MATEUS 11, 2-11
Não há nada que aprisione mais do que a incerteza , sobretudo quando ela toca a própria vida e a esperança. Em Mateus 11,2-11, João Batista encontra-se duplamente preso: no corpo e na dúvida (v. 2). Desde esse lugar de encerramento, porém, experimenta a ação libertadora do Espírito, que sussurra e orienta. O texto diz que ele “ouviu” (v. 2b), e assim se inicia um caminho de busca.
Ao enviar seus discípulos, João pergunta: “És tu o que há de vir, ou devemos esperar outro?” (v. 3), revelando a tensão pastoral do Advento, que repousa precisamente na esperança messiânica , na certeza da espera do libertador. Nesse contexto do “já mas ainda não”, discernir os sinais de salvação em meio à angústia, mesmo quando ela aprisiona e até paralisa, torna-se uma rota possível de avanço.
Jesus responde unindo ouvir e ver como critérios teológicos irrevogáveis: “Ide e anunciai a João o que ouvis e vedes” (v. 4b). Ele indica, assim, a coerência entre a palavra profética e as obras concretas: cegos veem, coxos andam, surdos ouvem, mortos ressuscitam e pobres são evangelizados (v. 5). A centralidade dos pobres como sujeitos preferenciais ecoa as promessas isaianas (Is 35,5-6) e as bem-aventuranças (Mt 5,3-12), desafiando o contexto imperial e convocando a uma fé que transforma sofrimento em testemunho vivo.
O v. 6 sela esse compromisso ético-espiritual com o makários grego: “Feliz aquele que não se escandaliza de mim”. Ele delimita o território da bem-aventurança para quem acolhe o Reino sem vacilar , mesmo diante do escândalo que é a opção preferencial pelos vulneráveis.
Na segunda metade da perícope, Jesus valida publicamente João como profeta autêntico, denunciando ao mesmo tempo os falsos profetas e mensageiros da “verdade” aliados aos poderes bem vestidos dos palácios (vv. 7-8). Estética e ideologia se cruzam: falar de roupa aqui é falar de roupagem ideológica — outro modo de conectar palavra e atos, outro sinal de distinção. As “equipes” se reconhecem pelo uniforme, a fim de contas.
Os versículos seguintes, então, descrevem aquilo que reveste João — uma forma de investidura que não deixa espaço para dúvidas que o impeçam. Nos versos finais, revela-se a grandeza dialética do projeto do Reino (vv. 9-11): não uma hierarquia, mas um engaste harmônico de missões na reconstrução possível e desejada de um outro mundo. O v. 11 não estabelece medidas de grandeza de João em relação ao restante da comunidade de discípulas e discípulos; aponta, antes, para a centralidade da missão na economia do Reino.
Talvez muitos de nós cheguemos a este 2º Domingo do Advento também presos a dúvidas e desesperanças. Ao nosso redor, há muitas forças desmobilizadoras e muitos ruídos que impedem que pessoas comprometidas com um mundo mais justo sejam vistas e ouvidas — ruídos que distorcem, abafam e até impedem que a verdade passe.
Diante desse texto e do mundo em que vivemos, podemos nos perguntar não apenas sobre aquilo que nos aprisiona e nos impede de ver, caminhar e falar, mas sobre aquilo que nos condena a morrer em vida. Subverter isso é central, e a boa nova de hoje nos diz que, quando laboramos juntos, quando nos reunimos nesse mesmo desejo, é possível recolocar com força aquilo que os poderes tentam apagar ou desfazer.
Nesse fazer conjunto do Reino verdadeiro, onde as obras caminham de mãos dadas, apaixonadas pela Vida e pela Palavra , ergue-se o sussurro de um anúncio de esperança que atravessa os barrotes das dúvidas inerentes a uma espera tão importante e vital. E esse sussurro nos convoca a perseverar: como João na prisão, ativando a corrente de idas e vindas que, entre o dizer e o fazer, vai tecendo o pano que acolherá o corpo dessa vida nova tão esperada, já prestes a nascer.
Daylíns Rufín Pardo


