Enquanto escrevo, olho para o relógio à minha frente, são 12h35 nesta, Sexta-feira Santa de 2020. Nesse instante meu olhar se volta para a Jerusalém do ano 33 da nossa era. Vejo Jesus de Nazaré pregado na cruz. A dor dilacera a sua alma. O nazareno vive, na plenitude da vida, a realidade violenta do Gólgota, o monte chamado Caveira. Ele tem absoluta consciência de que está fazendo a grande travessia. Sabe que seu corpo físico descerá ao útero da terra. A esperança é o alimento que mantém a lucidez da sua mente no meio do caos produzido pelos agentes da morte. Porém, a tortura que destrói o seu corpo não é capaz de lhe roubar a certeza de que descerá ao útero da Terra, como semente. No final a força da vida haverá de vencer a morte e suas estruturas de destruição.
Em tempos de COVID-19, o mundo humano faz também uma grande travessia. O mundo da natureza, no entanto, descansa. A Terra aproveita a cessação momentânea da exploração predatória que vinha destruindo a sua vitalidade para curar-se. A páscoa do Senhor é também a páscoa da Terra que se ressignifica na luta pela vida nesse tempo de pandemia. Assim, a esperança pascal floresce de novo, fundada no nascimento do novo ser humano originado no homem de Nazaré, Jesus Cristo, o nosso salvador.
A luta pela vida não cessa na cruz, pelo contrário, nela se inicia a grande reação da resistência humana contra todas as formas de morte e destruição da vida! Na páscoa de Jesus a potência do Amor se manifesta como suprema fonte de solidariedade com todos os seres viventes e, neste palco da existência, o mundo humano recebe o convite do autor da vida para uma profunda reconciliação com mundo da natureza onde, o Amor criador pulsa a todo instante como fonte de cura para todas as pandemias que ameaçam a vida.
Enfim, agora são 15h10 da tarde, estou finalizando meu escrito pascal. Outra vez volto meu olhar para o salvador, seu coração explode em dor e solidariedade amorosa pela vida. Sua última força física traduz-se num grito de liberdade que ecoou por todo o universo criado. Mateus descreve, com riqueza de detalhes, a grandeza e o resultado redentor do gesto da cruz:
Aí Jesus deu outro grito forte e morreu.
Então a cortina do Templo se rasgou em dois pedaços, de cima até embaixo. A terra tremeu, e as rochas se partiram. Os túmulos se abriram, e muitas pessoas do povo de Deus que haviam morrido foram ressuscitados e saíram dos túmulos. E, depois da ressurreição de Jesus, entraram em Jerusalém, a Cidade Santa, onde muitos viram essas pessoas.
O oficial do exército romano e os seus soldados, que estavam guardando Jesus, viram o terremoto e tudo o que aconteceu. Então ficaram com muito medo e disseram: —De fato, este homem era o Filho de Deus! (Mateus 27:50-54).
A páscoa de Jesus é também a nossa páscoa. Vamos, pois, celebrá-la juntos e juntas como fonte de inspiração permanente para defender da vida de todos os seres viventes e a saúde da nossa casa comum, até que Ele venha. Amém.
Wilkens Lenon, Pr. 10/04/2020.