Leia a reflexão sobre Mateus 16,13–19, texto de Carlos Musskopf.
Boa leitura!
A visitação é uma prática comum em nossas comunidades. Em alguns lugares, as visitas são realizadas exclusivamente por pessoas que representam o ministério ordenado; em outros lugares, em combinação com grupos de visitação; e ainda em outros, só por visitadoras leigas. Importante é que as pessoas que fazem a visita se saibam enviadas por Jesus Cristo e que entrem na casa e na vida de alguém em nome do Senhor. Que sejam preparadas para ser agentes da justiça restaurativa nos lares.
Receber visita, receber recompensa, ficar com a recompensa – isso acontece com as pessoas que fazem o que é certo, que fazem o que Deus quer. Fica no ar o que acontece com as pessoas que não acolhem os visitadores, que não reagem à mensagem trazida na visita. Sim, vêm à mente todos os textos que falam de vingança, de justiça retributiva, ou seja, da justiça feita com punição e, de preferência, com dor.
A teologia da retribuição afirma que saúde, riquezas, filhos e vida longa eram sinais de que aquela pessoa estava realmente cumprindo a vontade de Deus. O contrário também é verdade. Pobreza, doenças, ausência de filhos são concebidas como consequências da não observância das leis de Deus e, desse modo, como um castigo de Deus.
A mensagem de Mateus 10.40-42 é “observar todas as coisas que acontecem debaixo do sol”. Nessa observação, pode-se perceber a fraqueza do princípio de causa e efeito. Na vida de igreja, verificamos que há justos que sofrem e injustos que recebem a sorte dos justos. Qual a consequência de ser uma pessoa seguidora de Jesus Cristo? Nos versículos precedentes de Mateus 10 (v. 13 e 14, p. ex.), o tom é ameaçador. Nos últimos três versículos, muda o foco. Não há mais ameaças, mas Jesus introduz a teologia afirmativa da restauração. Informa que a aceitação de sua pregação não está relacionada a qualquer tipo de restituição, e sim à restauração da dignidade das pessoas ouvintes. O v. 42 diz que a pessoa caridosa, solidária não perderá seu galardão. “Não perder” é uma coisa; “deixar de ganhar” é bem outra. O texto afirma o galardão de quem já o tem.
Para chegar a essa conclusão, precisamos entender o uso do termo grego misthos, que é traduzido nas diversas edições brasileiras da Bíblia por galardão, recompensa, salário, recebimento. As edições de Almeida e da NTLH até mesmo colocam o título: As recompensas. Isso dá a entender que quem pratica o bem ganha alguma recompensa. Mas, a partir de uma visão de restauração, o galardão rompe com a compreensão de recompensa, tanto no sentido de vantagem adquirida como no de ameaça. Não sendo de recompensa, a mensagem do texto aponta para mudanças nos critérios de valorização. Isso deve ser valorizado. A valorização do ser humano passa pela restauração das relações rompidas, seja pela falta de respeito a profetas e pessoas de fé, seja por não dar um simples copo de água. Essa ruptura não leva ao castigo, nem a sacar o galardão, mas motiva, incentiva a pessoa a repensar e restaurar.
Chama a atenção o título colocado na “Luther Bibel”:Aufnahme um Jesu willen (acolhimento por causa de Jesus). Nota-se que ele já vem com uma interpretação mais avançada do que os títulos das versões antes mencionadas.
Mais três pensamentos sobre o texto:
1 – O texto rompe com a sabedoria clássica de Israel, que preconiza uma relação de causa-e-efeito típica da tradição teológica judaica e introduz a graça, a equiparação graciosa, livre das recompensas;
2 – O julgamento a que estaremos sujeitos no fim dos tempos antecipa-se na fé e nas atitudes que tomamos na vida diária a partir da fé;
3 – O texto rompe com o comércio, a barganha com Deus, com a mentalidade de troca: dinheiro por bênção.
Visto assim, o termo galardão perde o sentido de recompensa como cura, milagre ou prosperidade, mas ganha o sentido de fé na salvação em Jesus Cristo.