A simulação de uma crucificação durante a Parada Gay de São Paulo, no domingo, 7 de junho, com uma transexual no papel de Cristo, causou polêmica com religiosos e, também, nas redes sociais.
O presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB-SP, Marcelo de Oliveira Fausto Figueiredo não vê crime no ato. "Foi uma manifestação forte, mas a meu ver estava dentro da liberdade de expressão."
A atriz Viviany Beleboni, que interpretou a crucificação, disse estar aterrorizada com as ameaças recebidas, mas que não se arrepende. "Dizem coisas absurdas: que devo morrer, ser crucificada de verdade, contrair câncer. Acordei cedo com uma ligação anônima, dizendo que eu iria morrer." Ela lamenta ter sido criticada por parte da comunidade LGBT. "Pensam que os gays vão ser mais reprimidos, que o preconceito vai aumentar."
Deputados religiosos fazem manifestação controversa no plenário da Câmara
Com cartazes com cenas de sexo explícito e imagens sagradas, parlamentares da bancada evangélica interromperam a votação da reforma política nesta quarta-feira, 10 de junho, na Câmara dos Deputados em protesto contra a simulação de uma crucificação com uma transexual no papel de Cristo, ocorrida durante a Parada Gay. No momento da manifestação, a sessão da Casa era presidida por Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que também é evangélico.
Os parlamentares gritavam palavras de ordem como "respeito" e "família". Eles rodearam os membros da Mesa da Câmara na e foram até as tribunas do plenário. De mãos dadas, rezaram o Pai-Nosso, que foi finalizado aos gritos de "viva Jesus Cristo".
A ação foi idealizada pelo deputado federal Sóstenes Cavalcante (PSD/RJ), pastor sob a orientação do presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia. Cavalcante providenciou o material de divulgação como cartazes e banners. “O plenário ficou em estado de choque”, afirmou o deputado, também presidente da Comissão ‘Estatuto da Família’, que também falou ao presentes.
Autor de um projeto de lei que torna crime hediondo a profanação de símbolos religiosos e a discriminação de religiões, chamada de "cristofobia", o deputado Rogério Rosso (PDT-DF) fez um discurso, no qual afirmou que os manifestantes pró-LGBT fazem "o que ninguém imaginava, que é unir todas as religiões". Outros deputados da bancada também discursaram contra a Parada Gay.
Os parlamentares religiosos criticaram, sobretudo, o fato de a atriz transexual Viviany Beleboni ter se prendido na cruz, durante a parada gay, para representar o sofrimento dos homossexuais no Brasil. “Os ativistas do movimento LGBT cometerem crime de profanação contra símbolo religioso, ferindo a todos os cristãos ao usarem uma pessoa pregada na cruz, utilizando símbolos do cristianismo de forma escandalosa, zombando e ridicularizando o sacrifício de Jesus”, diz nota de repúdio lida na tribuna pelo presidente da Frente Parlamentar Evangélica, João Campos (PSDB-GO).
A nota é assinada ainda pelo deputado Givaldo Carimbão (PROS-AL), presidente da Frente Parlamentar Mista Católica Apostólica Romana, e pelo deputado Alan Rick (PRB-AC), presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Vida e da Família. “Temos que tipificar como crime hediondo essas cenas, que atingem nossas famílias”, discursou o líder do PSD, Rogério Rosso (DF), que também participou do ato.
"Não foi uma ação contra a marcha gay, mas contra todas as manifestações e marchas que atacam símbolos religiosos e cristãos sem nenhum respeito", disse o deputado Pastor Marcos Feliciano (PSC-SP). O deputado disse que Cunha foi avisado com antecedência sobre o protesto.
"Essas manifestações de rua devem respeitar os cultos religiosos, não devem atacar símbolos religiosos. O Estado brasileiro laico tem que ser defendido, não se pode misturar política com religião", afirmou o deputado Celso Russomanno (PRB-SP), cujo partido é ligado à Igreja Universal do Reino de Deus.
Católico, ele não quis emitir opinião sobre o ato no plenário, apenas repetiu o gesto que outros evangélicos manifestaram à Folha: apontou o crucifixo que fica sobre a Mesa Diretora do plenário. Além desse símbolo religioso, todas as sessões da Câmara são iniciadas com a repetição da expressão "sob a proteção de Deus e em nome do povo brasileiro iniciamos nossos trabalhos".
"Sou a favor e defendo a realização da Parada Gay, mas eles não podem ultrapassar limites e ofender as religiões. Em relação à manifestação feita no plenário, eu acho que não há impedimentos porque os deputados têm o direito de se manifestar. E a reza é bem menos ofensiva do que os excessos cometidos na parada", disse o líder da bancada do PSDB, Carlos Sampaio (SP).
"O Estado é laico, mas as pessoas não. E o plenário sempre foi palco de manifestações", reforçou Leonardo Picciani (RJ), líder da bancada do PMDB.
O deputado Roberto Freire (PPS-SP) foi o único a se pronunciar no plenário contra o ato, que em nenhum momento foi repreendido pelo presidente da Câmara. "Eu respeitei a manifestação mas não pode ter nenhuma reza neste plenário. Tem que se respeitar o plenário", afirmou. Ele foi vaiado por deputados evangélicos. "Vivemos uma República laica. Não podemos transformar isso aqui numa igreja. Estou querendo trazer à lembrança de todos que não é para falar em nome dos 513 deputados. Respeitem a diversidade, respeitem a República laica”, afirmou Freire.
"Foi um ato completamente indevido. Transformar o plenário em um templo é inadmissível. Eu sou contra, e falo do meu lugar de cristão católico, que participa inclusive de celebrações na CNBB [Conferência Nacional dos Bispos do Brasil]", afirmou Chico Alencar (PSOL-RJ). "Me parece que é a primeira vez na história do Parlamento em que, em plena ordem do dia, se faz uma cerimônia religiosa."
"Foi inapropriado. Todos devem ter liberdade de manifestação, mas somos um Parlamento laico, representamos todas as crenças e a não crença", disse Jutahy Magalhães Júnior (PSDB-BA).
A posição de Eduardo Cunha
Evangélico e defensor de posições conservadoras na área dos costumes, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), disse na quinta-feira, 11 de junho, não ver empecilho à manifestação no plenário da Casa feita na véspera por deputados ligados a grupos religiosos.
"Não emiti opinião. Já vi várias manifestações de várias naturezas acontecerem no plenário, como bater panela ou levantar [cartazes de] carteira de trabalho. Não posso impedir a manifestação do parlamentar, não posso calar a boca de parlamentar, como não impedi de bater panela", disse o presidente da Câmara.
Ele se referia a protestos de oposicionistas contra o governo Dilma e de petistas, no caso das carteiras de trabalho, na votação do projeto de regulamentação das terceirizações no país.
Cunha disse ainda que, caso haja apoio suficiente dos líderes das bancadas partidárias, colocará para votação projeto de lei que torna crime hediondo a profanação de símbolos religiosos e a discriminação de religiões.
Representação no Ministério Público
A “crucificação” da homofobia em um dos trios elétricos da Parada Gay de São Paulo é alvo de uma representação no Ministério Público Federal. O deputado distrital Rodrigo Delmasso (PTN-DF), evangélico da Sara Nossa Terra, protocolou uma ação no MPF alegando crime de intolerância.
Fontes: Folha de S. Paulo 1; Folha de S. Paulo2; Folha de S. Paulo3; Radar On Line/Veja