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Querem assassinar o gênero

Querem assassinar o gênero

Na semana passada, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou um destaque, proposto pelo PRB (Partido Republicado Brasileiro), à Medida Provisória 696/15, para retirar “a perspectiva de gênero” do novo ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos. Assim, graças aos nobres congressistas, podemos ter um ministério das Mulheres que, ao menos formalmente, não reconhecerá as desigualdades entre homens e mulheres.

(Não custa nada lembrar, nem que seja entre parênteses, que a existência desse ministério representa, por si só, um retrocesso, uma vez que até 2015 a Secretaria de Políticas para as Mulheres, assim como a de Igualdade Racial, tinha status de ministério).

Agora eu pergunto: como explicar a dupla jornada de trabalho a que estamos submetidas – dentro e fora de casa – sem entender que existe uma diferenciação hierárquica, construída socialmente, que divide responsabilidades e coloca as mulheres como principais encarregadas de lavar a louça, limpar a casa e cuidar de crianças e idosos etc.?

Para traçar um paralelo, é como se “raça/etnia” e “geração” não fossem variáveis legítimas para analisar nossas relações sociais. Pergunto novamente: como refletir sobre os absurdos índices de assassinatos no Brasil sem enxergar que atingem uma maioria de pessoas jovem, negra e que vem de bairros periféricos?

É simplesmente impossível. É escamotear a realidade.

Não à toa, a outra emenda à MP 696/15 foi a ratificação da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, o Pacto de São José da Costa Rica, que afirma o “direito à vida” desde a “concepção”. No lugar de discutirmos os cerca de 800 mil abortos ilegais realizados anualmente no Brasil, suplantamos o debate e relegamos as mulheres, em especial as pobres, à insegurança de uma interrupção clandestina.

Um repúdio similar à palavra “gênero” havia ocorrido em 2014, quando o Congresso Nacional, após pressão da bancada evangélica, retirou a expressão do Plano Nacional de Educação (PNE). À época, entrevistei a deputada federal Érika Kokay (PT/DF), uma das integrantes da Bancada Feminina, que explicou que “para aprovar o PNE nós tivemos que abrir mão de fazer um destaque na palavra ‘gênero’ porque a gente estava precisando aprovar o plano nacional, era uma conquista fundamental, importante. E foi um problema. Um acordo que a gente teve que fazer sob pena de perder o PNE inteiro”.

Afinal, por que querem banir do marco legal uma categoria de análise? Qual é o problema com “gênero”?

Bom, ao dizermos que há uma relação de gênero, percebemos, com certa facilidade, que existe um posicionamento privilegiado nessa relação, o do homem, branco, heterossexual, cisgênero, que é o sujeito hegemônico em nossa sociedade. Isso mexe com nossa objetividade e nossas subjetividades, contribuindo para desnaturalizar as opressões.

E os “de cima”, como diria Florestan Fernandes, obviamente não querem mudar sua confortável posição. Pensam então ser preciso impedir o “gênero” de existir. Querem assassiná-lo e toda a pluralidade que vem com a possibilidade de refexão.

Mas isso, nobres congressistas, é apenas tapar o sol com peneira. O ato violento de exclusão da palavra “gênero” do vocabulário legislativo, perpetrado consecutivamente nos últimos anos, não será suficiente para impedir novas existências, problematizações, rompimentos e enfrentamentos às opressões. As possibilidades se espalham mais rápido que do que vocês conseguem reagir. Assim nos mostraram os feminismos no ano passado, que das ocupações das escolas paulistas às ruas das grandes cidades com o Fora Cunha e contra o PL 5069, dominaram o debate público.

Texto de Maíra Kubík Mano, doutora em Ciências Sociais pela Unicamp e professora do departamento de Gênero e Feminismo da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Pesquisa a participação e representação política das mulheres.

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