“Os cobradores de impostos e as prostitutas vos precedem no reino dos céus”, disse Jesus às autoridades judaicas que o escutavam no templo.
Podemos imaginar o escândalo que estas palavras causaram aos ouvidos dos “justos” de Israel. Ser precedido nos céus por prostitutas ou cobradores de impostos, a maioria deles corruptos?! Não poderia se ouvir ofensa maior. Ser colocado para trás logo por quem? Por pessoas de má fama!?
Mas, por que Jesus reprova tanto estes sacerdotes e anciãos? Onde foi que eles erraram? Exatamente na incoerência entre o “falar” e o “fazer” deles. E Jesus mostra isso claramente com a parábola dos dois filhos. Nela, para ambos os filhos, o pai pede cordialmente que trabalhem na vinha. O primeiro se prontifica imediatamente: “Sim, Senhor!”, mas não move uma palha. O segundo está decidido: “não quero!”, mas pensa melhor e aparece lá para trabalhar.
No primeiro filho, as palavras são boas e gentis, mas falta a sua realização. No segundo, as palavras até parecem brutas, mas a ação é boa.
As palavras por si só não salvam, é preciso praticá-las.
O próprio Jesus já havia alertado:
“Não quem me diz: Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade do meu Pai que está nos céus” (Mt 7,21).
Já o exemplo do segundo filho é autêntico: ele cumpre a vontade do pai não com palavras, mas com ações.
Os chefes judaicos até estavam de acordo que a vontade do Pai só pudesse ser cumprida com ações. Porém, não estavam de acordo de jeito nenhum com a aplicação que Jesus fizera desta parábola. Assim, percebemos que tipo de distância abismal havia entre o dizer e o fazer na religiosidade farisaica e que é tão viva ainda hoje. A reprovação de Jesus é dirigida a quem dá mais valor às aparências do que à essência, mais às palavras que à prática, mais ao exterior que ao interior.
Se formos fazer um exame de consciência, vamos perceber imediatamente como somos fariseus, como o primeiro filho, prontos a dizer sim com os lábios, mas a não fazer quase nada quando o assunto é cumprir a vontade de Deus.
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A exortação de Jesus se torna ainda mais provocante, como já dissemos acima, porque contrapõe os publicanos e as prostitutas aos seus interlocutores. Para os chefes dos judeus, era muito ofensivo o fato de serem mencionados juntamente com pessoas que eles excluíam como impuras e pecadoras. Eles desprezavam e excluíam totalmente estas pessoas. Jesus, pelo contrário, vê nelas o segundo filho. Num primeiro momento, deram um não, mas depois se arrependeram e fizeram a vontade do Pai. Jesus não aprova o modo de vida delas, mas reconhece a acolhida que elas deram à mensagem de conversão de João Batista e a julga como o cumprimento da vontade de Deus.
Jesus afirma que só aquele que reconhece o seu pecado pode se arrepender. Aquele que se acha justo, autossuficiente, seguro de sua justiça, nunca vai reconhecer que erra. De fato, foi isto o que aconteceu pela pregação de João Batista: os fariseus o rejeitaram, enquanto os pecadores se arrependeram e se converteram. Os fariseus, de fato, não se agradaram em ouvi-lo, estavam fechados ao Evangelho. Ao passo que os pecadores, abertos à Boa Nova, se afastaram de si mesmos e se abandonaram à vontade de Deus.
Até que os fariseus faziam boas e muitas ações, pois observavam a lei de Moisés. Esqueciam, porém, a parte fundamental: reconhecer os sinais da presença de Deus, primeiramente em João Batista, depois em Jesus.
Descobrimos assim que a manifestação concreta da vontade de Deus não coincide nunca com aquilo que nós desejamos, e que já preestabelecemos como o nosso bem, mas tem sempre a ver com a fé, uma fé que envolve todo o nosso ser e se concretiza numa pequena, simples, mas dificílima ação. O importante não é, portanto, fazer alguma coisa, mas fazer aquilo que Deus quer que nós façamos pela obediência da fé.
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Fonte: Publicado no blog pessoal do autor, pecarlos.blogspot.com.br, 26/09/2008.