via IHU*
Nesse dia, quando chegou a tarde, Jesus disse a seus discípulos: «Vamos para o outro lado do mar». Então os discípulos deixaram a multidão e o levaram na barca, onde Jesus já se encontrava. E outras barcas estavam com ele.
Começou a soprar um vento muito forte, e as ondas se lançavam dentro da barca, de modo que a barca já estava se enchendo de água. Jesus estava na parte de trás da barca, dormindo com a cabeça num travesseiro. Os discípulos o acordaram e disseram:
“Mestre, não te importa que nós morramos?”. Então Jesus se levantou e ameaçou o vento e disse ao mar: – “Cale-se! Acalme-se!”
O vento parou e tudo ficou calmo. Depois Jesus perguntou aos discípulos:
“Por que vocês são tão medrosos? Vocês ainda não têm fé?”
Os discípulos ficaram muito cheios de medo e diziam uns aos outros: “Quem é esse homem, a quem até o vento e o mar obedecem?”.
Leitura do Evangelho de Marcos capítulo 4,35-41 (Correspondente ao 12º Domingo Comum, ciclo B do Ano Litúrgico). O comentário é de Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.
Arriscar a travessia pelas águas desconhecidas
No final deste dia Jesus aparece cansado. No capítulo 3 Jesus havia entrado na sinagoga onde estava o homem com uma mão seca e também “havia aí algumas pessoas espiando, para verem se Jesus ia curá-lo em dia de sábado, e assim poderem acusá-lo”. Jesus cura o homem e esse gesto traz como consequência a vontade de matá-lo e, para isso, os fariseus e alguns do partido de Herodes começam a planejar a sua morte. Jesus logo se retira para a beira do rio e muitas pessoas vão ao seu encontro para ser curadas por ele, para receber benção ou escutá-lo. Depois Jesus chama os que deseja escolher e constitui o grupo dos Doze.
Quando ele vai para sua casa são tantas as pessoas que o procuram que não tem tempo nem para comer. Neste momento seus parentes o procuram porque diziam que tinha ficado louco.
No início da proclamação das parábolas, Jesus é procurado por sua mãe e seus irmãos. Sua resposta diante desta busca é constituir uma nova família! “Quem faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”.
No capítulo seguinte (Mc 4) Jesus continua com o anúncio das parábolas e finaliza este capítulo com o texto que acabamos de ouvir. “Quando chegou a tarde, Jesus disse a seus discípulos: ‘Vamos para o outro lado do mar”. Então os discípulos deixaram a multidão e o levaram na barca, onde Jesus já se encontrava”.
Chega a tarde e podemos pensar que para Jesus foi um dia de muito cansaço, continuamente rodeado de pessoas que o procuravam para ser curadas por ele, para escutá-lo, apesar de possivelmente não conseguirem entender muito o seu ensinamento através das parábolas.
Jesus pede para atravessar o mar e eles deixam a multidão e o levam na barca. Podemos imaginar que Jesus está fatigado e merece descansar num espaço com pessoas de confiança, aqueles que ele tinha escolhido. Lembremos que o mar simboliza o perigo, as ameaças à vida, tudo aquilo que destrói a firmeza e segurança da terra, fundamentalmente quando se procura atravessá-lo numa pequena barca.
Há sempre a possibilidade de uma tormenta, do vento que ameace a estabilidade da barca, mas Jesus não se preocupa com isto. Ele descansa sem medo, confiando no seu Pai.
Quando começa “a soprar um vento muito forte, e as ondas se lançavam dentro da barca, de modo que a barca já estava se enchendo de água”, os discípulos não podem acreditar que Jesus continue dormindo. Como é possível que ele possa continuar dormindo sem preocupar-se? Ele não tem sensibilidade, ou não percebe a força desse vento e das águas que já estão enchendo a barca? Seu pedido foi claro: ir para o outro lado do mar, ou seja, atravessar o mar da Galileia para ir à terra dos pagãos e continuar sua missão.
Mas quando começa a tormenta e o vento forte, podemos imaginar o assombro dos discípulos diante desta situação. Jesus continua dormindo!!! Eles o acordam e em suas palavras há um protesto pela sua impassibilidade: “Mestre, não te importa que morramos?”.
A resposta de Jesus não são palavras, é uma atitude que manifesta seu domínio sobre o mar e tudo aquilo que simbolize perigo e, neste caso, até risco de morte. Ele reage com palavras claras: ameaça o vento e diz ao mar: “Cale-se! Acalme-se!” O vento para, mas não acaba aqui: Jesus se dirige aos discípulos com palavras duras pelo seu medo e sua falta de fé.
E podemos perguntar-nos: “Quais são os mares que as diferentes comunidades estão atravessando hoje para continuar assim a missão que Jesus lhes confia”? Quais são os ventos que ameaçam continuamente nossa barca para que fique sempre na mesma beira do mar, sem preocupar-se com os outros e outras e ir ao desconhecido, ou como disse o Papa, ir às fronteiras? Quais são as vozes que escutamos e nos atraem para ficar como uma Igreja aparentemente tranquila, sem movimento, sem estender seu olhar para além do conhecido e do seguro?
Falta-nos fé e confiança naquele que nos chama e nos convida a viver na fé e na confiança nele, sem deixar que o medo nos aprisione.
Os discípulos se perguntam: “Quem é este?”. Surpreendidos pelo seu poder sobre o vento e sobre o mar, diante da atitude de Jesus, eles têm muito medo! Se a comunidade segue os passos do seu Mestre, sofrerá perseguições, experimentará tormentas, mas o poder de Deus é maior que tudo isso.
Neste dia somos convidados a escutar suas palavras e passar assim da desconfiança ou do medo para uma fé confiada, a ponto de poder dormir mesmo na tormenta da travessia missionária.
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Publicado pelo Instituto Humanitas, 22/06/2018.