Dia das Mães: Agar continua caminhando entre nós

Neste Dia das Mães, o CEBI compartilha um texto profundo e comovente, escrito por uma mulher que acompanha outras mulheres em situação de violência, inspirado na história bíblica de Agar (Gênesis 16 e 21).

É madrugada.
A Mãe se levanta no escuro e, silenciosa, pega a Criança. Enrola seu corpinho bem firme no cobertor. O Marido está ressonando alto — efeito da cachaça.

Enquanto ela se movimenta pelo quartinho, sente dores por todo o corpo. Morde os lábios para não gemer. A surra que levou do Marido foi muito violenta, pior do que todas as outras. Ela ficou apavorada. Tem que fugir o mais rápido possível.

Move-se devagar. Numa cama ao lado, dorme a Sogra — também alcoolizada, e que, na hora da surra, ficou calada, fingindo que nada acontecia. Não defendeu a Mãe.

Agora, ela vai saindo aos poucos, com todo cuidado para não esbarrar em algum móvel. Abre a porta lentamente e ganha a rua. A Criança bem apertadinha no peito.

Pega um ônibus, depois outro. O dinheiro já acabou. A viagem termina. O dia está pela metade. Está bem longe de casa agora. Ao descer do ônibus, olha ao redor e vê um cantinho na rodoviária. Há cadeiras vazias, mas ela se senta no chão, junto à parede. Não quer ser vista.

Amamenta a Criança que chora. Está longe do Marido, finalmente. Mas… e agora? Cadê um abrigo? Cadê comida? E se o leite secar? O que será da Criança?

Ela olha para o alto, mais adiante, e vê um viaduto. E logo lhe vem a solução: vai subir até o ponto mais alto, amarrar a Criança bem firme no peito e pular.
Sim, é isso que deve ser feito.

A noite chega. A Mãe tenta dormir, mas é impossível. O corpo dói. A fome maltrata. Ela permanece vigilante. E se alguém lhe roubar a Criança?

Assim que amanhece, faz um esforço enorme para se levantar do chão. Não consegue. Está fraca demais.

Uma mão pressiona levemente seu ombro:
— “Quer café com leite?”

Ela levanta os olhos e vê um Anjo. Agarra o copo que ele lhe oferece e imediatamente começa a beber.
— “Quer pão com manteiga?”

Claro que a Mãe quer. E quer também a banana que lhe é oferecida. Chega outro Anjo e diz:
— “Estou vendo que você está com a Criança. É tão novinha… é linda.”

Os dois Anjos sorriem. Um deles se ajoelha ao lado da Mãe e pronuncia as palavras mais lindas que ela já ouviu:
— “Conhecemos um lugar onde você pode se abrigar com a Criança por uns tempos. Quer vir com a gente?”

A Mãe leva alguns segundos para entender aquelas palavras milagrosas. Quando compreende, aperta ainda mais a Criança nos braços, olha para o viaduto… e pensa:
— “Não será preciso pular.”

Marisa Leme Thozzi
Mãe de 4 mulheres e avó de 3 mulheres e 5 homens.Assessora do CebiSP há 35 anos.

Carrinho de compras
Rolar para cima