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O povo que andava nas trevas viu uma grande luz

por Pe. Alfredo J. Gonçalves via Grito dos Excluídos*

A frase é do profeta Isaías. Constitui um dos textos litúrgicos mais utilizados no tempo do Advento, como preparação ao Natal. E o texto prossegue: “Uma luz brilhou para os que viviam no reino das sombras” (Is 9, 1-2). Em meio ao peso da escravidão, o profeta – e poeta – anuncia que o momento da liberdade está próximo.

Outros poemas semelhantes iluminam todo o movimento profético do Antigo Testamento. Restringindo-nos ao Livro de Isaías podemos ainda citar outro trecho: “ Vou criar novos céus e nova terra… uma Nova Jerusalém! Ali jamais haverá menino que viva poucos dias, pois morrer jovem será morrer aos cem anos (…). Os homens edificarão casas e as habitarão, plantarão vinhas e comerão o seu fruto. Ninguém mais edificará para que outro habite, nem plantará para que outro coma. Meu povo viverá tanto quanto uma árvore e meus elegidos desfrutarão do trabalho de suas mãos” (Is 65, 17-22).

Retomando a citação precedente, porém, o profeta vai além. Não deixa de registrar a realidade concreta em que vive o povo, bem como as condições necessárias para que a nova luz ilumine o horizonte dos oprimidos. E o faz com palavras que parecem impressas a ferro e fogo no tecido do contexto histórico. “Porque – diz ele com veemente eloquência – quebraste a canga de suas cargas, rompeste o bastão que batia em suas costas e o açoite do capataz de trabalhos forçados. Porque toda bota que pisa com barulho e toda capa empapada de sangue serão queimadas, devoradas pelas chamas (Is 9, 3-4).

Sob a mira da dura profecia constata-se, em primeiro lugar, a exploração do trabalho humano, simbolizada pela “canga” e pelo “açoite do capataz”. Mas constata-se igualmente a imediata repressão a uma eventual luta ou resistência por parte dos trabalhadores, simbolizada neste caso pela “bota que pisa” e pela “capa empapada de sangue”.

Passados cerca de três mil anos do exílio de Israel para a Babilônia, as palavras do profeta permanecem clamorosamente vivas e atuais. A exploração nestes tempos modernos ou pós-modernos, embora mais sutil e refinada, não é menos intensa e tampouco menos lucrativa. Aliás, nunca como hoje, o progresso técnico e o crescimento a qualquer custo, por um lado, e formas de trabalho análogas à escravidão, por outro, estiveram tão próximos. A tecnologia de ponta, ao lado da idolatria de produção-comércio-consumo, andam de mãos dadas com novas formas de exploração, tais como o trabalho informal/clandestino em suas diversas facetas: doméstico, infantil, feminino com remuneração inferior ao masculino, conexão 24 horas com a empresa, pseudo-autônomo, e assim por diante.

Com razão, assistimos a uma discrepância cada vez mais profunda, acentuada e perversa entre o pico e a base da pirâmide socioeconômica. Cresce a acumulação da renda e da riqueza e cresce, contemporaneamente, a exclusão social. Os números desse crescimento inversamente proporcional são amplamente conhecidos e notórios. Tanto em nível nacional quanto regional ou internacional, um punhado de famílias, ano após ano, tornam-se escandalosamente mais ricas, milionárias ou bilionárias.

No polo oposto da pirâmide, concentra-se a massa dos empobrecidos. Deste lado, duas consequências são inevitáveis: em primeiro lugar, a degradação e a precariedade do trabalho e das leis trabalhistas, com a proliferação do desemprego ou subemprego. Palmo a palmo, disputam-se as migalhas que caem do alto. Em segundo lugar, vem o fenômeno das migrações, com rotas, raízes e estatísticas cada vez mais numerosas, complexas e diversificadas. Um gigantesco e ambulante “exército de reserva”, o qual, em lugar de endereço fixo, troca de lugar e de moradia de acordo com os ventos do capital e da oferta de emprego.

Hoje como ontem, conforme a expressão do profeta, o desafio segue sendo o de romper com a “canga, o bastão e o açoite”, queimando ao mesmo tempo a “bota que pisa” e a “capa empapada de sangue”. Uma coisa chama a outra: tentar quebrar os grilhões da exploração significa, num segundo momento, enfrentar a bota que pisa forte.

Historicamente, no Brasil, enquanto a Casa Grande conservou intocáveis seus privilégios e benefícios, a senzala teve de contentar-se com os favores, estes últimos subordinados ao humor dos senhores de plantão. Mas sempre e quando os moradores da senzala tentaram se organizar para transformar os favores em direitos, gritou mais alto a bota do jagunço, do policial ou do soldado. Basta ter em conta os episódios sangrentos de Canudos e Contestado, ou então as revoltas dos Cabanas, do Quebra-quilos, dos Quilombos… Isso sem falar, nos dias atuais, do movimento e da luta pela terra, da perseguição aos povos indígenas, do abandono dos remanescentes de quilombolas, da repressão à organização popular, do massacre dos jovens nos meios urbanos ou de defensores dos direitos humanos por grupos para-militares… Mas aqui começa outro capítulo da história nacional que merece uma atenção toda especial.

Texto de Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs – Berna, Suíça, 17 de dezembro de 2018. Publicado originalmente na página do Facebook do Grito dos Excluídos.

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