Leia a reflexão sobre Marcos 1,29-31, texto do Reverendo Luiz Carlos Ramos.
Boa leitura!
Este é o “Sermão da Sala, do Quarto e da Cozinha”.
Ora, as casas do povo simples, nos tempos de Jesus, eram muito rústicas. Algumas tinham um único cômodo. Os animais (ovelhas e cabras) se abrigavam na parte de baixo, sob o assoalho, e o calor que emanavam servia para manter a parte de cima aquecida. Não tinham janelas como as nossas, pois o vidro era raridade. Em geral construíam um terraço, onde tomavam as refeições e até dormiam, muitas vezes a céu aberto, cujo acesso se dava por meio de uma escada lateral. Ali também acontecia boa parte das reuniões de família e outras interações sociais. Eram, portanto, muito diferente das nossas casas. Mesmo assim, havia espaços determinados para dormir, para comer e para receber pessoas, ainda que num mesmo cômodo “multifuncional”.
Pois bem, onde estão a sala, o quarto e a cozinha no texto indicado? Vejamos:
A sala
Jesus saiu da sinagoga e foi para a casa de Simão. Podemos imaginar sem esforço que um pobre pescador, ao receber o ilustre Rabi em sua casa, por mais modesta que fosse, procuraria abrigá-lo no lugar mais aprazível e confortável. Talvez até fosse o pátio da casa, sob alguma árvore. Nas nossas casas urbanas, certamente o receberíamos em nossa sala de estar. Ali, devem ter conversado amenidades, como também nós fazemos, para quebrar o gelo e deixar as visitas à vontade. Então ficamos felizes de presumir que o nosso Rabi não está somente lá na sinagoga (“igreja”) pública, mas que também vem até nós e nos visita na particularidade do nosso lar.
O quarto
Mas, ao que parece, a conversa não ficou só nas amenidades. Tiveram a chance de dizer que havia uma pessoa enferma na casa. O que nos leva a deduzir que o Rabi não ficou falando, discursando, o tempo todo, mas que de fato dialogou com os moradores daquele lugar. A sogra de Simão estava acamada, com febre alta, e rogaram-lhe por ela. Jesus então “aproximou-se” (na versão de Lucas: “inclinou-se sobre ela”), a tomou pela mão, e a febre a deixou. Jesus não ficou só na “periferia” da casa, mas também a visitou na intimidade do leito da dor e da enfermidade. Aqui, merece destaque o fato de termos um Deus que se aproxima de nós em Jesus de Nazaré e nos trata com carinho, a ponto de tomar-nos pela mão e nos ajudar a reerguer-nos das nossas prostrações.
A cozinha
“A febre a deixou, passando ela a servi-los”. O verbo aqui empregado no texto grego é diakonéo, que significa “servir à mesa”. Não é impossível então imaginar que a sogra do pescador tenha ido preparar um peixinho para servir aos visitantes (nós provavelmente ofereceríamos ao menos um cafezinho). Em qualquer casa, a cozinha é o lugar da partilha e do serviço por excelência.
Outro importante detalhe é que o texto não diz que ela passou a servir somente a Jesus, mas a ação é abrangente e inclusiva: “passando ela a servi-los”. A experiência com Jesus nos leva à prática do serviço a todos.
Posteriormente, diakonéo se tornou um termo técnico para designar uma função bem específica na Igreja: a do diácono. Podemos concluir, portanto, que a sogra de Pedro foi a primeira diaconisa mencionada nos Evangelhos.
Como é bom sabermos que temos um Deus que não está restrito aos templos e às sinagogas, mas que nos visita na humildade dos nossos lares. Vem para participar das nossas alegrias (a Sala), mas também para nos ajudar nas nossas dores (o Quarto), e vem para nos dar forças para servir a Ele e a todos com alegria (a Cozinha).