
Marcelo Barros[1]
A celebração de tempos como Quaresma e Páscoa trazem para as nossas comunidades o desafio de repetir os mesmos textos litúrgicos e retomar orações e cânticos conhecidos, não como quem segue um tempo circular que se repete a cada ano e sim como quem se abastece do alimento que já carrega na caminhada para agora viver melhor a novidade do hoje de Deus. Assim, nesta Quaresma-Páscoa de 2025, o apelo para a nossa conversão social nos vem através da Campanha da Fraternidade 2025 sobre Ecologia Integral e, de forma que se integre no contexto do Jubileu da Esperança que o Papa Francisco propõe às Igrejas e a toda a humanidade.
De fato, na Quaresma deste ano, o evangelho de Lucas nos recorda que Jesus nos falou de Deus como o Pai que acolhe o filho pródigo que tinha se desgarrado (Lc 15, 11- 32). Agora, descobrimos que o modo de voltar à intimidade do Pai é nos reconciliarmos com a Mãe-Terra da qual nos afastamos e que exploramos de forma cruel.
Infelizmente, o Jubileu romano ainda parece se concentrar em viagens a Roma e em ritos medievais, como passar por portas santas das basílicas romanas e ganhar indulgências.
O problema disso é que, atualmente, poucas pessoas se interessam em obter da hierarquia eclesiástica o perdão das culpas e das penas do pecado. Provavelmente, esse Jubileu da Esperança só seria herdeiro da proposta bíblica do Jubileu no sentido bíblico se comprometesse as comunidades cristãs e seus ministros com aquele anúncio que, um sábado, na sinagoga de Nazaré, Jesus afirmou ter vindo publicar: “O Espírito de Deus veio sobre mim e me consagrou para anunciar a boa notícia às pessoas empobrecidas. Consagrou-me para trazer libertação a quem está prisioneiro, restaurar a vista às pessoas cegas e escravizadas, pôr em liberdade toda pessoa oprimida e anunciar um ano de graça (Jubileu) da parte do Senhor”. Todas as pessoas que o ouviam ficaram extremamente admiradas com o que ele dizia e se espantaram mais ainda quando ele afirmou: “Hoje isso se realiza e não é apenas para vocês, judeus, mas para toda humanidade”.
De acordo com essa proposta de Jesus, esse Jubileu da Esperança deve comprometer as comunidades cristãs com a Paz no mundo, deixar claro nossa solidariedade com o povo palestino e a denúncia do genocídio cometido pelo Estado de Israel com apoio do governo dos Estados Unidos contra a população palestina. Do mesmo modo, precisamos nos ligar à causa dos povos originários e os seus direitos coletivos. Faz parte do Jubileu conseguir que a sociedade garanta à Mãe Terra o seu descanso necessário. Assim, seria possível viver a Esperança da irmandade entre os seres humanos e na relação com todos os seres vivos.
A dificuldade para tornar realidade essa proposta de Jubileu da Terra e da Humanidade é que não vivemos mais em época de Cristandade, a não ser nos ambientes clericais nos quais as pessoas fingem viver em séculos passados e se isolam em suas ilusões de poder divinizado. Pouco importa o que propõe o papa, ou afirmam os bispos e padres, o mundo segue seus caminhos próprios e, principalmente, as gerações mais jovens se ligam mais às mídias virtuais e às agências de comunicação.
Quando a hierarquia e o clero católico perceber de fato que perdeu o seu reinado e precisa das outras Igrejas e de outras comunidades religiosas para exercer a sua missão no mundo, não haverá mais Campanhas da Fraternidade que não sejam fruto do diálogo ecumênico e não haverá mais Jubileu centralizado em Roma. Pastores católicos serão capazes de dialogar humildemente com outras Igrejas, outros grupos religiosos e com a humanidade, em geral, para a necessidade urgente de educar as comunidades e organizações de toda a sociedade para caminharmos juntos e juntas na direção do Jubileu da Esperança proclamado por Jesus. Aí sim, poderemos dizer como ele: “Hoje, se cumpre esta Palavra que vocês acabam de escutar” (Lc 4, 21).
[1] – Marcelo Barros, monge beneditino, teólogo e escritor, é assessor das comunidades eclesiais de base e de movimentos populares como o MST. Tem 65 livros publicados, dos quais o mais recente é Deslumbramentos nos encontros e desencontros da Vida, Ed. Recriar, 2024.