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Campanhas e Democracia: Lições Aprendidas e a Arte de Aprender

1 – As Lideranças e o seu Tempo, mas é o Tempo quem Lidera

As lideranças são essenciais, indispensáveis e imprescindíveis em todas as formas de organização da vida humana. Como a nossa língua portuguesa é exageradamente rica de sinônimos, você que está lendo este textinho pode acrescentar os sinônimos que lhe vierem â cabeça. Acontece que, a meu ver, o mundo anda cambaleante, meio sem rumo e não raro meio sem sentido. Quem diz qual é o sentido da vida e nela o sentido de uma Família, de uma Religião, de um Partido Político, de um time, seja de futebol ou qualquer outro esporte, é a sua liderança. Uma aeronave voa com segurança pelos espaços aéreos do mundo, porque uma liderança estar garantindo-lhe o sentido. Acontece que as lideranças envelhecem e inevitavelmente vão perdendo o tato no comando de seu grupo, tornando-se manipulável e frequentemente manipuladas. É nesse momento que os mercenários, aventureiros, falsos líderes, entram em cena como uma serpente faz quando chega a um desprotegido ninho de passarinhos com seus filhotes indefesos. Aqui a gente pode entender a grandeza do Papa Emérito Bento XVI ao renunciar ao governo da Igreja e, antes que as serpentes gananciosas e hipócritas, destruidoras de sonhos, de projetos e de esperanças, desestabilizassem a Igreja, ele mesmo liderou a sua própria sucessão, dando-nos aquele que sem dúvida, já está entre as maiores lideranças humanista de toda a história da Igreja: o Papa Francisco.

2 – A  Campanha termina para que a Campanha comesse

A vida é assim: vai e vem; vira e volta. Vai para onde quer, quando a gente não a leva para o rumo certo; vem sem querer, quando a gente não a quer acolher. Acontece que a vida é o nosso Castelo, é o Palácio onde moram os nossos sonhos e as  nossas utopias. É neste Palácio que exercemos o Mandato mais importante: viver. As Campanhas que fazemos durante as nossas vidas são todas elas tentativas de nos mantermos neste Mandato. O único eleitor que vota é a gente. Os outros, aqueles, aquelas que a gente delegar, podem sugerir, dá opinião. A Urna é a nossa história. Ninguém pode violar a nossa Urna. Respeitar a história  – a Urna das lideranças mais velhas – inclusive sendo ouvintes assíduos de suas histórias tantas vezes repetidas, como se as dissessem pela primeira vez, é uma forma de respeito. Mas a forma mais sublime de se respeitar essas lideranças é não sendo picareta, tirando proveito de suas fragilidades e debilidades de forma embusteira, aproveitadora e acanalhada. As eleições costumam ser momentos propícios para a picaretagem familiar e partidária, perdendo apenas para as disputas de heranças, quando é o caso, evidentemente.

Os picaretas – de extrema direita e de extrema esquerda – deram status de cidadania à picaretisse, maquiando não apenas seus rostos para esconder as assimetrias faciais, mas sobretudo, maquiando seu mau-caratismo. A nossa Democracia, ainda tão jovem, embora quando a vemos com os olhos do Doutor Ulisses Guimarães – Constituição Cidadã – uma senhora cidadã, ela seja adulta e conte com quarenta anos, vem acumulando doenças aparentemente indolores. Indolores, mas que, a médio prazo, podem levá-la à UTI  e até à morte. Uma destas doenças é a falta de coragem democrática de gestores públicos; de legisladores corporativistas e de um judiciário absolutista e viciado em privilégios inaceitáveis e que age por conveniências; uma deformação de nossa democracia e que bem pode exemplificar essa picaretisse, são as candidaturas – sobretudo de extrema esquerda – fazem arruaças, guerreiam por recursos do Fundo Partidário, querem inclusive receber mais que as outras candidaturas, movidas por um narcisismo que lhe é peculiar, e quando enchem seus bolsos de dinheiro, vão fazer campanha “camufladas” para outro partido e para outro candidato. O que importa e se eleger. Não importando como. Compromisso zero com a democracia e com equanimidade, fruto de coletivofobia. Espelho, espelho meu, existe alguém mais merecedor de dinheiro e de atenção do que eu? Caetano Veloso e sua genialidade dizem assim na música “Sampa”: “É que Narciso acha feio o que não é espelho”. O Narcisismo de extrema esquerda acha feio o que não a seu favor ou não pensa como ele.

3 – A Campanha Eleitoral de 2024 nos Deixou Lições, mas é Preciso Aprender a Aprender

Viva a Democracia! Porque somente com ela, com a Democracia, é que se pode aprender a agir democraticamente. A Campanha Eleitoral deste ano de 2024 exige de nós algumas condições pressupostas: consciência histórica, para entender a travessia porque passa a nossa Democracia; maturidade política, para não ficar imerso (afogado) nas questões periféricas e alienado com relação á realidade maior; sabedoria para desfulanizar o processo de fascismização da política e não apenas eleitoral; reconhecer o lugar da diretividade e resgatar a importância das lideranças progressistas, sobretudo para a Democracia; ousadia para dizer o óbvio: o Picareta, aproveitador, pessoa moralmente condenável, gente que age de forma ardilosa e que divide e causa discórdia em todos os lugares que chega, existe em todos os lugares; a política pede grandeza, mas a eleição pede apenas groselha, uma versão xaropeada de um produto.

A Campanha Eleitoral exige a capacidade de se desfazer das características que são exigidas por uma ética humana da solidariedade e do bem comum. Quem resiste a isso, não subsiste eleitoralmente. É preciso que se permita desfigurar-se, tornar-se disforme e multiforme ao mesmo tempo. Não é a personalidade que elege, mas a despersonalização. Enquanto a Groselha combate os radicais livres a eleição, atualmente, os favorece. A decadência da política em nosso tempo, favorece as candidaturas Groselhas e picaretas, marginalizando a política e causando uma inversão de valores que trata os candidatos originários e de bom caráter, como sendo démodé. Já a candidatura Groselha, recebe certa licença poetica e é tratatada como “esperta”, carismática. Vale aqui o que diz Caetano na mesma música já citada: “Da força da grana que ergue e destrói coisas belas”. A parte mais cruel e maléfica da realidade eleitoral e dos pressupostos apresentados, a meu ver, é que as exigências de desfiguração da candidatura, é estendida aos seus militantes. É a única característica coletiva ou comunitária do processo eleitoral. A coleticisação do egoísmo. Do individualismo exarcebado. Já diz um adágio popular que, aonde é cada um por si, ali Deus não estar. Para que haja mudança na sociedade é preciso que haja antes mudança de mentalidade. Quem não se permite mudar não pode ser agente de mudança. A questão é: aceitamos o preço da mudança para que haja uma adaptação às exigências do poder? Por isso, a questão é aprender a aprender. É, como disse Dom Helder Camara: “Tenho que mudar todos os dia para permancer o mesmo”. Essa mudança proposta pelo Bispo Vermelho, é edificante, é construtora. É diferente da mudança deformadora que exige o processo eleitoral irracional que reifica o individualismo.

4 – Tentativa de diálogo neste pós-primeiro turno para quem enfrentará o segundo, mas também para os outros

Entre as lições mais urgente e que precisam ser apreendidas por nós encontram-se: saber que doar cestas básicas não dar votos. O que dar voto é a lista de pessoas que recebem a cesta básica nas mãos de candidaturas “espertas” e despudoradas; o que dar voto não são os conselhos, mas os conchavos; ajudar os pobres não dar voto, mas explorar a pobreza sim; ontologicamente, ainda, isso vale para eleitos e não eleitos, embora os eleitos não costumem “perder” tempo com estas preocupações, corromper-se é muito pior que corromper. A partir do entendimento que, para corromper alguém, antes é preciso deixar-se corromper-se. Especialmente em Curitiba, de onde escrevo este texto e onde vivo e faço política, os/as que desaquilifaram e boicotaram a candidatura Dulcci + Goura com argumentos cheios de ressentimentos e quase delinquentes, são, em geral, os/as mesmos//as que vilipendiaram a candidatura e a pessoa do professor Paulo Opuszka na última eleição. Hipócritas? Não! É muito mais grave! São candidaturas corpovartivistas, projetos solos, mentes extremistas. Narcisistas, para ser Caetanamente sarcástico e delicado.

Neste segundo turno, em Curitiba, teremos, a meu ver, três opções: a)  buscar um diálogo com a candidatura e com o grupo de Pimentel, e tentar contribuir com propostas ecológicas, humanista e sociais; b) deixar que se lasque e torcer para que a extrema direita e sua insana fúria anti-humana; anti-ciência; anti-democracia, e anti-cristã, anti-vida, portanto, faça em Curitiba o que fez no Brasil em quatro anos; c) omitir-se completamente e ir dar milhos aos pombos nas praças cheias de pessoas em situação de Rua de nossa cidade. Quero, ainda, levar os meus parabéns para Ângelo Vanhoni, presidendte do PT de Curitiba e para Gleisi Hofmann, presidente nacional do PT, por suas atitudes de serenidade diretiva e de liderança, sobretudo, neste processo eleitoral. Vocês me representam. Mas lhes faço, humildemente, uma observação: vocês lideram com excelência os processos políticos, mas não têm liderança sobre o partido, ou, pelo menos, eu não enxergo essa lidernaça. É normal que as candidaturas recebam o Fundo Partidário, algumas até façam o maior furdúncio querendo mais e mais, e mais que os outros, e, façam campanha contra o partido e para outra candidatura? Temos uma jurisprudência ou isso é uma aberração a ser punida, como pensa este humilde poeta? Ainda podemos dizer que temos instãncias partidárias, como Conselho (Comitê) de ética, por exemplo? Luz para vocês na condução de nosso partido.

5 – Considerações Finais

O conceito de liderança progressista e revolucionária, sobretudo, na perspectiva de Paulo Freire em sua Pedagogia do Oprimido, encontra-se fora de moda e parece démodé. Aqui, assim como o conceito de liderança, surge o conceito de morrer. Morrer para renascer. Na esteira de Paulo Freire, “Enquanto, no processo opressor, as elites vivem da “morte em vida” dos oprimidos e só na relação vertical entre elas e eles se autenticam, no processo revolucionário só há um caminho para a autenticidade da lidernça que emerge: “morrer” para reviver através dos oprimidos e com eles”. (FREIRE, 2006, p. 151). O desvirtuamento da democracia na prática da gestão pública, seja no executivo ou legislativo, é consequência direta das Campanhas Eleitorais. A metodologia e a ética utilizadas durante a Camapanha vão para o mandato. Pelas práticas e pelas atitudes nas Campanhas, já se projeta não apenas quem possivelmente se elegerá, mas o que fará quando eleito. Quanto menor for o escrúpulo na Campanha, seja com os eleitores ou com os adversários, maior será a possibilidade de se eleger. Quem não corrompe a própria consciência no período eleitoral não está preparado para ser eleito. E não adianta falar de exceçõs. E elas existem, mas são raríssimas! É por isso que cada vez menos os mandatos têm função educaiva. É por isso que, invés de organizar o partido e de se fazer formação política de base, faz-se cooptação de lideranças e até persegue-se quem ousa fazer trabalho de base. Isso se dá a partir de uma patologia conhecida como “mandatismo”, que faz do mandato um escritório político a serviço do personalismo. Quem entope os esgotos e as portas das Igrejas e dos Colégios com panfletos na madrugada que antecede a eleição, entope também a boca da decência quando assume o cargo. Envenna a democracia. E, em coerência com a sua prática de Campanha, esconde tudo com um discurso contrário. Por isso é que, quem faz e quem finge não ver, eleitos e eleitores, se merecem e se completam. É assim que vemos a democracia agonizar. Eu não sei quantas pessoas chegarão até aqui e terão tempo, vontade e paciência para ler este texto até o fim. Para conversar com um velho ultrapassado, mas que ainda acredita no amor e na vida, e na política, e na democracia.

Curitiba, 05 de outubro de 2024
João Santiago
Teólogo – Poeta e Militante.
Coordenador do CEBI-PR.
Doutorando em Teologia pela PUC-PR

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