
O Brasil é o terceiro país do mundo com o maior número de pessoas encarceradas. O Brasil optou pela política de encarceramento em massa com quase 800 mil pessoas presas, levando grupos mais vulneráveis para os fundos das cadeias e presídios. Essa opção tem feito com que jovens, pobres, negros, sejam o grande destaque no sistema carcerário. Somos um país que se identifica como cristão, no entanto, observamos muito forte pelos meios de comunicação e pelo senso comum que as pessoas condenam os vulneráveis a permanecer nos cárceres. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, quase metade da massa carcerária é formada por presos provisórios que não têm formação escolar e profissão definida. Sendo assim, os corpos negros são enquadrados no modelo europeu do poder do homem branco, e são deixados à mercê da legislação, que também exclui os que não têm condições financeiras para acessar.
Esse artigo nos remete a uma reflexão a partir do modelo de Jesus de Nazaré, que durante a sua vida na terra nos apresenta outra ótica sobre os mais vulneráveis e excluídos da sociedade. Temos um Jesus misericordioso e que nos ensina a buscar um novo modelo de relacionamento na sociedade com relação aos pequenos.
“Hoje mesmo estarás comigo no paraíso.” – Lucas 23:43
Na crucificação, Jesus não apenas suportou o abandono de muitos, mas também estendeu a mão da misericórdia a um dos condenados ao seu lado. Essa passagem nos recorda que Deus não despreza um coração arrependido, como é reforçado no Salmo 50(51). É uma lembrança poderosa de que o caminho para a redenção está sempre aberto para aqueles que buscam sinceramente uma nova vida. Jesus nos ensina que todos são chamados a ser santo, basta ter um coração arrependido. No entanto, a nossa sociedade condena duas vezes as pessoas que cometem delitos. A condenação jurídica pelas leis dos homens e a condenação moral, que ultrapassa todos os limites.
“Não vim chamar os justos, mas os pecadores.” – Marcos 2:17
Jesus nos ensina que a misericórdia é o coração de sua mensagem. Ele acolhe os pecadores e oferece perdão, convidando-os a uma transformação interior. Este convite à redenção está em perfeita sintonia com a mensagem da Campanha da Fraternidade 2024, que nos desafia a construir um mundo onde as oportunidades de redenção e reintegração sejam acessíveis a todos, independentemente de seus erros passados.
“Ó Senhor, não desprezeis um coração arrependido.” – Salmo 51:17
A misericórdia divina nos espera, mesmo quando falhamos. Essa graça incondicional é um exemplo para a sociedade, especialmente quando confrontada com sistemas de justiça, que só têm a perspectiva de castigo e não busca o retorno à sociedade que, apesar de muitas vezes tardia, acontece. Infelizmente, nossos irmãos que cumprem pena em nossos presídios e cadeias não têm qualquer chance de acolhimento no seio da sociedade, conforme preconizam as leis dos homens.
“Diga-lhes: Juro pela minha vida… que não tenho prazer na morte dos ímpios.” – Ezequiel 33:11
Deus deseja a vida e a conversão, não a morte e a condenação. Essa mensagem nos chama a questionar sistemas que priorizam a punição como vingança e nos desafiam a buscar formas mais compassivas e eficazes de lidar com a justiça criminal na linha da justiça restaurativa, que busca a restauração da pessoa após assumir seus erros e arrepender.
“Vós sois todos irmãos e irmãs.” – Mateus 23:8
A Campanha da Fraternidade nos lembra que somos todos parte de uma família humana, chamados a nos relacionarmos uns com os outros com respeito e compaixão. Isso inclui aqueles que cometeram erros e estão pagando por eles, pois todos merecem ser tratados com dignidade e ter a oportunidade de se redimir.
Jesus, durante a sua peregrinação aqui na terra, nos apresenta um modo de vida para ser seguido em várias passagens dos evangelhos, um deles é quando lhe apresentam uma mulher pega em flagrante adultério, sendo apresentada a Ele com o intuito de colocá-lo em situação de constrangimento, porém, ele devolve a questão a todos: Quem de vós não tiver nenhum pecado que atire a primeira pedra (João 8,7).
Jesus nos lembra da nossa própria fragilidade e quanto somos propensos ao pecado, convidando-nos a praticar a compaixão e a misericórdia em vez de julgamento. Este é o chamado para uma sociedade que busca a justiça restaurativa e a reconciliação, em vez de simplesmente castigar e excluir.
A solidariedade é o antídoto para a indiferença. Devemos agir prontamente para apoiar aqueles que estão em situações de vulnerabilidade, trabalhando para criar uma sociedade onde a justiça e a compaixão sejam os pilares sobre os quais ela se sustenta.
Neste tempo de reflexão e ação, comprometemo-nos a trabalhar incansavelmente pela construção de um mundo onde a liberdade e a justiça reinem supremas, onde as prisões sejam substituídas por um mundo sem cárceres e onde todos possam viver em plenitude, como filhos e filhas do mesmo Criador.
Em um mundo onde a justiça muitas vezes falha em abraçar a misericórdia e a redenção, é essencial lembrar as lições de Jesus sobre compaixão e perdão. Que possamos nos esforçar para construir uma sociedade mais compassiva e justa, onde todos tenham a chance de se redimir e contribuir positivamente para o bem-estar de todos. Que a mensagem de amor e misericórdia de Jesus nos inspire a buscar um mundo em que as prisões sejam substituídas por oportunidades de cura e transformação, onde a fraternidade e a dignidade humana sejam os pilares de nossas ações. Buscamos a construção do reino de Deus aqui e agora.
Que assim seja.
Autora:Cristina Coelho (CEBI – PR)
Bibliografia: Conselho Nacional de Justiça (CNJ)