Leia a reflexão do evangelho sobre Lucas 24,46-53, com autoria de Tomaz Hughes.
Boa leitura!
Chegamos ao último trecho do Evangelho de Lucas. Quase todo este capítulo é encontrado somente em Lucas e revela bem o seu pensamento. Podemos dizer que o Evangelho todo culmina na postura dos discípulos descrita no versículo 52: “Eles o adoraram”. Esta é a primeira e única vez que Lucas diz que os discípulos adoraram Jesus. Aqui há uma aproximação entre a cristologia de Lucas e a de João em Jo 20,28.
O trecho abre com uma frase que faz lembrar os dois discípulos na estrada de Emaús: “Jesus abriu a mente deles para entenderem as Escrituras.” (v. 45). Vale a pena salientar que ele fez que eles “entendessem” as Escrituras – não que as “conhecessem”, pois estavam bem a par de tudo o que as Escrituras falavam! O problema deles – como dos dois de Emaús – era de entender como as Escrituras podiam iluminar a sua caminhada, na sua situação concreta.
Lucas frisa que o anúncio do Evangelho incluirá a grande Boa Nova do perdão dos pecados. Essa Boa Notícia “será anunciada a todas as nações, começando por Jerusalém” (v. 47). Aqui, explica como a salvação chegará aos outros povos – através da pregação e testemunho das comunidades cristãs. Por isso, devemos entender a frase “E vocês são testemunhas disso” (v. 48) como referente não só aos Onze, mas a todos os discípulos e discípulas de Jesus. Podemos lembrar-nos de Lc 24,9.33 – onde enfatiza que, além dos Onze, estavam também presentes “os outros”. Isso é importante para que não caiamos na cilada de achar que a missão de testemunhar os valores do Reino seja algo reservado aos ministros ordenados. Não é possível ser discípulo/a de Jesus sem ser missionário/a. Essa incumbência e privilégio vêm do nosso batismo. As comunidades poderão contar com um poderoso ajudante nesta missão gostosa, mas árdua – o Espírito Santo, prometido pelo Pai: “Agora, eu lhes enviarei aquele que meu Pai prometeu” (v. 49). O cumprimento dessa promessa será graficamente descrito na continuação da obra de Lucas, nos primeiros dois capítulos dos Atos dos Apóstolos.
O último parágrafo contém numerosas referências a Lc 1,5–2,25. O texto grego usa o verbo que no Antigo Testamento é usado para descrever o Êxodo, quando diz: “Jesus levou os discípulos para fora da cidade” (v. 50). Para Lucas, Jesus está prestes a completar o seu Êxodo ao Pai. Mas antes, “Ergueu as mãos e os abençoava” (v. 50b). É a única vez que, no Evangelho de Lucas, se diz que Jesus abençoou alguém. No fim da liturgia da sua vida, Jesus dá a sua bênção final aos que vão continuar a sua missão. Os discípulos sentem grande alegria – um tema destacado no início da vida de Jesus, no seu nascimento em Belém, quando os anjos trouxeram notícias de grande alegria. A alegria prometida no início está presente no fim. Por isso, os discípulos se encontram no Templo, onde Jesus foi apresentado e onde Simeão louvou a Deus. O Evangelho começa no Templo (Lc 1,8-22; 2,22-38.41-50) e nele também termina: “Estavam sempre no Templo, bendizendo a Deus” (Lc 24,53).
O autor termina enfatizando a resposta que os seus leitores devem dar, na medida em que eles aceitam que em Jesus chegou a nossa salvação, através da ação gratuita do Deus misericordioso. Esta resposta de bendizer a Deus não é somente com os lábios, mas com uma vida dedicada e missionária, no seguimento de Jesus de Nazaré. É vida comprometida com a construção de comunidades e sociedades alternativas, baseadas na partilha e na solidariedade. Esse é um dos grandes temas da segunda parte da obra de Lucas, que nós conhecemos como “Atos dos Apóstolos”.
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Texto com autoria de Tomaz Hughes.