Reflexão do Evangelho

Tocando a Exclusão: Reflexões sobre a Cura do Leproso em Marcos 1, 40-45

“Eu quero, fica purificado”. (Mc 1,41)

Neste 6º Domingo do Tempo Comum (ICAR), Jesus continua realizando a sua catequese. Anteriormente, depois de ser batizado (1,9) e vivenciado a experiência das tentações (1,12-13), Jesus forma seu grupo e inicia a sua atividade pública realizando curas e expulsando demônios, os espíritos impuros.

Finalizando o primeiro capítulo do Evangelho, Marcos traz presente uma cena de Jesus frente a frente com um leproso, não um doente comum, mas alguém que necessita de uma cura maior, precisa ser curado para voltar ao convívio dos seus familiares, amigos e de sua própria religião. Ser reintegrado na vida social e religiosa.

No tempo de Jesus, ser leproso significava uma carga de sofrimento muito grande. Além da doença a pessoa leprosa sofria a pior das exclusões, vivia uma marginalização completa, totalmente desprovido do convívio tanto social, familiar, como religiosa. Conforme a Lei, o/a leproso/a deveria viver excluído/a de todo o convívio social, a pior exclusão mencionada na Lei: “O homem atingido de lepra andará com as vestes rasgadas, os cabelos soltos e a barba coberta, gritando: ‘Impuro! Impuro!’. Durante todo o tempo em que estiver contaminado de lepra, será impuro. Habitará a sós e terá sua morada fora do acampamento” (Lv 13,45-46). Não bastava a doença, era preciso que todos soubessem dela.

Interessante notar que nessa cena, Marcos traz presente a fala de alguém do povo, alguém que sofre e parece ter esperança de conseguir a cura de sua enfermidade: “Chegou perto de Jesus, e de joelhos pediu: se queres tens o poder de curar-me”. Com muita coragem e audácia o leproso manifesta o seu descontentamento, não ficou longe, chegou perto; não gritou sua desgraça, como mandava a Lei, mas expressou a sua esperança de ser curado por Jesus: “se queres tens o poder de purificar-me ”. Ele sentiu em Jesus alguém diferente das demais pessoas de seu tempo, bem como das pessoas do Templo, incapazes de curar.

O texto diz que Jesus ficou “irado”. Em muitas traduções é encontrado a palavra “misericórdia” em vez de “Ira”. Em grego as duas palavras são semelhantes, portanto as duas traduções são possíveis. A reação de Jesus é de acolhimento total ao leproso. Certamente Jesus sente ira pelo sistema excludente e perverso de seu tempo, mas também sente a misericórdia pela causa do leproso, em latim “misere+cordis”, em grego éléos. A misericórdia é ter o coração sentindo a causa do/a  outro/a. “Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia” (Mt 5,7).

Diante da ação do leproso, Jesus não se importa com o que dizia a Lei do puro e do impuro, tocando o leproso, a pessoa também ficava contaminada. Jesus não aceita essas regras preconceituosas, por isso as transgride. Sabe-se que Jesus podia curar apenas com a palavra, como fez no milagre anterior, lá na Sinagoga (1, 21-28). Mas prefere tocar: estende a mão e toca naquele homem. “Eu quero, fica purificado”.

No final do texto, Jesus manda embora o homem curado, ameaçando-o para que não conte nada, mas vá ao Templo, mostrar-se aos sacerdotes, para que seja atestado a sua cura e assim ser reintegrado na sociedade, conforme exigia a Lei (Lv 14).

O final da cena diz que por conta da insistente divulgação do homem curado Jesus já não podia mais entrar publicamente numa cidade, ficava fora, em lugares desertos. Acontece então uma migração das cidades para os lugares desertos em que Jesus se encontra: “e vinham a Ele pessoas de todas as partes” (1,45).

Assim, como João Batista atraía muita gente para o deserto (1, 4-5), agora também faz Jesus: o povo acorre a ele, é um movimento de dentro pra fora, isto se repetirá mais adiante (6,30-44).

Isto nos lembra o papa Francisco, que desde o início de seu pontificado insiste numa Igreja em Saída. De dentro para fora, de dentro para as periferias, de dentro de nossas paredes para o encontro com os leprosos de hoje, com os invisíveis de nossa sociedade atual. Que a atitude de Jesus em acolher, estender a mão, curar e mostrar os caminhos de inclusão possa ajudar a nos aproximar cada vez mais dos excluídos e excluídas de nossos dias. Que possamos enxergar essas pessoas que carregam nos ombros a carga de tantos sofrimentos pelas dores e marginalização, tão presentes nos dias de hoje.

Autora: Fátima Alves
CEBI-CE

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