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Leitura Popular da Bíblia na Holanda: Encontro com a Pastoral Juvenil Ecumênica e com Grupo de pessoas idosas

Leitura Popular da Bíblia na Holanda: Encontro com a Pastoral Juvenil Ecumênica e com Grupo de pessoas idosas
Depois de um tempo de aprendizado com o CEBI no Brasil, a jovem teóloga Sietske Blok começa a se encontrar com pequenos grupos na Holanda para, a partir da realidade de seu país, praticar a Leitura Popular da Bíblia. Eis o que partilha conosco.
Comecei a trabalhar com grupos na Holanda com Leitura Popular. Sou ainda uma visitante, mas é uma possibilidade para os grupos conhecerem a proposta. Na Holanda, o tema de pessoas refugiadas, migrantes, estrangeiras e desconhecidas é urgente. Por isso, sugeri o texto de Moisés como estrangeiro e refugiado em Ex 2:15b -22.
Li o texto com um grupo de estudantes de Pastoral Juvenil Ecumênica (sete pessoas) em Utrecht; e um grupo das idosas (onze pessoas) duma comunidade protestante em Veldhoven. Os dois encontros foram à noite. Na Holanda, temos menos tempo para encontrar, mas foi o bastante para celebrar, falar, estudar.       
         
Começamos num círculo, no meio uma vela, uma bíblia, um pano. Nós cantamos Laudate Omnes Gentes (Taizé) e a vela foi passando de pessoa de pessoa e nós falamos nosso nome. Num pequeno momento de oração, lembramos que estamos na presença de Deus. Na Holanda, nós somos um pouco tímidos/as com isso. Mas também por isso é importante fazer o esforço, tem um efeito no grupo. Um efeito de confiança, abrir-se a outra realidade, sentir.

""Ver

Quem somos nós? Cada pessoa teve possibilidade falar. O que está acontecendo em minha vida? Os estudantes falaram do processo de mudança, final dos estudos, começar do trabalhar, planos para mudar casa. Com os idosos e idosas, falamos sobre ser “estrangeiro”. Falamos sobre a experiência de estar num país estranho. Diferentes países têm diferentes tradições de hospitalidade. A experiência de notar o ‘olhar’ de outras pessoas: “Porque você é estranho?”.

Dentro da Holanda, é possível ser visto como estranho também. Temos várias regiões, o sul é diferente que de norte. A vida numa vila é diferente numa cidade. Um dos participantes contou que nasceu na Indonésia (que foi colônia da Holanda) e se mudou para Holanda com nove anos. Mas só sentiu estar em casa quando, muitos anos depois, voltou à Indonésia para ter férias com sua família. Ele vive a experiência de duas nacionalidades, de sentir estranho/estrangeiro (trata-se de um assunto na Holanda, as duas nacionalidades das pessoas holandeses com raízes na Turquia ou nos Marrocos: onde está a lealdade?).
Observamos o efeito de demência (É “semana de demência” na Holanda). Por causa dessa doença as pessoas são estranhas. Estranhos para elas mesmas, estranhas para os outros. Tudo para eles e elas é estranho também.

Julgar

Depois essa primeira etapa, abrimos a Bíblia. Lemos Êxodo 2:15b-22. Com os idosos cada pessoa leu um versículo. Minha primeira pergunta para os grupos foi: Sobre o que o texto fala? Todas as respostas foram escritas no quadro.

Respostas do grupo de pessoas idosas: hospitalidade; história da elite (Moisés é príncipe, Raguel é um “sacerdote”); coragem de Moisés, estrangeiro; casamento arranjado; um egípcio que ajudou; romance; um ‘americano’ vai ajudar, ele sabe melhor; Moisés encontra casa; Moisés mantém a independência.
Repostas do grupo de estudantes: uma fonte; ajudar; deixar; hospitalidade; filhas; casamento; um bebê; ser estrangeiro/estranho; proteger contra os pastores; conflito com os pastores; ameaça; beber e comer, importante para sobreviver; conflito.
 
""Os estudantes conseguiram ver muita coisa no texto. Moisés muda a situação das filhas. Com a chegada do estrangeiro a vida muda. Falamos também sobre o que sabemos de Moises: Foi um assassino. Um assassino da justiça? Ele foi adotado. Ele é de Israel e Egito. Ele tem duas nacionalidades. Foi um príncipe. Ele foi eleito. Foi uma criança abandonada, mas ele também é da elite.
Em pequenos grupos, foi possível conversar sobre perguntas, em busca de aprofundar o texto: Quem são as personagens? Que nós sabemos sobre eles e elas? Que significa a fonte? Como aconteceu a história, quais são as várias etapas?
Estudantes: A fonte é um lugar de encontro (Raquel e Jacó, ou o servo de Jacó; Jesus e a Mulher Samaritana), mas também dos conflitos (pastores, José). Um egípcio era uma pessoa boa ou não? Não sabemos. Como foi a relação de Egito ou Israel com Midiã ou Madiã? A família precisou de um homem. Muito rapidamente, Moisés se tornou parte da família. A água foi um motivo de mudança. Também é isso com Jesus e a mulher em João 4. É uma história de relação, mas não totalmente. Porque Moisés chamou a si mesmo de ‘estranho’ (estrangeiro) no final da história.
Idosos e idosas: Lembraram-se da fonte de Rehoboth (de Isaias). Também disseram: Moisés está em casa, mas não totalmente.
Falamos ainda nos dois grupos sobre as relações de gênero. As mulheres na história não falam. Só Zíppora tem um nome. Mas Moisés chama o filho deles ‘Gersom’. Não seria um nome dela (?). O pai dá a filha para Moisés. Será que a filha quis isso?  Ou houve uma história de romance não descrita no texto? É otimismo demais supor isso?

Agir

Os grupos foram convidados para voltar ao nosso contexto: O que significa esse texto para nós?

Idosos e idosas: Moisés foi uma pessoa de duas nacionalidades também. Foi difícil para ele. Reconhecemos esse sentimento de ser ‘estranho/estrangeiro’. Mas foi fiel a si mesmo, foi uma pessoa entre várias culturas e não tentou esconder isso. Não é importante se sentir “estranho” também? Assim, não fechamos os olhos para os “outros”, mantemos a possibilidade de sempre encontrar alguma coisa nova. Na igreja também é importante, para manter a possibilidade mudar coisas, o que já está estabelecido. Temos um canto sobre isso na igreja protestante na Holanda. É sobre se sentir um estranho no mundo, para ser mais como Cristo, mais na caminhada de Deus.
Estudantes: Somos abertos para ‘olhos estranhos’? Isso não é tão fácil. É difícil escutar vozes de outras culturas. Mais difícil ainda por causa das outras línguas. É mais fácil escutar as pessoas de Canadá, Estados Unidos, Austrália (usamos Inglês, todo o mundo na Holanda aprende bem na escola; e essas culturas desses países são mais próximas da Holanda), do que pessoas da América Latina ou África.
Todos nós somos parte de grupos, grupos nos quais nos sentimos seguro. Uma pessoa do grupo é homossexual. Para ela, é mais seguro frequentar um bar ou boate ‘gay’, do que um bar ou boate ‘heterossexual’. Sabemos que às vezes é difícil nos relacionarmos com pessoas de outras raízes. Também eles e elas preferem ficar nos grupos da mesma cultura. É mais fácil ficar com holandeses. Como nós podemos fazer para ampliar a relação entre culturas? Precisamos nos sentir seguros para ter coragem de nos relacionarmos com ‘o outro’. Há políticos holandeses de direita e contra os muçulmanos. Percebemos que seu medo é fruto da insegurança.

Celebrar

Cantamos mais uma Laudate Omnes Gentes. E as pessoas foram convidadas a partilhar uma palavra de encontro. Terminamos com uma benção.

Minha experiência:

Foram noites lindas com esses grupos. Teve conversas importantes sobre ‘estar na casa’, ‘ser estranho’, ‘os estrangeiros’, o desejo de fazer ampliar as relações entre pessoas, talvez a necessidade para se sentir ‘estrangeiro’ para se abrir ao outro. Foi um pouco mais difícil com os idosos. Há pessoas que querem ‘estudar’ o texto, mas é difícil para elas fazer a ligação com a vida.

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