No quarto domingo do advento, somos convidadas e convidados a refletir sobre o chamado de Maria para ser a mãe de Jesus. Esta informação parece simples quando lemos hoje, sem percebermos a dimensão espiritual e humana para uma mulher que não tinha consciência da tamanha responsabilidade.
O texto lança luz sobre Maria, aquela a quem o anjo Gabriel dirigiu as suas palavras, ouviu suas ponderações e gastou tempo para explicar e convencê-la de que sua vida mudaria a partir daquele momento.
O mensageiro de Deus não perde o foco quanto ao alvo do recado divino. Vai à Nazaré, uma aldeia da Galileia, lugar desconhecido e sem expressão. Não tem notícias desse lugar no Antigo Testamento. Mais tarde saberíamos que não tinha relevância política nem econômica: “Pode vir alguma coisa boa de Nazaré?” (João 1,46). É para este “fim de mundo” que o anjo se dirige para falar com Maria.
Em Nazaré, ele se dirige à casa onde Maria estava. É simbólico o espaço escolhido para a abordagem. O lugar onde a vida pulsa, chão do cotidiano, das coisas ordinárias, território do encontro. A mensagem entregue a partir da casa desenha o sentido do que viria em breve.
As atitudes do anjo foram importantes, mas a reação e a colhida de Maria são notáveis, pois definem o quadro que antecipa a visão da chegada de Jesus.
Maria escuta
A capacidade e a disposição que Maria teve para escutar as palavras do anjo são determinantes para o desenlace da história. Quantas vezes no cotidiano de lutas estamos saturados para ouvir os outros! Há momentos em que o cansaço, ou mesmo a descrença de que algo bom possa nos acontecer, inibe a disposição para dar ouvidos a alguém. Maria, no entanto, se abre para o inusitado, escuta com atenção o que anjo tinha a lhe falar.
“Alegra-te, cheia de graça!”. Receber esta benção gerou um momento de reflexão. Maria ficou perturbada sem entender o sentido daquelas palavras para a sua vida.
Maria pondera
É possível imaginá-la com seus questionamentos: O que isso pode significar para a minha vida? Por que ele me fala essas coisas sem nem me conhecer? Não conseguia esconder o estranhamento com aquelas palavras. Tudo era muito novo. Havia nela um senso de realidade, queria compreender a natureza da mensagem.
Com esse gesto, Maria ensina a necessidade de questionar qualquer ideia mirabolante que chegue a nós travestida de discurso religioso. Não é porque alguém chega com uma fala agradável que devemos acolher acriticamente.
Diante da reação, o anjo usa palavras que calam profundamente no coração da jovem. “Não temas!”. Esta frase comunica a certeza do cuidado divino ante os desafios. Era natural que Maria tivesse um pé atrás com o que acabara de ouvir.
“Não tenha com medo, você achou graça diante de Deus”. Você dará à luz um filho a quem chamará Jesus. Esta criança revolucionará o mundo. Cada palavra que define e aprofunda o papel de Jesus faz de Maria mulher tão especial.
“Como isso se dará?”. Ela insistia em compreender o que passava e estava prestes a acontecer. Aquela que mais tarde nos daria intensas lições de vida queria tão somente ter noção do que estava por vir. Essa humanidade pulsante nos encanta, pois nada disso foi empecilho para que respondesse com alma ao chamado que recebia naquele instante.
Maria vai
Ela escuta, pondera e vai. Num gesto de entrega, confiança e obediência, Maria abraça a missão. A magnitude da responsabilidade não encontra espaço para orgulho, pelo contrário, essa mulher se abre e empresta o seu corpo para que a palavra se cumpra. “Que se cumpra em mim a tua palavra”. É assim que Maria se torna fonte de inspiração pra todas as pessoas.
As palavras de Maria ressoam ainda hoje num contexto de injustiças e extrema violência contra os mais vulneráveis. Da boca de Maria ouviremos o magnificat (Lc.1, 46-56), o canto que proclama a sua fé e a sua profecia: “Ele realiza proezas com seu braço: dispersa os soberbos de coração, derruba do trono os poderosos e eleva os humildes; aos famintos enche de bens, e despede os ricos de mãos vazias”
Caminhemos na inspiração da agraciada. Prontos para a escuta, ponderação e entrega ao chamado para a transformação da realidade em que vivemos. Na força de Maria entoemos o cântico que nos estimula a lutar em favor dos pequeninos e pequeninas do reino, na certeza de que a soberba dos poderosos não prevalecerá.
Waldir Martins – Integrante do CEBI-BA