Reflexão do evangelho da semana (João 18.33-37), por Odair Airton Braun.
Boa leitura!
Contexto do domingo
Chegamos ao último domingo do ano eclesiástico, também denominado de Cristo Rei. A característica maior desse domingo é recordar e celebrar a vitória de Jesus Cristo sobre as forças do mal. Essa é a marca maior do reinado de Jesus Cristo. Dessa forma, o ano eclesiástico chega ao fim anunciando-nos e visando renovar a certeza de que Jesus Cristo é verdadeiramente Rei. Contudo, seu reinado, em hipótese nenhuma, deve ser comparado aos “reinados” deste mundo.
Anunciar Jesus Cristo como Rei não deve levar-nos ao triunfalismo. Pelo contrário, deve levar-nos a crer no resgate da verdade e da dignidade, na renovação da vida e da sociedade a partir da boa-nova trazida e anunciada por Jesus Cristo.
O reinado de Jesus Cristo – João 18.33-37
O reino de Deus é o aspecto central de todo o ensino de Jesus. Todos os demais aspectos de seu ministério público tinham como finalidade acentuar o reinado de Deus, ou seja, a soberania de Deus sobre o universo. Nesse sentido, convém cuidar para que o reino de Deus não seja confundido com um espaço físico em meio a este mundo governado por Deus. Contudo, também não deve ser tido como um reinado abstraído deste mundo.
O reino que Deus deseja para nós não está localizado além da morte. O reino, pelo qual sempre clamamos e pedimos na oração do Pai-Nosso, está dentro da história. Realiza-se no dia-a-dia da vida terrena e torna-se pleno na vida eterna. Dessa forma, aquilo que Jesus denomina de reino pode ser descrito como: bondade, verdade, justiça, sentido de vida, cura, amor e paz. A sua atuação pública e os sinais que realiza são claros indicativos disso.
Diante dessa descrição do reino de Deus, torna-se evidente que Jesus não veio estabelecer um reino político-militar, econômico e impositivo. O seu reinado não segue a linha de raciocínio de Pilatos, que o interroga. Jesus é a luz divina que ilumina toda a humanidade (Jo 1.9). Seu reino, do qual temos “aperitivos” nos relatos das curas, deseja que tenhamos a capacidade de caminhar em unidade, de resistir diante das tentações e, acima de tudo, que tenhamos perseverança e confiança, afinal, ninguém sabe qual a hora exata da chegada do reino de Deus (Mt 24.44).
Essa passagem de João, relatada de modo dramático, apresenta-nos Jesus perante Pilatos, o poder da época. Pilatos foi o procurador romano na Judeia dos anos 26 a 36, sendo descrito como déspota e cruel. Para Jesus, uma “raposa” (Lc 13,32). Jesus é entregue na mão desse governante e diante dele assume a sua condição de Rei. O relato do interrogatório de Pilatos com Jesus expõe o confronto das forças da morte e da vida.
Em nenhum momento, vemos Pilatos preocupar-se com delitos cometidos por Jesus. O pano de fundo do interesse de Pilatos é manter o poder romano intocado e inquestionável. Por esse motivo, estamos diante de uma passagem em que graça e julgamento, verdades e interesses se entrelaçam.
O interrogatório dirigido por Pilatos revela que o reinado de Jesus tem como base a verdade. Portanto, uma base bastante distinta daquela do governo de Pilatos, regido pela ambição, autoritarismo e violência, típicos dos reinos deste mundo. E sabemos que quem ouve e segue a verdade passa a ser incluído no reino de Deus.
Pilatos investiga, no transcorrer do interrogatório, a realeza de Jesus. Em contrapartida, ouve: “Falas assim por ti mesmo ou os outros te disseram isso de mim” (v. 34). Dessa forma, Jesus permanece senhor dos acontecimentos. E logo adiante acrescenta: “Tu dizes que sou Rei. Eu para isso nasci e vim para o mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz” (v. 37). Creio que há, da parte de Jesus, uma tentativa de fazer Pilatos ouvir a verdade e compreender seu engano. Contudo, Pilatos retira-se, e Jesus é entregue à morte.
Aparentemente, a verdade anunciada por Jesus é vencida pela verdade de Pilatos. Contudo, a ressurreição de Jesus, nosso Rei, é sinal do triunfo da verdade, vinda de Deus, já anunciada pelo profeta Daniel e Apocalipse.
Reflexão para pregação
Neste domingo, Cristo Rei, anuncia-se que Jesus veio para acabar com o reinado das forças bestiais ou diabólicas. O reinado de Jesus é de vida e verdade. E participar de seu reinado equivale a não se submeter a nenhum “Pilatos” dos nossos dias. Esse anúncio está intimamente conectado ao próximo domingo, primeiro domingo de Advento, quando mais uma vez toda a igreja anunciará a vinda definitiva do Senhor Jesus.
Eu sou um rei, mas o meu reinado não é deste mundo! O que significa isso? Será que Jesus está pregando que não tem nada a ver com este mundo? Não. Não é nada disso que está em jogo nessa passagem. Jesus não está afirmando que não tem nada a ver com este mundo. Caso se pense nesse sentido, devemos recordar que no Evangelho de João, ao mencionar mundo, não se pensa antecipadamente num lugar, mas prioritariamente no sentido de estado e situação. Exemplo disso é Jo 17.15 no contexto da oração sacerdotal, em que Jesus diz: “Não peço que os tires do mundo e sim que os guardes do mal”. Não se trata do fato de o reino de Deus não ter nada a ver com este mundo, mas do fato de ser um reinado regido pela verdade.
Na verdade, os soldados, com o intuito de fazer chacota de Jesus, colocaram uma coroa de espinhos sobre sua cabeça e o coroaram como Rei. Contudo, não o rei de colunas sociais, de festas e badalações. Jesus não foi, não é e não será um rei que se porta como os reis de nossos dias. O reinado de Jesus segue na franqueza e humildade, representadas pelos dois que foram crucificados a seu lado. De fato, tal tipo de reinado não é deste mundo.
O reinado de Deus não é deste mundo, mas começa a acontecer neste mundo, completando-se plenamente com a volta de Cristo. Seguir esse reinado não é algo mecânico e automático. Também não é um caminho repleto de lazer e de facilidades. Há pedras e percalços. Mas Jesus não nos deixa sozinhos. Ele caminha conosco e trata-nos com misericórdia. Precisamos confiar nele e permitir que ele nos oriente e conduza no novo ano que já se coloca no horizonte.
Desenvolvimento da pregação
Proponho que a pregação seja em forma de diálogo e questionamento. Pode-se dar tempo para a comunidade responder, ou então, na continuidade o pregador responde as perguntas.
- O que significa aceitar Jesus como Rei e Senhor de nossas vidas?
- Quais as características do reino do qual Jesus é Rei?
- Quais são as sementes desse reino semeadas neste último ano?
- Onde e como podemos semear no novo ano a fim de demonstrar que Jesus é Rei?
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Publicado originalmente em Proclamar Libertação – Volume: XXXI.
Ilustração: Felipe Lima