Por Odja Barros *
“Eu quero ser o primeiro a pôr fogo nas bruxas”, disse Lutero sobre as bruxas num contexto de crescente perseguição contra as heresias no século XVI. Lutero não foi o único. Outros reformadores colocaram lenha nesta fogueira que queimou, em toda Europa protestante, milhares de pessoas, a maioria mulheres.
Entre os séculos 16, 17 e 18, fervilhava as acusações de heresias e bruxaria. Mas, por que eram as mulheres as mais acusadas? Na sociedade profundamente religiosa da época, as mulheres ocupavam uma posição definida pela Igreja, de esposa e mãe. O papel único das mulheres era criar filhos e administrar a vida doméstica baseada na submissão cristã. E, de acordo a interpretação bíblica patriarcal, tanto católica quanto protestante, as mulheres, o gênero feminino, era o mais propenso a ser atraído pelo demônio. Essa foi a base para a acusação da heresia da bruxaria. A heresia da bruxaria era tudo que ameaçava o controle do poder e do ensino da Igreja. Quando as mulheres saíam do papel estabelecido pela norma cristã, acabavam se tornando alvos da acusação da heresia da bruxaria. Ter poucos filhos, não ter filhos, desejar romper com o padrão social compulsório de esposa e mãe, era sinal de que algo estava fora do lugar, o que resultava em acusação de bruxaria. Além disso, as mulheres que demonstravam ter algum tipo de poder e conhecimento, eram alvos certos de acusação.
A caças às bruxas aconteceram como mecanismo de autoproteção do poder religioso. Tudo que não era controlável era considerado heresia e merecia ser exterminado. Portanto, o 31 de outubro que marca, ao mesmo tempo o dia da reforma protestante e o Dia das Bruxas, nos faz lembrar que as fogueiras religiosas continuam acesas, ateando fogo contra as mulheres que desafiam esta sociedade terrivelmente religiosa. Portanto, falar das mulheres e a Reforma Protestante é também falar das bruxas e das fogueiras religiosas que continuam acesas!
Sobre a frase de Lutero :
As Mulheres e a Reforma: falemos das bruxas! [Nancy Cardoso]
Luther on Women: A sourcebook de Marry Wiesner e Susan Karant
Cambridge University Press (28 abril 2003)
*Pastora batista e teóloga feminista.