Confira as reflexões da ll Jornada de Educação Popular, que ocorreu nos dias 30 de setembro e 1º de outubro, em Tatuapé, São Paulo.
Mesa de debate do segundo dia da II Jornada de Educação Popular contou com falas de ativistas trans e do movimento negro
Estorvo Silva, educadora de História no cursinho Transformação, voltada para a população trans, e Thaís Santos, mestranda em Sociologia e integrante do Hub das Pretas, dialogaram sobre temas como juventude, racismo, gênero e sexualidade, entendimento do lugar do outro, poder e o papel da educação no caminho para a representatividade.
A fala de Estorvo Silva deu início ao debate com questionamentos acerca do sentido das palavras que davam nome à mesa, em um momento histórico em que diversas terminologias estão sendo reavaliadas, dentro e fora do ensino educacional. A educadora chamou atenção para as palavras que usamos em sala de aula, afirmando que não sabemos da realidade dos alunos fora do ambiente escolar e o que podem passar em seus lares ou na rua.
“Presenciamos uma falta de diálogo entre educadores e educandos, e o primeiro passo a ser dado através da educação é falar sobre corpo, enquanto feridas, enquanto cor, enquanto estrutura atuante e potente em vivências, diferenças, identidade”, opinou.
Para Estorvo, a educação pensada para o corpo é a educação que se apresenta como possibilidade de ampliação de “corpos feridos”.
“A educação deve trazer o espaço para mais pessoas para a democracia tornar-se verdadeiramente participativa, e nessa tarefa até o material didático escolar carece de revisão.”
A segunda a falar foi Thaís Santos, que começou esclarecendo as diversas formas de como o racismo atua não só na educação, mas na sociedade como um todo, negando desde o acesso à tomada de decisões políticas no país até acesso a bens materiais.
“O Estado brasileiro manipula a retirada de pessoas negras de alguns lugares, estagnando-as em outros. Isso se dá a partir da sua necessidade própria de Estado racista em que as políticas públicas deixam de atuar nessa questão”, criticou.
Para a socióloga, o questionamento à democracia tem início no momento em que percebemos um avanço conservador visível através da situação política que temos hoje em nosso país. Thaís citou como exemplo a decisão do Supremo Tribunal Federal no último dia 27, que autorizou que o ensino religioso na escola pode ser abordado a partir de uma única vertente religiosa.
“Esse é apenas um exemplo da diminuição de direitos direcionados pela guinada conservadora atual, interferindo no direito das pluralidades existirem”, afirmou.
Outra questão destacada foi a Lei nº 10.639/03, aprovada em 2003, e que regulamentou o ensino da cultura negra nas escolas. No entanto, segundo Thaís, até hoje esse ensino é negligenciado nas instituições de ensino. “A escola não é interessante para a juventude negra”, criticou. A socióloga apontou também que “o racismo institucional não só nega o poder, mas funciona diretamente matando e prendendo a população negra em massa”. Apesar disso, porém, “o racismo também é um problema de todas as pessoas, pessoas negras e pessoas brancas”, disse.
Por fim, Thaís também lembrou que os atuais espaços educacionais vigentes são produtores de subalternização humana. “Então, como os educadores podem atuar nessa existência? A resposta está em mudar uma pedagogia pautada na morte para abordar a vida, falar dos desejos, da sexualidade, e da identidade das pessoas marginalizadas”, disse.
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Fonte: Texto de Yasmin Klein, da equipe de Comunicação da II Jornada de Educação Popular, 01/10/2017.
Ilustração de capa: José Francisco Borges, conhecido artisticamente como J. Borges, é um artista e cordelista brasileiro nascido em Bezerro, Pernambuco.