Sérgio Machado disse que troca de favores teve início em 1946. Emílio Odebrecht apontou para a época do pai, em 1944
Dois delatores da Lava Jato referiram-se à década de 1940 como marco para o início do esquema de repasse ilegal de dinheiro de empreiteiras a políticos no Brasil.
O primeiro a fazer essa afirmação do Sérgio Machado, ex-deputado federal (1991-1994), ex-senador (1995-2003) e ex-presidente da Transpetro (2003-2014), uma subsidiária da Petrobras.
Em sua delação, Machado apontou o pagamento de propina a pelo menos 25 políticos de seis partidos diferentes. Ele cumpre pena de dois anos e três meses em prisão domiciliar, em Fortaleza. No depoimento, no mês de julho de 2016, ele disse o seguinte:
“O esquema ilícito de financiamento de campanha e de enriquecimento ilícito desvendado pela Lava Jato ocorre desde 1946”.
O Nexo apresentou a Marcos Fernandes Gonçalves da Silva, especialista em economia política do Centro de Política das Políticas Públicas da FGV, a seguinte pergunta:
Por que os anos 1940 são uma referência quando o assunto é financiamento de campanha por empreiteiras?
Marcos Fernandes: O período representativo é pós-Segunda Guerra Mundial (1945). A partir daí, o que você observa é o investimento em infraestrutura no Brasil.
Esse foi um investimento importante que impulsionou o surgimento daquelas que viriam a ser as grandes construtoras brasileiras.
Entre 1930 e 1980, o Brasil foi o país que mais cresceu no mundo. E de 1950 a 1980 é o período de maior crescimento dentro desse pico. Foi um crescimento elevadíssimo e concentrado.O Brasil não tinha nada e passou a ter. Não tinha rodovia que ligando as duas principais cidades do país. O que havia era ferrovia para ligar cidades cafeeiras.
O movimento se acentuou com o Plano de Metas, de Juscelino Kubitschek [presidente do Brasil de 1956 a 1961, que com o Plano, prometia fazer o país crescer “50 anos em 5”], principalmente com a construção de Brasília e com a loucura de Juscelino pelo carro.
Depois, tem o primeito Plano Nacional do Desenvolvimento, no governo do general Castelo Branco, de reformas microeconômicas, e o segundo Plano Nacional do Desenvolvimento, com Ernesto Geisel, com investimento pesado em infraestrututa. Aí as grandes construtoras se destacam e crescem. Há um boom das empreiteiras.
Mesmo sendo ditadura, havia corrupção, pois isso é algo que não depende só de financiamento de campanha. Tanto políticos da Arena quando políticos do MDB recebiam por fora.
Não tinha campanha presidencial, mas a campanha para governador foi liberada em 1982. Tinha prefeito, deputado, tinha político.Tudo se intensifica com a reabertura democrática (1985).
O esforço para diferenciar caixa 2 de corrupção
A Lava Jato já vive um momento em que muitos citados nas delações premiadas tentam emplacar a seguinte tese: é preciso diferenciar caixa dois de corrupção. Aquele que seria apenas um dinheiro não contabilizado repassado de empreiteiras para campanhas eleitorais, enquanto este teria ligação com favores feitos por políticos em contratos públicos ou enriquecimento pessoal.
A tese já foi defendida pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e pelo senador Aécio Neves, todos tucanos. Também foi defendida pelo petista José Eduardo Cardozo, ex-ministro de Dilma Rousseff. O ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes, também disse que é preciso “desmistificar” o caixa dois.
No julgamento do mensalão, a tese de que o dinheiro recebido em campanhas era “só caixa dois” foi o centro da defesa de petistas acusados. Eles acabaram condenados por corrupção.
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Fonte: Por João Paulo Charleaux, em Nexo Jornal, todos os direitos deste material são reservados ao NEXO JORNAL LTDA., conforme a Lei nº 9.610/98. A sua publicação, redistribuição, transmissão e reescrita sem autorização prévia é proibida.