Domingo da Sagrada Família
Lucas 2,41-52
29/12/2024
Neste domingo em que se faz memória da família de Jesus, a leitura do Evangelho (Lc 2,41-52) nos oferece oportunidade de pensar também em nossas famílias, e sobretudo, nas famílias que vivem em situação de vulnerabilidade social, nas ruas, migrantes e tantas outras que, apesar de tanto sofrimento estão abertas ao mistério do amor que as sustentam.
É um tempo favorável para nos fazer próximos das famílias palestinas na faixa de Gaza, dilaceradas por bombas e balas; de nos vincularmos também às famílias do Líbano, Síria e Ucrânia, e tantas outras que sofrem por guerras; todas elas, apesar de viverem no século XXI, ainda sofrem o mesmo contexto de opressão vividas no tempo de Jesus.
A leitura de hoje encerra a narrativa sobre a infância de Jesus que “cresce em sabedoria, estatura e graça”.
Seguindo a tradição judaica, os pais levam o menino a Jerusalém, para a festa da Páscoa; porém, ele não volta com a caravana. Seus pais, preocupados, procuram por Jesus e o encontram no Templo, conversando com os doutores da Lei, especialistas na Torá.
O texto diz que os doutores da Lei ficaram extasiados com sua inteligência e com suas respostas. Devemos nos perguntar: de onde vem a sabedoria desse menino de 12 anos de idade? O que será que Jesus disse aos doutores da Lei para impressioná-los?
Pensemos um pouco sobre o contexto social e religioso do tempo de Jesus. Na tradição judaica do mundo bíblico, até os 12 anos de idade, a criança era educada pela mãe, em casa e depois dos 12 anos era conduzida à “catequese” com os mestres. Podemos supor, portanto, que o berço de Jesus e seus ensinamentos sobre a fé em Deus se dá por meio de Maria, sua mãe.
Sabemos, através do Evangelho de Lucas, que ainda grávida de Jesus, Maria canta um hino de louvor a Deus, dizendo assim: “O Todo-poderoso…dispersou os homens de coração orgulhoso. Depôs poderosos de seus tronos, e a humildes exaltou. Cumulou de bens a famintos e despediu ricos de mãos vazias. Socorreu Israel, seu servo, lembrando de sua misericórdia” (cf. Lc 1,51-54).
Diante dos sofrimentos e opressões que o povo vivia com o império romano e o governo de Herodes, Maria faz memória do Deus libertador do Êxodo. Isto significa dizer que essa teologia do Êxodo, conhecida por Jesus, nasceu na casa, a partir da mulher e mãe porque é uma teologia que nasce dos pequenos, dos “debaixo” da pirâmide social.
Jesus impressionou os doutores da Lei porque fez memória a essa teologia. Lembrando que os profetas e as profetizas são os que mais fizeram memória do Deus do Êxodo para que Israel não se desviasse do caminho e nem seguisse o caminho dos ímpios.
No trecho do Evangelho de hoje Jesus inaugura uma nova imagem de Deus. Com Jesus, Deus não é mais conhecido como o Deus dos exércitos, mas sim como Papai. Ao responder sua mãe sobre porque não os acompanhou na caravana de volta para casa, Jesus disse: “Não sabíeis que devo me ocupar com as coisas do meu Pai?”.
Pensar Deus como Pai e nós como seus filhos e filhas; e, por conseguinte, nos perceber como irmãos e irmãs é estabelecer uma grande fraternidade; uma amizade social, como nos ensina Papa Francisco, no documento Fratelli Tutti.
Nas comunidades de fé cristã, a liturgia de hoje reserva à Sagrada Família; que, muitas vezes, são vistas como uma forma idealizada e distantes dos modelos realmente existentes na sociedade brasileira, pois há milhões de famílias formadas por mães e filhos; avós e netos e outras formas de viver e crescer no amor. Aliás, nem sempre olhamos os arranjos familiares atuais pelo prisma do amor que os vincula e os fazem crescer; mas lamentavelmente, por ideologias e modelos preconcebidos.
Precisamos resgatar a grande família fraternal, ensinada por Jesus nos Evangelhos: “minha mãe e irmãos são todos aqueles que fazem a vontade do Pai”. Refletimos: o que é fazer a vontade do Pai ou se dedicar as coisas do Pai?
Diante de Deus e diante da humanidade, Jesus cresce e permanece nos impressionando com sua sabedoria todas as vezes que nos alimentamos do Evangelho, com o coração aberto, inclusive quando seguimos seus passos e acolhemos a todos e todas como irmãos e irmãs.
Simone Furquim e Hudson Rodrigues
CEBI-DF