Reflexão do Evangelho de Mateus 2:1-12
Leia a reflexão sobre Mateus 2:1-12 , texto de Lilian Sarat
O nascimento de uma criança na família causa sempre uma grande alegria e renovação. Desde os primeiros meses da gestação o bebê ganha presentes de tios, tias, amigos e amigas. A conversa gira em torno do sexo biológico da criança e qual será o seu nome. A expectativa de 9 meses é satisfeita no dia do parto, momento em que nasce uma mãe, um pai e o/a filho/a, cena sempre emocionante na nossa cultura que preza pela maternidade como valor para as mulheres. Em tempos midiáticos partos naturais ou não, são conteúdos nas redes sociais dos pais maravilhados com sua paternidade. Esse seria o padrão de homens e mulheres privilegiados numa sociedade de consumo. No entanto, a maternidade de Maria, longe de ser convencional ou privilegiada, não seria aprovada pelos homens de bem dos nossos tempos. A narrativa anterior, nos conta da gravidez de uma jovem que estava comprometida com um rapaz chamado José. Na cultura judaica patriarcal, uma mulher grávida antes do casamento era um escândalo, assim como em nossos dias, a mulher seria condenada e julgada e o apedrejamento social inevitável. Imagino que José não iria ostentar nas suas redes sociais a gravidez de um filho que não era seu. Muitos “Josés” fogem da paternidade e não assumem seus filhos, quem dirá o filho de um desconhecido. O padrão da masculinidade dos tempos de José não lhe permitia escolher por Maria estando grávida de outro. A jovem mãe teve em José um parceiro que a amou e a protegeu da violência patriarcal, assumindo seu filho que havia sido concebido por um “tal” Espírito Santo.
Ao assumir seu papel de Pai do filho de Deus, nasce a paternidade de José que se apresenta como um exemplo de um homem diferente do modelo da sua época. José, assim como Maria, tem uma experiência com o Sagrado que o toca profundamente e o impele a missão de amar, proteger, educar, cuidar do filho de Deus. Para isso ele rompe com os padrões e o papel social que era esperado dele, acolhendo e assumindo sua noiva e o seu filho.
Na cena do nascimento de Jesus, narrada pela comunidade de Mateus, não encontramos as parteiras ou outras mulheres para ajudar Maria no momento do parto, com era o costume. Se Maria estivesse vivendo uma maternidade convencional, seria comum a presença de mulheres da família nesta hora. Entretanto a família de Jesus estava em trânsito, como peregrinos no deserto, em busca de um lugar seguro. Em meio à insegurança da noite, sem ter um lugar para se hospedar, sem chá de fraldas, sem um teto, sem eira nem beira nasce o Messias esperado. Assim como seu nascimento é marcado por peculiaridades, as suas primeiras visitas não foram das mulheres da família ou dos amigos. Quem aparece para visitar o menino e adorá-lo são três “homens mágicos” chamados de Reis Magos. Quem eram aqueles homens que vinham de onde nascia o sol e seguia uma estrela em busca do Messias? A narrativa não nos traz muitas pistas sobre isso, apenas eram homens que seguiam uma estrela e buscavam conhecer o Messias esperado. Porém, antes de encontrarem a esperança viva se encontram com os poderes da morte daquele tempo, representados no texto por Herodes, os chefes dos sacerdotes e os doutores do povo que sabiam da profecia de que o Salvador deveria nascer em Belém da Judéia, para cumprimento das Escrituras. Embora o Evangelista busque provar a origem do Messias na descendência judaica, quem o procura e anuncia seu nascimento são homens estrangeiros de outras religiões e culturas.
Estes homens mágicos são os primeiros a reconhecer o milagre da vida e da resistência na imagem do menino Jesus na manjedoura e honram aquele que seria o Rei, o Salvador. Assim como José, os Magos também são alertados pelo Anjo do Senhor sobre o perigo que rondava a vida do Menino e, por isso, o protegem, não retornando pelo mesmo caminho para não encontrar novamente com a morte, agora que estavam repletos de vida e esperança.
Ao visitarem o Rei, lhes trouxeram presentes dignos da sua realeza, digamos que foi um chá de fralda inusitado, organizado pelos homens onde os presentes foram perfumes, ouro e incenso.
Assim Jesus chega neste mundo rodeado pelos homens que queremos ao nosso lado, aqueles que amam e protegem suas esposas, que rompem padrões de comportamento em nome de uma alegria maior e mais verdadeira que é se tornar pai do filho de Deus.
Quando nasceu Jesus, no mesmo instante nasceu também um pai e um mãe cheios de expectativas e medos diante da insegurança daqueles tempos. Eles não tinham nem teto nem chão, apenas a companhia das estrelas, dos animais na estrebaria e dos três desconhecidos que traziam presentes, talvez inúteis para uma mãe necessitada de fraldas, cueiros ou outros utensílios para o cuidado do bebê, mas nada disso importava, enquanto contemplavam o milagre da vida e a vinda de Deus ao mundo. Neste momento tudo se torna raro e incomum e a dor do parto, o medo da morte, a fome, o frio, tudo se dilui no brilho do céu que fica mais intenso diante da esperança que nasce no mundo.
Enquanto de um lado temos os poderes da morte tentando contra a vida do menino, de outro lado encontramos homens dispostos amar e proteger mulheres e crianças ameaçadas pela violência patriarcal. A vinda de Deus ao mundo, no corpo de um homem é a esperança renovada de relações saudáveis e amorosas entre homens e mulheres, onde a força masculina se mistura à força feminina em nome de um bem maior que é a vida. José e os três Reis Magos foram homens importantes na vida de Jesus, sem a proteção deles Maria e a criança não sobreviveriam a violência que os cercavam.
Diante do milagre da vida homens e mulheres são transformados e renovados para a construção de relacionamentos saudáveis e possíveis, onde a esperança é uma estrela a nos guiar nos caminhos da existência. A chegada de um filho ou filha é a manifestação do Sagrado, é Deus entre nós, é o amor vencendo a morte, a alegria invadindo nossa casa, a esperança que não cansa de esperançar.