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Reflexão: Deus escuta o clamor de Agar [Bimbo]

O presente artigo tem o objetivo de fazer uma breve análise do capítulo 16 do Livro de Gênesis. Não é um texto finalizado, pois está aberto a novas e diversas análises.

Essa narrativa, tal como se encontra na Bíblia, provavelmente é, na sua maioria, do período da edição final do Pentateuco, já no pós-exílio, durante a dominação persa em Israel (539 a 333 AEC). É um período em que as mulheres e os estrangeiros eram muito discriminados e maltratados, tal qual aconteceu com a egípcia Agar. Isso se dava porque, nessa época, a ideologia da raça pura era muito forte, com o intuito de garantir a identidade comunidade judaica pós-exílica em torno do templo reconstruído. Diante disso, a resistência das mulheres e dos estrangeiros foi muito forte.

É interessante observar, numa leitura mais apurada, que o episódio ocorrido com Agar pode ser comparado com outro fato narrado no livro do Êxodo.

Primeiro, conhecendo a história do povo hebreu no Egito, é sabido que lá vivia uma vida de escravidão e de maus tratos por parte dos egípcios. No relato de Gênesis 16, a situação parece invertida. Aqui, a egípcia Agar é que sofre maus tratos e ainda é escrava numa relação de mulher com mulher (Sara x Agar). Quem antes oprimia agora é escravizada.

Em segundo lugar, há mais um fato interessante a ser observado nesses dois relatos, o do povo hebreu, que era escravo dos egípcios, e o de Agar, que era egípcia e é escrava. É que Moisés, um homem, é protagonista no relato do livro do Êxodo, enquanto que, no relato de Gênesis, Agar, uma mulher, é quem se torna a protagonista.

Terceiro, assim como os hebreus fugiram por causa da opressão, Agar também fugiu por causa dos maus tratos que lhe eram impostos por sua “dona”. Além disso, ainda é possível observar mais coincidências ou contradições. Em Êxodo, Deus ouve a voz dos oprimidos, dos pequenos e se coloca a seu favor. Também no relato de Gênesis16, Deus escuta o clamor dos pequenos e oprimidos e também se coloca a favor deles. Tanto Moisés quanto Agar são destinatários e portadores da mensagem de Deus para os oprimidos.

Porém, interessante mesmo, na narrativa de Agar, é perceber a memória e postura subversiva das mulheres diante dos abusos de quem detinha o poder. Essa subversão serviu, certamente, como forma de resistência contra os maus tratos que elas sofriam, especialmente, como já mencionado acima, no período do pós-exílio. Esse foi um tempo em que se impunha uma relação excludente para com mulheres e pessoas estrangeiras, exclusão legitimada pelo poder sagrado, que limitava Deus ao templo, ao qual estrangeiros, por não serem do povo da aliança, e mulheres, por não terem plena pertença ao povo eleito, não tinham acesso. Portanto, Agar, que era estrangeira e mulher, não podia ter acesso ao sagrado no templo. Provavelmente por isso os redatores do texto a colocam em contato com o sagrado no deserto, próximo à fonte, ao poço com água.

Curiosa é a situação do patriarca Abrão. Ele ouve sua mulher Sara e faz o que ela “determina”. Parece não ter nenhuma preocupação com Agar, com quem obteve prazer e, inclusive, gerou um filho. Abrão não deveria defender Agar, que lhe dera um filho, tornando-o ainda mais “abençoado” por Deus? A postura do patriarca parece não coincidir com a proposta de Deus de promover e defender a vida. Certamente, Agar não sobreviveria naquele deserto se não fosse a intervenção de Deus a seu favor, pois “o anjo de Javé encontrou Agar juto a uma fonte no deserto, a fonte que está no caminho de Sur. E lhe disse: ‘Agar, escrava de Sarai, de onde você vem e para onde vai?’ Agar respondeu: Estou fugindo de minha patroa Sarai” (Gn 16,7-8). Fugir, no contexto da opressão, é resistir e buscar a liberdade, é realizar a páscoa, a passagem de uma vida de opressão para uma vida de liberdade, é dizer não à opressão e ao descaso imposto pelo/a opressor/a.

Subversão

A atitude subversiva de Agar propiciou a ela e a seu filho uma vida mais longa, pois não morreram no deserto. E depois que o menino já estava adulto, Agar, que é protagonista, parece não querer misturar sua raça com qualquer outro povo, pois “Deus estava com o menino. Ele cresceu, morou no deserto e tornou-se um arqueiro. Morou no deserto de Farã, e sua mãe escolheu para ele uma mulher egípcia” (Gn 21,20-21).

É óbvio que esse texto de Gênesis 16 foi analisado, tendo como perspectiva a leitura feminista, com foco na defesa da mulher oprimida. Outras óticas são possíveis. Não se pode esquecer que, naquela época do pós-exílio, eram os grandes do campo, os sacerdotes do templo, a estrutura patriarcal e machista que impunham o seu modo de vida, no intuito de fazer prevalecer seus privilégios políticos e religiosos, sempre com a “proteção” e a “benção” de Deus, de acordo com a teologia da retribuição. Assim, as pessoas mais fracas, pobres e estrangeiras, bem como as mulheres e as crianças eram mandadas embora. Não deviam fazer parte daquela convivência, não podiam ter direitos, até mesmo com o intuito de manter a pureza da raça, sem mistura.

O livro de Esdras já aponta, na prática, para essa situação de exclusão e abandono, especialmente das mulheres: “Então, Esdras se levantou e declarou: ‘vocês foram infiéis ao se casarem com mulheres estrangeiras, agravando a culpa de Israel. Agora, confessem isso a Javé, o Deus de seus antepassados, cumpram a vontade dele, e separem-se da população local e das mulheres estrangeiras” (Esd 10,10-11). As mesmas atitudes excludentes são encontradas no livro de Neemias em relação aos pobres e estrangeiros: “Pois bem! Nós somos iguais aos nossos irmãos, e nossos filhos são como os filhos deles! Apesar disso, somos obrigados a sujeitar nossos filhos e filhas à escravidão. E algumas de nossas filhas já foram reduzidas à escravidão, e não podemos fazer nada, pois nossos campos e vinhas já pertencem a outros” (Ne 5,5).

Agar, na sua subversão, mostra não ser essa a proposta de Deus e, por isso mesmo, busca nova forma de vida ou é levada a buscar nova vida.

Fonte: Texto escrito por Bimbo, integrante do CEBI-ES.

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