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Coragem, não tenham Medo! (Mt 14,22-33) [Tomaz Hughes]

É comum ler nos jornais e revistas os resultados de pesquisas que apontam o medo e a insegurança entre as principais preocupações do nosso povo: o medo da violência, do desemprego, da pobreza, da solidão, da velhice e muitos outros.  O medo parece até tomar conta de uma boa parte das nossas instituições; o medo de tomar as medidas necessárias para uma justa reforma agrária, por parte das autoridades competentes; o medo por parte de muitos líderes religiosos diante dos desafios do mundo de pós-modernidade, levando até a paralisia e o fechamento; o medo de procurar novas soluções para novos desafios.  O medo parece ser a força motora da atividade – ou da falta da mesma – de muitas pessoas, grupos e instituições.

A comunidade eclesial onde nasceu o Evangelho de Mateus também sentia medo. Os seus membros (na sua maioria judeus cristãos, bem diferente etnicamente das comunidades lucanas) enfrentavam oposição e perseguição por parte de autoridades das sinagogas.  A comunidade estava em luta com o chamado “judaísmo formativo”, para definir o rumo que o judaísmo iria tomar depois da tragédia de 70 d.C., quando o exército romano destruiu Jerusalém e o Templo. Com a eliminação, pela repressão romana ou por guerra civil, dos Saduceus, dos Zelotas e dos Essênios, somente dois grupos organizados sobreviveram para disputar a liderança dentro do judaísmo: o da linha farisaica e o grupo judeu cristão, representado pela comunidade de Mateus.  Era uma luta de muito radicalismo, como costuma acontecer nas brigas fratricidas.

O sofrimento da comunidade de Mateus é retratado em Mt 10,22: “Sereis odiados por todos por causa do meu nome.  Mas quem perseverar até o fim será salvo”.

É neste contexto que se entende o texto de hoje. Os discípulos, ao verem Jesus, acham que é um fantasma e ficam apavorados. A comunidade de Mateus era semelhante. Diante da perseguição e do sofrimento, Jesus parecia para eles um fantasma, uma ilusão, uma fugacidade, incapaz de dar sustento à sua vida comunitária de fé.

Diante do medo dos discípulos, Jesus é taxativo: “Coragem!  Não tenham medo! Sou eu!”. Mateus relata essa história (como Mc 6,45-52, enquanto em Jo 6,16-21 ela é mais sóbria) para ajudar a sua comunidade a entender que Jesus não é fantasma, mas uma presença real, vivificante, fortalecedora e libertadora no meio da comunidade, especialmente na hora das dificuldades  e perseguições.

Tipicamente, o Evangelho de Mateus destaca a figura de Pedro (como também em 16,13-20; 17,24-27), diferentemente de Marcos e João.  Pedro era personagem muito importante em Antioquia, talvez o local da última redação de Mateus.  Aqui Pedro é o protótipo do discípulo: cheio de amor, mas com uma fé enfraquecida pela dúvida.  O estender da mão de Jesus é um convite a Pedro, à comunidade de Mateus, e a nós hoje para dar uns passos para o desconhecido, para não nos fechar nas nossas seguranças, frequentemente falsas, que nós mesmos construímos, mas de termos a coragem de enfrentar os ventos da vida, mesmo quando contrários, pois Jesus está realmente conosco e, como disse Paulo, “se Deus está conosco, quem estará contra nós?” (Rm 8,31).

Ter fé e não ter medo por causa de Jesus não quer dizer: “Não tenham medo, confiem em Deus, e Ele garantirá que as coisas que os amedrontam não lhes acontecerão”, mas antes: “Não tenham medo, confiem em Deus. É bem possível que as coisas que os amedrontam vão lhes acontecer, mas não devem ter medo disso, porque Deus estará ao seu lado”!

A fé em Deus não tira os nossos sofrimentos e dificuldades, como querem tantos hoje, mas nos dá as forças necessárias para vencê-los. Deus não é um analgésico para as dores e dificuldades da vida, mas uma presença amorosa que anima, fortaleça e estimula, pois, como disse Paulo, “a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (1Cor 1,25).

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