via Angeliquisses*
Toda teologia é pensada a partir de seu contexto histórico-cultural. Para falar de teologias da libertadoras é necessário compreender os problemas sociais de cada território, dessa maneira, é impossível dizer que a teologia feminista é única. A teologia feminista é, em sua essência, plural. E para nos aprofundarmos mais nas lutas e saberes de nossas irmãs, precisamos conhecê-las e aprender novos ritmos teológicos. Para Kwok Pui Lan
“As mulheres asiáticas compreendem mais de um quarto da população mundial. Vivem em um fascinante continente multilíngue, multireligioso e multirracial e na diáspora em todo o mundo. As culturas asiáticas têm hábitos alimentares diversos, modos de vida e realidades sociais e culturais. As vozes teológicas femininas asiáticas são moldadas pela imensa diversidade cultural e religiosa e são pluralistas e multivocais, tecidas de muitas linhas separadas.”
Na minha caminhada com a teologia feminista e diálogo inter-religioso algumas pensadoras foram e são especiais para um mistura boa dessas duas áreas que sou apaixonada. Apresentarei cinco teólogas feministas asiáticas que trazem mais temperos para o caldo teológico feminista.
Chung Hyun-Kyung
Chung Hyun Kyung é uma teóloga coreana (prebiteriana) e professora de teologia ecumênica da Union Theological Seminary nos Estados Unidos, da qual possui o Ph.D. . Ela se bacharelou e fez o mestrado na Ewha Womans University em Seoul. É mestre em Divindade (Master of Divinity ) da School of Theology at Claremont
Em 1990 ela introduziu uma teologia asiática da mulher no seu livro Struggle to be the Sun Again (Luta para ser tornar o Sol novamente). Nesse livro ela interpreta o evangelho como uma mulher coreana, fala sobre a sua busca por significado na luta pela integridade da história de seu povo pela liberdade.
No ano de 1991 houve o encontro do Concílio Mundial de Igrejas (World Council of Churches). Ela discursou no encontro e foi acusada de sincretismo, por combinar os ensinamentos cristãos com elementos de outras tradições. Sua resposta para essa acusação foi digna:
“Se eles me perguntam, “Você é sincrética?”, eu digo, “Você está certo, eu sou sincrética, mas você também!”. Minha resposta é que eu sei que sou sincrética, mas você não sabe que é sincrético porque você tem um poder hegemônico… Culturas não cristãs, quanto tentam interpretar o evangelho foram da experiência deles, eles acusam de sincretismo! Mas eles só estão sendo verdadeiros a sua própria identidade, história e cultura. Sincretismo é um dado. Como alguém já disse: ” Todo o movimento cristão é um movimento sincrético.” (ZH Interviews)
A teóloga Chung Hyun Kyung é identificada com a teologia Minjung.
“A “Teologia Minjung” é uma “teologia em solidariedade com o Minjung” ou uma “teologia do Minjung”. O termo sino-coreano de difícil tradução poderia ser traduzido em termos coloquiais como “povo/povão/plebe”. Ao usar esse termo a Teologia Minjung, entretanto, não pensa em um grupo específico de pessoas, mas na exclusão social na qual pobres se encontram com maior frequência que ricos e poderosos. Em determinadas circunstâncias uma pessoa pode ser considerada minjung num aspecto, e em outros, não. Quem estiver marginalizados em termos políticos, econômicos, culturais, morais ou religiosos faz parte do minjung naquele aspecto específico” (LIENEMANN-PERRIN, 2005, p. 102-103)
É nesse contexto teológico que a nossa teóloga faz parte. Seu discurso desafia os valores Ocidentais impostos ao Terceiro Mundo. Sua pesquisa e ensino incluem teologias feministas e espiritualidade da Ásia, Africa e América Latina, diálogo inter-religioso entre budismo e cristianismo, revoluções para mudanças sociais como também a história de várias teologias cristãs asiáticas.
Como é uma palestrante carismática, Kyung produziu uma série de oito partes para a TV Pública Coreana chamada The Power of Women in World Religions (O poder das mulheres nas religiões do mundo), foi uma série premiada na Coreia. Além de um vídeo no TEDxWomen. Suas publicações incluem inúmeros artigos e livros, como o já citado Struggling to be the Sun Again: Introducing Asian Women’s Theology; In the End, Beauty Will Save Us All: A Feminist Spiritual Pilgrimage, Vols. I and II (publicado em coreano);Letter From The Future: The Goddess-Spell According to Hyun Kyung(publicado em coreano).
Evangeline Anderson-Rajkumar
Evangeline Anderson-Rajkumar é teóloga e ativista feminista e dalit. Pastora luterana e foi a primeira mulher eleita para ser vice-presidente das Igrejas Evangélicas Luteranas Unidas na Índia. É professora do Lutheran Theological Southern Seminary em Columbia, Carolina do Sul. Foi a primeira mulher permanente a fazer parte do corpo docente do Departamento de Teologia do renomado Serampore College.
Alguns de seus escritos: “The Violence of Silence: Reviewing the Church’s stance on the issue of Domestic Violence” in Asian Christian Review; “Engaging the dis-ease of silence and passivity in church and society: New energy from rereading the Bible through a gender lens.” In In love with the Bible and its ordinary readers: Hans de Wit and the intercultural Bible reading project, edited by Hans Snoek. Elkhart, IN: Institute of Mennonite Studies, 2015, pp. “Womb: Is it inside or Outside? Reflections on the issue of Women renting their wombs” in The Yobel Spring. Vol 1 eds. Praveen PS Perumalla, et al., ACTC &ISPCK, Delhi, 2013, pp. 239–248.
Kwok Pui Lan
Kwok Pui Lan nasceu em 1952, na cidade de Hong Kong. Ela se converteu ao anglicanismo ainda adolescente e se tornou uma teóloga feminista. Se doutorou em Harvard e recebeu diversos prêmios na área. Possui influência internacional e atua como professora de Teologia Cristã e Espiritualidade na Episcopal Divinity School, em Cambridge, Massachusetts.
Autora e editora de diversos livros em chinês e inglês, como por exemplo, Postcolonial Imagination and Feminist Theology (Westminster John Knox); Introducing Asian Feminist Theology (Pilgrim); Discovering the Bible in the Non-Biblical World (Orbis Books); e Chinese Women and Christianity, 1860–1927 (Scholars Press). Ela é editora da maior obra de referência sobre Women and Christianity (4 vols., Routledge), e mais recentemente, coeditora de Postcolonial Practice of Ministry: Leadership, Liturgy, and Interfaith Engagement (Lexington Books, 2016). Há uma obra traduzida para o português pela Editora Paulus, “Globalização, gênero e construção da paz – O futuro do diálogo interfé”. Nesse livro, Pui-lan fala sobre o conceito de polidoxia, que é um conceito que reconhece que os cristãos não têm o monopólio de Deus.
A polidoxia insiste que nenhuma teologia ou credo pode exaurir o sentido de Deus e alegar infalibilidade doutrinal […] A polidoxia partilha a afinidade com a teologia apofática, que insiste que a natureza de Deus não pode ser plenamente descrita, e que só podemos falar a respeito do que Deus não é, em vez de sobre o que Deus é.
A teóloga encarna sua própria teologia, que é tecida pelo corpo de mulher chinesa, cristã, feminista e pós-colonial. Entende que a teologia e hermenêutica são feitas a partir das experiências individuais e coletivas. Essa diversidade é celebrada como a integralidade da teologia, ela diz que “a mulher cristã asiática consegue responder a pergunta de Jesus ‘quem vocês dizem que eu sou?’ a partir das próprias experiências e circunstâncias.” A
integralidade da teologia se faz presente quando leva em conta a vida e dá voz às experiências dos que são vulneráveis em comparação aos poderosos. Os poderosos da teologia ainda insistem em fazer uma teologia colonial, patriarcal e ocidental e, Kwok Pui Lan, é a voz profética que vem denunciar esse tipo de atrocidade em um mundo plural e com diversas etnias.
Kwok Pui-lan representa uma forma contemporânea de fazer teologia no contexto global, incorporando sua experiência de duas etnias teológicas muito diferentes – Ocidental e Asiática, com críticas feministas e pós-coloniais. Essa integração é evidente em sua escolha de fontes teológicas e é ilustrada em sua concepção de Cristo. Sua metodologia é histórica, dialógica e diaspórica. Sua visão de Deus é orgânica
Virginia Fabella
Virginia Fabella é uma teóloga filipina e irmã Maryknoll, conhecida por seus trabalhos em teologia feminista asiática e teologia pós-colonial. Nasceu em Manilla, nas Filipinas. Ela se formou no Convento da Assunção em Manila. Em 1970, foi nomeada Diretora do Maryknoll Mission Institute e foi designada para a Região Leste dos EUA em 1976, onde atuou em Nova York na equipe do Projeto Teologia nas Américas e como coordenadora de programa da EATWOT (Associação Ecumênica de Teólogos do Terceiro Mundo).
A irmã Virginia trabalhou para ajudar as mulheres, especialmente as mulheres pobres, a alcançar algo mais na vida do que a mera existência em circunstâncias desumanas. Nos últimos anos, ela tem se engajado ativamente no tratamento de questões ecológico-ambientais. Ela também deu palestras e palestras significativas sobre ecumenismo, teologia, cultura e missão na Ásia, México, Estados Unidos e Roma. Alguns de seus trabalhos
Fabella, Virginia; Sugirtharajah, R. S., eds. (2003). Dictionary of Third World Theologies. Maryknoll, NY: Orbis Books.
Fabella, Virginia; Oduyoye, Mercy Amba, eds. (2006). With Passion and Compassion: Third World Women Doing Theology: Reflections from the Women’s Commission of the Ecumenical Association of Third World Theologians. Eugene, OR: Wipf and Stock Publishers.
Fabella, Virginia; Park, Sun Ai Lee, eds. (2015). We Dare to Dream: Doing Theology as Asian Women. Eugene, OR: Wipf and Stock Publishers.
Aruna Gnanadason
Aruna Gnanadason é uma teóloga feminista da Índia. Foi Diretora Executiva de Planejamento e Integração da na Secretaria Geral do Conselho Mundial de Igrejas. É doutora em Ministério pelo San Francisco Theological Seminary. Pertence a Igreja do Sul da Índia (CSI). Foi Coordenadora da Equipe de Paz e Criação da Justiça e do Programa de Mulheres do Conselho Mundial de Igrejas. Para ela:
A experiência da vida sem voz, sem rosto e desamparada das mulheres asiáticas que buscam força regular é espiritualidade. Os esforços das mulheres para descansar através de uma cultura de silêncio e transformar sua dor em poder político são experiências espirituais. Os esforços das mulheres para retirar-se ou sair do sofrimento, suas canções e suas histórias de luta e libertação são muito espirituais. Esta é a espiritualidade que diz “sim” à vida e “não” à morte. Na irmandade das mulheres, em solidariedade com todos os outros que são oprimidos, na simplicidade do estilo de vida do movimento de mulheres e no seu compromisso de curar a criação e um mundo ferido, as mulheres expressam a espiritualidade feminista asiática . ( 1993, p. 24)
Aruna Gnanadason escreve sobre cuidados de criação e teologia eco-feminista, globalização e culturas locais, mulheres e fé, pacificação e liderança de mudanças não-violentas, e abordando a violência contra as mulheres. Algumas de suas publicações “Asian Women in the Ecumenical Movement: Voices of Resistance and Hope” (2017), “Jesus and the Asian Woman: A Post-colonial Look at the Syro-Phoenician Woman/Canaanite Woman from an Indian Perspective” (2001), “Listen to the Women! Listen to the Earth!” (2005), “Women, Violence and Nonviolent Change” (ed.) (2009), and “Creator God in Your Grace, Transform the Earth: An Eco-Feminist Ethic of Resistance, Prudence and Care” (2012).
Referências
- KWOK, Pui-lan. Introducing Asian Feminist Theology. Sheffield: Sheffield Academic Press, 2000. ______. Globalização, gênero e construção da paz: o futuro do diálogo interfé. São Paulo: Paulus, 2015. ZH Interviews (Chung) Hyun Kyung. Disponível em <http://www.zionsherald.org/Sept2003_interview.html> Acesso <30 de jun de 2016>.
- Chung Hyun Kyung (c. 1955- ) Disponível em <http://www.feminist.com/ourinnerlives/wv_hyun_kyung.html> Acesso em <25 de jun de 2016>
- Aruna Gnanadason. 1993. No Longer A Secret. Geneva: WCC Publication. Hlm. 24. https://www.maryknollsisters.org/sisters/sister-virginia-fabella/
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Publicado originalmente no blog Angeliquisses.