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Greve Mundial de Mulheres: um chamado para colocar em prática o mundo no qual queremos viver

Mulheres de pelo menos trinta países mobilizam-se para uma greve internacional no próximo 8 de março. No Dia Internacional das Mulheres, elas não querem flores: manifestam-se por uma sociedade anticapitalista, antirracista e antissexista. As greves no final do ano passado, contra o feminicídio na Argentina, e pelos direitos reprodutivos, na Polônia, deram a base para esse ato que une países contra violências, retrocessos e exploração econômica da mulher. Vale lembrar que antes ainda, em 2014, as ucranianas fizeram uma greve de sexo como forma de protesto contra a anexação do país pela Rússia.

A articulação da greve geral ganhou fôlego em encontros realizados no Brasil como o Fórum Social das Resistências – contraponto ao Fórum Social Econômico, que acontece em Davos, na Suíça – e o “Diálogos Mulheres em Movimento – Direitos e Novos Rumos”, ambos em janeiro. Organizado pelo Fundo Elas, “Diálogos” proporcionou a ativistas latino-americanas debates sobre questões comuns, como os altos índices de feminicídio e a perda de direitos. Tanto o Brasil quanto a Argentina tem governos que propõem reformar a previdência, igualando o tempo de contribuição entre homens e mulheres, sem levar em conta as desigualdades de gênero. Na Argentina, as donas de casa perderem o direito à aposentadoria, conquistado recentemente também no Brasil.

Segundo Jolúzia Batista, do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), a mobilização, no entanto, começou antes, com o movimento de mulheres campesinas contra a reforma da previdência. “O 8 de março unificado vem dos movimentos nacionais, especialmente da Marcha das Margaridas, a partir da resistência à reforma da previdência. Nos posicionamos contra a cultura do estupro e o feminicídio. O desmonte dos direitos públicos e a crise do capital para nós tem todas as conexões possíveis com essas violências”, afirma a ativista.

O ato unificado reúne centrais sindicais, sindicatos, coletivos feministas, mandatos populares, movimentos de mulheres, universidades, estudantes e mulheres autoconvocadas.

“O Brasil foi o primeiro lugar onde foi lançada oficialmente a ideia da greve. Nossa aliança mais importante é o Brasil. Culturalmente nesse intercâmbio, a gente consegue abarcar muito mais e se articular, como fizemos nos últimos 15 anos. O alvo principal do nosso internacionalismo é a América Latina, mas o Brasil é particular. Aproveitamos o encontro para tecer redes sobre a greve e ações transnacionais. Foi uma sorte. Esse movimento transnacional tem como condição a Internet, mas achamos muito mais importante a comunicação dos corpos, os encontros físicos e reais”,  afirma Cecília Palmeiro, integrante do Ni Una Menos, que lançou o manifesto de convocação para a greve dois dias antes do seminário. No texto, a violência econômica destaca-se como mais uma face do feminicídio.

Conheça o manifesto na íntegra:

Convocação para a Greve Internacional de Mulheres Paro – 08 de março de 2017

Neste 08 de março, a terra treme. As mulheres do mundo nos unimos e organizamos uma medida de força e um grito comum: Greve Internacional de Mulheres. Nós paramos. Fazemos greve, nos organizamos e nos encontramos entre nós. Colocamos em prática o mundo no qual queremos viver.

#NósParamos

Paramos para denunciar:

Que o capital explora nossas economias informais, precárias e intermitentes.

Que os Estados nacionais e o mercado nos exploram quando nos endividam.

Que os Estados criminalizam nossos movimentos migratórios.

Que recebemos menos que os homens e que a diferença salarial chega, em média, a 27%.

Que não é reconhecido que as tarefas domésticas e de cuidado são trabalhos não  remunerados e adicionam três horas a nossas jornadas laborais.

Que estas violências econômicas aumentam nossa vulnerabilidade diante da violência machista, cujo extremo mais brutal são os feminicídios.

Paramos para reivindicar o direito ao aborto livre e para que não se obrigue nenhuma menina a enfrentar a maternidade.

Paramos para visibilizar o fato de que, enquanto tarefas de cuidado não sejam uma responsabilidade de toda a sociedade, nos vemos obrigadas a reproduzir a exploração classista e colonial entre mulheres. Para ir ao trabalho, dependemos de outras mulheres. Para migrar, dependemos de outras mulheres.

Paramos para valorizar o trabalho invisível que fazemos, que constrói redes de apoio e estratégias vitais em contextos difíceis e de crise.

#NãoEstamosTodas

Paramos porque estão ausentes as vítimas de feminicídio, vozes apagadas violentamente ao ritmo assustador de uma por dia só na Argentina.

Estão ausentes lésbicas e travestis assassinadas por crimes de ódio.

Estão ausentes as presas políticas, as perseguidas e as assassinadas em nosso território latino-americano para defender a terra e seus recursos.

Estão ausentes as mulheres presas devido a delitos menores que criminalizam as formas de sobrevivência, enquanto os crimes corporativos e o tráfico de drogas permanecem impunes porque beneficiam o capital.

Diante de lares que se tornam um verdadeiro inferno, nós nos organizamos para nos defendermos e cuidarmos umas das outras.

Diante do crime machista e da pedagogia da crueldade, diante da tentativa dos meios de comunicação de nos vitimizar e de nos aterrorizar, fazemos do luto individual um consolo coletivo e da raiva, uma luta compartilhada. Contra a crueldade, mais feminismo.

#NósNosOrganizamos

Nós usamos a estratégia da greve porque nossas demandas são urgentes. Fazemos da greve de mulheres uma medida ampla e atualizada, capaz de abrigar a empregadas e desempregados, a assalariadas e as que cobram subsídios, a autônomas e estudantes, porque todas somos trabalhadoras. Nós paramos.

Nós nos organizamos contra o confinamento doméstico, contra a maternidade compulsória e contra a competição entre as mulheres, práticas impulsionadas pelo mercado e pelo modelo de família patriarcal.

Nós nos organizamos em todas as parte: nas casas, nas ruas, no trabalho, nas escolas, nas feiras, nos bairros. A força do nosso movimento está nos laços que criamos entre nós.

Nós nos organizamos para mudar tudo isso.

#InternacionalFeminista

Nós tecemos um novo internacionalismo. A partir das situações concretas em que estamos, nós interpretamos a conjuntura.

Vemos que, diante do avanço neo-conservador na região e no mundo, o movimento das mulheres emerge como potência de alternativa.

Que a nova “caça às bruxas”, que agora persegue o que nomeia como “ideologia de gênero”, tenta justamente combater e neutralizar nossa força e quebrar nossa vontade.

Diante das múltiplas desapropriações, das expropriações e das guerras contemporâneas que têm a terra e os corpos das mulheres como territórios favoritos de conquista, nós nos incorporamos política e espiritualmente.

#ODesejoNosMove

Porque #VivasELivresNosQueremos, nos arriscamos em alianças incomuns.

Porque nos apropriamos do tempo e construímos juntas a disponibilidade. Fazemos da nossa reunião um alívio e uma conversa entre aliadas; das assembleias, manifestações; das manifestações, uma festa; e da festa, um futuro em comum.

Porque #EstamosJuntas, este 8 de março é o primeiro dia de nossa nova vida.

Porque #ODesejoNosMove, 2017 é o momento da nossa revolução.

#NiUnaMenos #VivasNosQueremos

Fonte: Portal Catarinas, catarinas.info, 13/02/2017

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