via Portal Luteranos*
Prédica: Marcos 16:15-20
Autor: Carlos Musskopf
Âmbito: IECLB
Natureza do Domingo: Páscoa
Meditação:
A fé cristã não existiria, se Jesus não tivesse sido ressuscitado pelo Pai. Esta é uma afirmação aceita por todos os cristãos. Como, então, se poderia entender que o Evangelho de Marcos fizesse uma única alusão à ressurreição (v.6)? Esta pergunta perseguia desde cedo os leitores do Evangelho de Marcos, o qual, por isso, logo ganhou este adendo.
Falar da ressurreição não é falar de algo vazio, abstrato, teórico. Os relatos da ressurreição surgem a partir de uma relação concreta, direta com o ressuscitado. E as consequências são coragem, disposição, ânimo para pregar a Palavra.
Portanto, hoje só podemos falar da ressurreição, a partir da experiência que nós, pregadores, fazemos com ela. A Palavra de Deus tem nos renovado? Como consequência, temos nós (em conjunto com a comunidade) transformado o meio em que vivemos e atuamos? Temos encorajado os membros a participarem, como seres renovados por Deus, de movimentos e instituições que propõem uma nova sociedade, justa e fraterna, mesmo correndo o risco de serem chamados de comunistas ou subversivos?
Ora, a ressurreição fala de uma outra vida. Uma vida aqui, mas não como esta que está aí. Isto exige uma renovação dialética do mundo e do homem. Tomemos como ponto de partida o homem renovado que, transformando as estruturas em que vive (primeiro as pessoais, depois talvez as do Sindicato ou as da Associação de Bairro e, por fim, toda a superestrutura ideológica), cria novas estruturas para homens novos, que as vão novamente transformando, e assim sucessivamente. Um bom campo de ação para iniciar é também a estrutura da comuni-dade. Aqui se pode experimentar ressurreição quando, por exemplo, o presbitério descobre que de Igreja de atendimento, precisamos passar a ser Igreja missionária. Organizar uma comunidade missionária exige renovação de tudo: desde a localização da casa paroquial e da igreja, até a mentalidade do mais afastado dos membros (sem esquecer a do pastor, que é a mais dura de mudar!).
Mas Jesus não abandona os cabeças-duras. É interessante: os ricos de hoje são aqueles que souberam aproveitar a situação. Investiram na inflação e ganharam. Os cabeças-duras guardaram o dinheiro, ou resolveram não investir em nada, não correr risco… e perderam. Ficaram para trás. Uns mais, outros menos, outros bem para trás. Todos perderam. Penso que esta deve ser a origem dos colonos de Nova Ronda Alta.
Não é irônico que nós reverenciemos a inteligência e a esperteza dos ricos e menosprezemos os pobres, quando é justamente para estes medrosos e chorões que Jesus confia o futuro de sua própria missão? Isto quer dizer que Jesus deseja fazer de cada pobre, de cada assalariado, de todo o que vende sua força de trabalho em troca de dinheiro, um pregador, um mensageiro, um agente da ressurreição, da nova vida. E faz isso com os pobres, por uma razão muito simples, apontada por Paulo Freire: Só os pobres podem ser utópicos. Só os pobres podem pensar o futuro do mundo de maneira diferente do presente. Os ricos só esperam do futuro uma confirmação do que aí está.
Sei que para nós, pastores e pregadores, é difícil compreender isso, da mesma forma como foi difícil para os discípulos que ouviram falar da ressurreição de Jesus. Nós também temos ouvido falar da revelação de Deus nos pobres e oprimidos, nos livros da Teologia da Libertação e outros. Mas viver a realidade que eles vivem, dramática, cruel, diária, e aprender com eles, é outra coisa. Essa situação é muito parecida com a dos discípulos que não acreditaram nos relatos da ressurreição feitos por Maria Madalena e pelos outros dois. Só o contato direto, o envolvimento real e concreto com o Jesus ressurreto é que converteu e deu sentido ao que haviam ouvido falar. A partir desse contato, também passou o medo do futuro, a incerteza com relação ao que havia de vir, e os discípulos se transformam de passivos chorões em ativos anunciadores, proclamadores da Boa Nova que conheciam. Certamente foi um momento de ressurreição também para eles: uma nova vida se iniciou. Um vida sai da casca protetora das paredes e se lança num projeto imenso de levar ao mundo esta mesma possibilidade.
Oração final
Senhor, tu encontraste os teus discípulos com medo, chorando por tua ausência. Mas, com a tua presença, eles voltaram a ter disposição, força e coragem. Acompanha também a nós, ao sairmos desta igreja, a fim de que cada um de nós experimente um novo vigor, uma nova vontade de viver. Capacita-nos e envia-nos para levar, com esta disposição, a tua Palavra da vida a todos os cansados e desanimados; a todos os que não crêem no teu poder, a todos os que cruzam os braços, pensando que as coisas são assim e que nada vai mudar; a todos os que despertam para um envolvimento com tua Palavra no dia-a-dia; a todos os que se engajaram, em seu local de atuação ou de trabalho, pela melhora das condições de vida e pela transformação das estrutural injustas; aos jovens que são deformados pela propaganda enganosa, pelos vícios e pelas falsas oportunidades; aos jovens casais que estão demasiadamente preocupados com a vida social e muito pouco com Deus, que os uniu; aos velhos que, muitas vezes, são desprezados e outras vezes se desprezam a si mesmos, dizendo que não servem mais para nada…
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Fonte: Publicado pelo site Luteranos.