Reflexão do Evangelho

Páscoa de Jesus em Memória de Maria Madalena

Estamos na Grande celebração do Domingo da Páscoa. Esta é a celebração Mãe de todas as outras. A Páscoa é o acontecimento fundante da nossa fé cristã. Conhecemos bem a trajetória de Jesus de Nazaré pelos caminhos da Galileia das pessoas não judias. Depois de conviver um bom tempo como discípulo de João Batista no deserto, Jesus descobre que tem outro caminho a seguir. Em seu coração, vai se delineando outro projeto de anúncio do Reino. Percorre as aldeias da Galileia, reúne discípulos e discípulas e anuncia um Deus diferente daquele anunciado por João Batista. Relaciona-se com este novo Deus, revelado a Ele, chamando-o de Pai querido, com muita intimidade. Um Deus que é essencialmente Amor, compaixão, amigo e defensor dos pobres e desprezados daquele tempo. Sabe que este anúncio vai lhe custar a vida, prevendo as reações dos judeus, seus compatriotas e irmãos na fé, e, também, das autoridades do Império Romano, perseguidor de quem se distanciasse de suas orientações opressoras.

Já no fim de alguns anos, era visado por suas posições e ensinamentos em defesa de seu povo excluído e injustiçado na periferia do império e de Jerusalém, o centro religioso fé judaica no seu tempo. Tentou preparar seus discípulos e discípulas para esse enfrentamento e subiu com eles a Jerusalém, sabendo que o esperava um desfecho trágico. É aí que entram os relatos dos evangelistas que, muito tempo depois, tentam recolher tradições e escrever sobre o que teria passado nesse desfecho final: SUA EXECUÇÃO NA CRUZ. E, junto à cruz, enfrentando a dureza de tanto sofrimento e a tensão política e religiosa desta execução, detalha o escritor do Evangelho, estavam três mulheres: a Mãe, a tia e a companheira fiel. Estava crucificada a esperança de um novo Reino, de tantas promessas agora transformadas em medo, fuga e tristeza. Era o entardecer da sexta-feira que exigia pressa para terminar a obra começada na véspera e consumada agora. “Tudo está consumado”, mas faltava a última etapa dessa trajetória.

A personagem que amou Jesus mais que todos os outros, o acompanhou desde o início de sua caminhada, o cuidou e socorreu com seus bens, estava ali, claro, neste momento final. Envolta em trevas, a volta para casa parecia o fim de uma esperança que nunca fora confundida com mera ilusão. Ali estavam refugiadas, com medo, as outras pessoas discípulas.  Impulsionada pela dor da separação e pelo desejo de cuidar do corpo naquela madrugada de domingo, já liberta das prescrições do sábado, conforme relata o autor desconhecido do Evangelho de João, na escuridão da noite, um vulto podia ser vislumbrado, apressado, fazendo o caminho inverso daquele da véspera: era Maria Madalena, sua companheira fiel.

O Rosto de Maria de Madalena, escondido no lusco-fusco da madrugada mais triste de sua vida, começava a ser clareado por alguns raios de luz que começavam a iluminar o caminho que conduzia ao sepulcro. Ao avistar a entrada do sepulcro aberta, com a pedra rolada, decidiu voltar e chamar outros dois discípulos, dada a surpresa deste amanhecer; “levaram o corpo”… Vieram João e Pedro, constataram a ausência do corpo executado e envolto em panos. Pedro entra primeiro e João depois. O texto diz que João acreditou e Pedro somente constata. Voltam à situação de antes. Mas o que diz a sequência do texto é que Madalena ficou ali, sozinha, como alguém que intui o que poderá ter acontecido. E é aí que acontece o encontro que clareou o lusco-fusco da madrugada e faz da companheira fiel a primeira testemunha da ressurreição, a apóstola dos apóstolos, o princípio das comunidades que, daí para a frente, continuarão a ressuscitar Jesus pelos caminhos da história, que nos possibilita, também a nós, nas escuridões de nossas noites, sermos testemunhas da vitória da Vida sobre a morte, seguindo os passos da Madalena.

Autora: Julieta Amaral da Costa
Biblista, mestra em Teologia Bíblica pela Faculdade dos Jesuítas de Belo Horizonte, assessora do Centro de Estudos Bíblicos de Minas Gerais, do Fórum Político Inter-religioso de BH e de grupos interessados na Leitura Popular da Bíblia.

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