Na mesa de debates estiveram presentes, além do próprio Ariovaldo, o cientista social Anivaldo Padilha (pai de Alexandre Padilha, ex-ministro da Saúde), a professora de comunicação e jornalista Magali Cunha e a desembargadora aposentada e pesquisadora pela Unicamp, Magda Barros Biavaschi.
Ariovaldo foi o primeiro a falar e lembrou que um dos papéis da chamada Missão Integral, movimento defendido por sua ONG, é justamente sua atuação na sociedade. “E estamos vendo a história se descortinar diante de nós”. Segundo o religioso, é necessário que as pessoas tenham informações que lhes deem condições necessárias de saber exatamente o que está acontecendo e poder finalmente dizer se é isso ou não o que querem. “O que temos visto é estarrecedor. Não estamos diante da informação e sim da contrainformação”, crítica. Para ele “a vontade de Deus passa pelo voto” e “a decisão do povo é suporte de legalidade”, por essa razão, o voto não deve ser “questionado em tenebrosas transações, conversas de bastidores ou arranjos mal explicados”.
O pastor batista finalizou afirmando que a Missão na Íntegra defende a manutenção do Estado Democrático de Direito e uma convocação de uma assembleia nacional constituinte exclusiva para elaborar uma reforma política. “Estamos, como evangélicos, como cristãos, para dizer que queremos democracia. Não aceitamos o adultério da lei, sob hipótese alguma. Nem a tomada do poder senão pelo voto”.
Para Anivaldo Padilha, o momento atual se assemelha à repetição de um terrível filme. “Eu era filho de um pai getulista e vivi muito intensamente a discussão política, e a campanha feita contra Vargas, em 1954. Muito parecida com o que se vê hoje. Um apoio forte dos meios de comunicação da época, cujo o mote era a corrupção, que chamavam de ‘mar de lama’”. Padilha relembrou da famosa frase proferida por Carlos Lacerda, então líder da extrema direita. “Ele falava que Getúlio não poderia ser candidato. Se fosse, não poderia ser eleito. Se eleito, não poderia tomar posse. Se tomasse posse, não poderia governar”. Frase que, recordou o cientista político, foi repetida pelo senador José Serra (PSDB/SP) nas eleições presidenciais de 2014, ao se referir à presidenta Dilma Rousseff.
O ‘filme’, ainda segundo Anivaldo Padilha, voltou a se repetir em 1964. Sob o mote do combate a corrupção e ao comunismo, num contexto da Guerra Fria, os meios de comunicação, aliados à Igreja Católica e setores da igreja evangélica, que era muito pouco representativa na época, deram início a um golpe que jogou o Brasil no período de ditadura militar. “Ainda havia alguns jornais e revistas que faziam um contraponto, como a Manchete e o jornal Última Hora. Hoje vivemos uma situação muito semelhante, mas temos o monopólio ideológico da grande mídia. A impressão é que os jornais trocam WhatsApp à noite para combinarem a manchete do dia seguinte”.
Sempre do lado opressor
De acordo com a professora Magali Cunha, as grandes mídias do Brasil se identificam com os grupos dominantes, que visam a manutenção do status quo do país constituído com base na colonização exploratória. “Isso é tão inegável que mesmo os próprios grupos Globo e Folha reconhecem publicamente que aderiram ao golpe civil militar e apoiaram o estado de exceção, instaurado em 1964. Isso nas vésperas das lembranças dos 50 anos, em 2014. O grupo Globo admitiu publicamente também que se ‘equivocou’ ao editar o debate Lula Collor para favorecer Collor, cuja candidatura tinha apoio do grupo desde os primórdios. Se formos falar em equívocos e edições, agora a Rede Globo editou e divulgou uma gravação que ela sabia ser ilegal”, pontuou a jornalista.
Ela afirmou ainda que episódios como estes demostram que os processos que existem para informar terminam por promover uma ‘desinformação orientada’, termo cunhado por Umberto Eco para referir-se ao jornalismo e as mídias. “Isso porque a grande imprensa toma partido, sim, e por isso informa desinformando deliberadamente, negando ao público cobertura ampla dos fatos. Isso não acontece só no nosso país. Basta lermos estudos sobre a cobertura da mídia nos Estados Unidos, da Guerra do Golfo, especialmente sobre a Guerra do Iraque, em 2003, justificada amplamente pelas mídias como combate às armas químicas de Saddam Hussein. Armas jamais encontradas. Ou a criminalização dos palestinos, no Conflito Israel-Palestina”.
Magali criticou a colonização exploratória do território midiático no Brasil, feita “por onze famílias que controlam tudo o que é impresso, transmitido pelo ar e no espaço digital de maneira muito ampla”.
Coube a desembargadora Magda Barros explicar o porquê do que está em curso ser um golpe. “Ouvimos muitos dizerem que o impeachment não é golpe porque está previsto na Constituição. Só que há condicionantes para isso. Só é legitimo e cabível quando há crime praticado. É o que diz os artigos 85 e 86 da Constituição Federal. Se você ler vai ver que a presidente Dilma não está inserida em nenhum daqueles dispositivos. Aliás, ela é uma das poucas figuras de ponta da política nacional que não tem uma acusação de corrupção e que vai ser submetida por um processo de impeachment por quem está sob judice no Supremo, inclusive com sua cassação em andamento por corrupção”, comenta, citando indiretamente o presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha (PMDB/RJ).
Para finalizar a noite, o pastor Ariovaldo Ramos fez um emocionado desabafo. “Nos cansamos da manipulação e da desinformação. E nos revoltamos com todos aqueles que usam o nome de Jesus, o Cristo, que nos é sagrado, para tentar manipular, enquadrar e manietar o ser humano. Seguimos o Cristo que veio para que todos fossem livres e tivessem vida em abundância. E isso significa plena posse dos direitos e plena liberdade de expressão e da construção de uma sociedade onde todos possam ser tratados como imagem e semelhança de Deus”.
Por fim, Anivaldo Padilha pediu para, como no final das reuniões evangélicas, fazer um convite, um ‘apelo’. “Estamos diante de uma luta e temos condições de superar o golpe. Mas essa luta tem dois campos de batalha, duas trincheiras. Uma é a jurídica e os maiores pensadores do Direito estão do nosso lado. Mas essa batalha, sozinha, não é suficiente. Temos que ir para as ruas. É somente na rua, gritando a plenos pulmões ‘não vai ter golpe’, é que vamos conseguir vencer”.