A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados deve votar nesta segunda-feira, 30 de março, após três sessões e uma audiência pública sobre a constitucionalidade da proposta, que não foi concluída, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 171/93, que trata da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.
Em contraponto à votação e procurando motivar um outro olhar sobre o tema, organizações da sociedade civil mobilizadas nacionalmente contra a redução da maioridade penal, realizaram uma entrevista coletiva de imprensa na manhã desta segunda-feira, também na Câmara dos Deputados, em Brasília.
Os representantes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), do Conselho Nacional dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes (Conanda), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do Conselho Federal de Psicologia (CFP), do Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC/MPF), da Associação dos Juízes pela Democracia (AJD), do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve), da Rede Evangélica Nacional de Ação Social (Renas), da Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (Anced), da Rede Nacional do Adolescente em Conflito com a Lei (Renade) e da Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep) apresentam argumentos contrários à PEC 171/93, destacando questões sobre a inconstitucionalidade da medida e a ineficácia para conter a violência no país.
Para Jardel Santana, membro Pastoral da Juventude (PJ), movimento ligado à CNBB, e um dos organizadores da entrevista, "o objetivo é dar repercussão ao tema antes da votação; mostrar para os deputados que se há tantas organizações contrárias à redução da maioridade penal, então, é hora de ver o tema com outro olhar”.
Em entrevista ao site da PJ na Internet o bispo auxiliar de Brasília e secretário geral da CNBB, Leonardo Ulrich Steiner, avalia a votação na CCJC. "Lamento, profundamente, que alguns parlamentares da Câmara dos Deputados queiram sanar uma doença com o paciente na UTI [Unidade de Terapia Intensiva], aplicando uma dose que poderá levá-lo à morte, ao invés de criar as condições para curá-lo. Afinal o que se pretende? Estimular a violência? A retomada da tramitação da PEC nº 171/1993 e as várias proposições apensadas são iniciativas que objetivam criminalizar o adolescente e submetê-lo a penalidades no âmbito carcerário, maquiando a verdadeira causa do problema e desviando a atenção com respostas simplistas, inconsequentes e desastrosas para a sociedade. A delinquência de adolescentes é, antes de tudo, um grave aviso: o Estado, a sociedade e a família não têm cumprido, adequadamente, seu dever de educar, formar, integrar. Ao mesmo tempo, não tem assegurado, com prioridade, os direitos da criança e do adolescente, conforme estabelece o artigo 227 da Constituição Federal”.
Santana, da PJ, acredita que os deputados aprovem a PEC 171/93, mas, mesmo assim, os movimentos contrários a redução continuarão pautando e formando as bases para combater a Proposta. "Várias entidades de Brasília e em nível nacional estão se organizando para formarem as pessoas, articulando rodas de conversa sobre o tema e, dessa forma, contrariando a ideia de senso comum motivada pela grande mídia”, assinala.
Segundo o assistente social e diretor do Conselho Regional de Serviço Social de São Paulo (CRESS-SP), Luciano Alves, a PEC evidencia o caráter punitivo do Estado brasileiro. "Uma tentativa de alteração como essa representa a quebra do processo democraticamente construído, que inclui a Constituição Federal (1988) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990). Mais do que isso, marca a característica de punição e restrição de direitos do nosso governo. Isso está presente em esferas diferentes, como na repressão ao tráfico de drogas”, analisa.
Alves explica que os últimos 25 anos, desde a criação do ECA, foram caracterizados pela construção de mecanismos para a garantia de direitos, entendidos a partir de uma doutrina de proteção integral. Esse papel protetivo do Estado compreende crianças e adolescentes como pessoas em condição peculiar de desenvolvimento. Tal concepção, assinalada desde a Constituição de 1988, é estendida, inclusive, para adolescentes que tenham praticado atos infracionais. Assim, a própria internação do adolescente em questão deve ser encarada como um processo socioeducativo, não punitivo.
"Entretanto, temos um sistema prisional que ainda está distante do cumprimento de garantias, como escolarização, profissionalização e assistência integral aos adolescentes. No fim, temos um Estado que falha em assegurar esses direitos e garantir condições para que os adolescentes possam repensar seus atos de forma efetiva e reconstruir suas vidas”, comenta.
Texto: Thiago Silveira