Partilhas

Tríduo Pascal, Ponto Alto do Ano Litúrgico

O tríduo pascal celebra as consequências do grande confronto de Jesus com os dominadores deste mundo em Jerusalém, tal como ele já havia anunciado em três oportunidades: O filho do homem será entregue aos sumos sacerdotes e escribas (autoridades religiosas). Eles o condenarão à morte e o entregarão aos gentios (autoridades romanas) para ser escarnecido, açoitado e crucificado. Mas, no terceiro dia, ressuscitará (Mt 20,17-19; 16,21; 17,22-23).

Os evangelistas reelaboram a celebração da Páscoa da Antiga Aliança. Na Páscoa da Nova Aliança, Jesus substitui o cordeiro pascal, e a celebração se prolonga em três dias. É o tríduo pascal.

  1. Lava-pés, ceia, agonia, prisão e condenação: o primeiro dia

Nesta reflexão, seguiremos a lógica das comunidades originárias, para quem o dia começava a partir do pôr-do-sol. Desse modo, o primeiro dia do tríduo pascal começa na quinta à noite com o lava-pés.

O lava-pés é narrado somente em Jo 13,1-17. Talvez, as comunidades joaninas quisessem ir além da centralidade da partilha do pão durante a ceia. Ao incluir o lava-pés no primeiro dia do tríduo, essas comunidades resgatam outro ponto central do projeto do Reino. E esse aspecto tem a ver com o exercício do poder de quem é senhor e mestre (13,13). É uma nova forma de exercer a autoridade. Não é um poder de cima para baixo, mas uma autoridade que é exercida como serviço democrático. É a dimensão divina da política. Ainda hoje, Jesus nos desafia: Se compreenderdes isso e o praticardes, felizes sereis (13,17).

Em Mateus, encontramos o relato da ceia em 26,17-35. Ali, Jesus faz memória da Aliança do Êxodo. Na ceia de Jesus, não há cordeiro. Na cruz, ele mesmo será o cordeiro oferecido em sacrifício. Aqui, é Jesus quem se torna pão da vida na partilha. Definitivamente, Jesus mostra que a partilha do pão é o que há de mais divino. Assim, Jesus nos ensina como sermos pão para quem precisa de nós. Dai-lhes vós mesmos de comer (Mt 14,16). Entregando-se no pão e no vinho, antecipa a entrega de sua vida na cruz. O seu sangue traz libertação plena, tal como, no êxodo, o sangue do cordeiro pascal libertara da morte hebreus e hebreias (Ex 12,21-23). E, tal como Moisés validara com sangue a Antiga Aliança no Sinai (Ex 24,7-8), agora Jesus confirma a Nova Aliança com seu próprio sangue, com a sua vida (Mt 26,28).

Ainda à noite, lembramos a agonia no Getsêmani (Mt 26,36-46). É ali que, assim como gritaram os escravos no Egito, Jesus também clama: Meu Pai, se é possível, que passe de mim esse cálice. Porém, não seja como eu quero, mas como tu queres (Mt 26,39.42). A resposta do Pai com a vitória sobre a morte ficará para o terceiro dia do tríduo pascal.

Depois, vem a prisão, em que o messias é traído por um companheiro (Mt 26,47-56; v. 50).

Segue o processo religioso diante do Sinédrio (Mt 26,57-68). Autoridades da religião judaica buscam um motivo religioso através de fake news (vv. 59-61). Na verdade, querem calar o profeta da Galileia, pois sua prática desmorona o sistema do Templo (26,61; 27,51). Ele é o messias que vem cumprir a missão libertadora da religião de Israel desde o êxodo, missão essa abandonada pelas autoridades do Templo (vv. 63-68).

Na manhã e tarde de sexta-feira, temos o processo político, a tortura, a crucificação e o sepultamento (Mt 27,1-2.11-61). O processo político é pelas mãos de Pilatos, governador romano na Palestina. O motivo da condenação é político: Jesus é o rei dos judeus (vv. 11.37; Lc 23,2-3; Jo 19,12-15; At 17,6-7). Como ainda hoje, também lá, autoridades religiosas enganaram o povo para condenar o libertador desse mesmo povo (Mt 27,20). E Jesus é condenado e executado por mãos de romanos. E isso, apesar de Jesus ser inocentando por Judas (v. 4), pela mulher de Pilatos (v. 19) e pelo próprio Pilatos (v. 24). Ainda hoje, elites judiciárias seguem lavando as mãos para condenar inocentes, especialmente quando a mídia os apresenta como heróis combatentes da corrupção.

Se antes Judas entregara Jesus aos sumos sacerdotes (26,16), se as autoridades religiosas o entregaram a Pilatos (27,2), e se este governador romano o entregara à tortura e à morte (27,26), agora é Jesus quem entrega seu espírito (27,50). Por amor, entrega a sua vida na cruz. Ali, ele é o cordeiro pascal oferecido em sacrifício (Ex 12,1-28). A sua fidelidade até a cruz também substitui os sacrifícios de expiação pelos pecados oferecidos no altar do Templo (Lv 16). E, mais uma vez, escutamos o clamor de Jesus: Deus meu, Deus meu! Por que me abandonaste? (Mt 27,46; Sl 22,2). É um grito que é, ao mesmo tempo, desespero e confiança de quem tem certeza que será escutado. Na humanidade de Jesus, homem torturado e humilhado, porém, revela-se a sua divindade. Jesus de Nazaré sente-se abandonado, como qualquer pessoa se sentiria. Naquele tempo como ainda hoje, somente quem é justo percebe a presença de Deus nas pessoas mais vulneráveis (Mt 25,37-40). E mais uma vez, a resposta do Pai ao grito de Jesus ficará para o terceiro dia do tríduo pascal.

Na cruz, vemos Deus presente na fragilidade humana, num indefeso condenado à morte, da mesma forma como José e Maria, magos, pastores e Simeão o contemplaram na vulnerável criança recém nascida (Mt 2,1-12; Lc 2,1-20.25-32). O mundo não consegue compreender que Deus se revele na fraqueza. Daí porque o messias crucificado ser escândalo para judeus e loucura para gentios. Nessa impotência do messias diante da violência dos poderosos, Deus revelou o seu poder e a sua sabedoria, pois Deus escolheu o que é loucura para o mundo, a fim de confundir os sábios. Deus escolheu o que é fraqueza para o mundo, a fim de confundir os fortes. E Deus escolheu o que para o mundo é vil e desprezado, o que não é, a fim de reduzir a nada o que é (1Cor 1,23-28).

  1. Sentados em frente à sepultura: o segundo dia

Como as mulheres sentadas em frente ao sepulcro (Mt 27,61), o sábado é dia de sentar em frente ao túmulo de Jesus e contemplar o profeta de Nazaré assassinado com violência na cruz pelos opressores deste mundo. Sua causa foi justa, foi a justiça do Reino de Deus. E nesse Reino não podem faltar para ninguém as necessidades básicas, isto é, pão, água e roupa (Mt 6,31.33). A fé ou fidelidade do messias a esse projeto até o fim, até a cruz, revela a plenitude do amor de Deus (Jo 13,1; 15,13; Rm 5,8; Gl 2,20; Ef 2,4). E por ser uma morte em favor de uma causa justa no amor, é morte com sentido libertador.

A fidelidade dele é oferta gratuita da salvação a todas as nações (Rm 3,21-24; Ef 2,1-10). Importa que acolhamos essa graça, abramos as portas para que Jesus entre, faça comunhão conosco e dinamize nossas vidas (Ap 3,20; Gl 2,20). E como pessoas plenamente humanizadas, revelaremos a divindade em nossas atitudes de compaixão diante de quem sofre intolerâncias, violências e mortes.

  1. A luz da ressurreição e a água do batismo: terceiro dia

Nas origens cristãs, o primeiro dia da semana (do pôr do sol de sábado até o final da tarde do dia seguinte) foi chamado “domingo” por ser o dia da ressurreição de Jesus. Domingo significa “dia do Senhor” (do latim dies dominicus). Foi assim chamado para fazer frente à adoração do sol naquele dia (cf. sunday e sonntag, em inglês e alemão). O domingo só passou a ser feriado a partir do concílio de Laodiceia (363-364), quando já era imperador Teodósio I, que declarou o Cristianismo religião oficial de Roma em 370. Por isso, as comunidades das origens celebravam a ressurreição na noite depois do sábado.

Agora, tal como ouvira o clamor de escravos no Egito (Ex 3,7.9), Deus escuta os gritos de Jesus (Mt 26,39; 27,46). No clamor de Jesus, Deus escuta os clamores de todas as pessoas que sofrem. E a resposta ao clamor é a ressurreição é a vitória sobre a morte (Mt 28,1-10). Esse Jesus ressuscitado, porém, traz as marcas da tortura (Jo 20,20.25.27). E elas denunciam a violência dos poderosos. A ressurreição do servo fiel é atitude radical de Deus contra todo ódio, toda intolerância e toda violência que gera morte, ontem, hoje e sempre.

Mulheres foram fiéis discípulas desde a Galileia e testemunharam a morte de Jesus (Mt 27,55-56). Testemunharam também o seu sepultamento (Mt 27,61). E mais. Testemunharam a sua ressureição no túmulo vazio (Mt 28,1-6). Então, o mensageiro as enviou como apóstolas para anunciar a Boa Nova da ressurreição aos discípulos (Mt 28,7-8). E elas são as primeiras a quem o Ressuscitado aparece, confirmando a missão que o anjo já lhes havia dado (Mt 28,9-10).

Na celebração do terceiro dia do tríduo pascal, há um destaque especial para a luz e para a água do batismo. Ressuscitando na noite escura, Jesus é luz das nações (Lc 2,32; Jo 1,9; 8,12; 9,5; 12,35-36; 2Cor 4,6; 1Jo 1,5.8-11). Assim, faz memória do Deus da luz desde o êxodo (Ex 13,21; Is 9,1; 42,6; 49,6; 60,19; Sl 27,1; 36,10). Sua luz brilha em meio às trevas da opressão religiosa, econômica e política. Ilumina também as trevas presentes em nossas mentes e corações.

Na Páscoa de Jesus, renovamos o nosso batismo. Assumir o batismo é ressuscitar com o messias (Rm 6,1-11; Cl 2,12). É aderir ao projeto do Reino, é passagem libertadora pelas águas (Ex 14,15-31; Mc 1,9-11). É água do Espírito a nós entregue por Jesus na cruz (Jo 3,5; 7,38-39; 19,30.34). É revestir-se de Cristo e ser formado nele (Gl 3,27; 4,19), pois em Cristo somos novas criaturas. Passaram-se as coisas antigas; eis que se faz uma realidade nova (2Cor 5,17; Gl 6,15; Ef 2,10).


Ildo Bohn Gass, biblista e autor de diversos livros pelo CEBI.

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