A reflexão bíblica é elaborada por Adroaldo Palaoro, sacerdote jesuíta, comentando o evangelho da Vigília de Natal (24/12/2018) que corresponde ao texto de Lc 2,1-14.
Boa meditação!
Um Menino é a resposta de Deus às nossas perguntas. “Encontrareis um recém-nascido envolvido em faixas e deitado numa manjedoura” (Lc 2,12).Natal. Estamos em um tempo que nos fala do essencial: um Deus que se faz carne, o divino que se faz humano; o eterno se estremece diante do que é terno; o infinito abraça amorosamente a fragilidade…
“Deus se humanizou”: tal expressão revela que a Misericórdia de Deus significa também ternura.
No rosto de uma criança se faz visível a Misericórdia que desce sempre mais abaixo, que nasce no ventre da terra e se faz terra fértil.
Segundo Jacob Boehme, místico medieval, Deus é uma Criança que brinca…
Cada nascimento é um sinal, um imenso milagre, uma bela promessa, um profundo chamado. Viver é milagre. Só ser já é milagre. E o maior milagre é a ternura que cuida, nutre, consola. Isso é “Deus”.
Dizia o pintor Pablo Picasso que tornar-se criança leva tempo, e poderíamos acrescentar que somente o encontro com o Deus Menino nos devolve a pureza e a inocência primordiais. Quando nos fazemos presentes junto à Criança eterna, então brota em nós o impulso para a renovação de vida, o despertar da inocência escondida, o encontro com novas possibilidades de ação que correm em direção ao futuro.
Natal é o tempo para acolher com ternura o que é germinal, o pequeno, o que nasce nos movimentos sociais e humanitários alternativos e nos grupos eclesiais que se empenham por um mundo novo e por uma Igreja mais sintonizada com o sonho de Deus. É o momento de sair para os excluídos, para aqueles que não podem chegar até nós.
Ao entrar na gruta para contemplar o Menino-Deus, conectamos, ao mesmo tempo, com o mais profundo do coração humano, carregado de compaixão e generosidade. A bondade humana é uma faísca que pode se atrofiar, mas jamais se apagar. São necessários alguns momentos densos para que esta chama seja ativada. A vivência do Natal é um deles.
Da “Gruta de Belém” à “gruta interior”: esta é a aventura que nos leva a crescer, amar e compartilhar com os outros o dom da vida; aprender a ver nas pessoas a grande reserva de bondade, altruísmo e generosidade que carregam dentro de si; nunca conformar-nos com a injustiça e a violência, semeando cordialidade e gentileza a todos (as); e, sobretudo, ser mestres da esperança. “…porque é de infância, meu filho, que o mundo precisa” (Thiago de Mello).
O Menino Deus, em Belém, nos oferece uma maneira nova de olhar a realidade e a fragilidade de tantas pessoas. A contemplação de Jesus em seu nascimento nos ensina a contemplar a fragilidade e a exclusão humana como uma forma de presença de Deus. Deus está entre nós como fragilidade, nos excluídos, nos pobres, nas carências de todo tipo, em cada uma de nossas limitações. Por isso mesmo, sair, descer ao encontro das carências humanas, é uma forma de peregrinação para o coração do Deus mais vivo e surpreendente. Com os mesmos passos com que nos aproximamos da fragilidade dos que sofrem, também nos aproximamos de Deus.
Se Deus correu o risco de encarnar-se, de nascer pobremente e crescer como salvação a partir da exclusão deste mundo, já não há excluídos para Ele, ninguém fica fora d’Ele. E o lugar principal para a festa é ali onde Ele aparece: nos aforas, onde não há lugar, onde tudo parece esgotar-se e é condenado a crescer em meio às ameaças e às intempéries das situações humanas.
O Nascimento de Jesus é um atrevimento, uma verdadeira ousadia, uma surpresa inimaginável…; na verdade, o Natal é a manifestação do impossível que se faz possível no coração de Deus.
Para meditar na oração
Que saibamos escutar a nossa criança interior que clama por ser amada, acolhida, curada de tanta mesquinhez, intolerância, e indiferença.
O Natal é como um poema; nele Deus se revela como uma Criança, pois nos mostra que a vida é sempre dom, novidade que destrava a humanidade para expandi-la por inteira. Que o Deus Menino que vai nascer nos mostre o caminho da verdadeira beleza da vida, e a graça de nunca perdermos a alegria de ser e viver.
Deus seja louvado!
Um abençoado Natal a todos e todas!
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Publicado originalmente no site de IHU Online.