza (MT), em 16 de agosto de 2014, 11 dias depois da audiência.
Em 2011, após o assassinato do casal Maria do Espírito Santo e José Cláudio, em Nova Ipixuna, Pará, a CPT levou à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República a relação de 1.855 pessoas que haviam sofrido ameaças de morte entre os anos 2000 e 2011. Dessas, 42 haviam sido assassinadas, 30 haviam sofrido tentativas de assassinato e 165 haviam sofrido mais de uma ameaça. Entre 2012 até a presente data o número de pessoas ameaçadas de morte somou 799. Dessas, 18 foram assassinadas, 22 sofreram tentativas de assassinato e 124 sofreram ameaças mais de uma vez.
As ameaças atingem não somente os trabalhadores, mas também os que os apoiam. Das 799 pessoas ameaçadas, de 2012 até a presente data, 28 se encontravam na categoria de agentes de pastoral, missionários ou religiosos. 16 são agentes da CPT. Outros quatro ameaçados eram advogados e dois ambientalistas.
A maioria das ameaças e intimidações é decorrente de conflitos por terra, defesa dos direitos territoriais e ambientais. Elas partem dos próprios fazendeiros, mas a maior parte das vezes de seus jagunços ou pistoleiros. É comum a presença de policiais nas milícias que dão suporte às fazendas, como têm denunciado reiteradamente os camponeses da região de Ariquemes e Vale do Jamari, em Rondônia.
Diante desse recrudescimento da violência no campo, o Conselho Nacional da CPT EXIGE uma ação rigorosa, elucidativa e punitiva para os casos de ameaças de morte, agressões e assassinatos nos conflitos agrários.
Uma presença efetiva do Estado é necessária para dar segurança e garantia de vida não só aos ameaçados individualmente, mas às comunidades às quais pertencem, pois as ameaças às lideranças e aos que as apoiam têm como objetivo direto minar as comunidades na sua capacidade de resistência e enfrentamento.
É inconcebível que o campo, a terra e o território de tantas comunidades e povos, espaço de vida, cultura e produção, em pleno século XXI, continuem sendo expropriados e palco de uma barbárie histórica e assassina.