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Deus e o Diabo na terra Brasil (Magali Cunha)

Deus e o Diabo na terra Brasil (Magali Cunha)

O Diabo é, na tradição cristã, a significativa encarnação do mal. O termo diz muito: diabolos, do grego “aquele que divide”. Enquanto Deus age para unir, harmonizar, trazer paz, o Diabo trabalha na oposição: divide, confunde, traz violência. Há variadas interpretações, religiosas e científicas, antigas ou modernas, de como se dá a existência deste mal encarnado. O que importa é como o significado do diabolos nos ajuda a refletir sobre divisões e violências que afligem o tempo presente. Entre elas está a intolerância, a aversão ao diferente, muito evocada para explicar o fenômeno social que temos vivido no Brasil.

Ataques verbais e com imagens em mídias sociais e nas ruas têm marcado campanhas eleitorais e debates de temas sociais. Políticos são hostilizados em espaços públicos. A presidente da República é atacada e ofendida na sua condição de mulher. Isto remete aos intensos casos de sexismo e de homofobia que demandam urgente atenção às questões de gênero, outra aversão para muitos.

São frequentes as manifestações de racismo: além de povoarem mídias sociais, há casos em estádios e quadras de esporte, e o mais recente, com a jornalista Maria Júlia Coutinho. Este “racismo nosso de cada dia” é vivido intensamente por negros no seu cotidiano, na escola, no trabalho, na internet, nas abordagens policiais seletivas. Estas, não poucas vezes, resultam em mortes, insanamente aplaudidas. Soma-se aqui a celebração da possibilidade de lotar ainda mais os presídios com adolescentes.

Recentemente, o ataque a Kaillane Campos, a menina que saía de um culto de candomblé no Rio, evidenciou situação de aversão religiosa. O que sempre foi uma realidade no Brasil passa a ocupar espaço nas mídias. E a maior incidência se refere às religiões de matriz africana, em estreita relação com o racismo.

Ódio na política, racismo, sexismo, homofobia, aversão à religião do outro: ações de intolerância em relevo no Brasil. Divisão, confusão e violência são suas marcas. Por isso são diabólicas. Age diabolicamente quem as promove e as pratica. E aqui, de forma contraditória, estão incluídas até mesmo lideranças religiosas que se apresentam como agentes de Deus e combatentes do Diabo. Como disse Jesus de Nazaré, “pelos frutos os conhecereis”. E os frutos que tais lideranças produzem na política, nas mídias, nas ruas, têm sido promotores de intolerância.

No entanto, a tradição cristã é inspirada no Evangelho, do grego “Boas notícias para todos”. E uma delas é a de que o Deus da Vida está sempre perto: “alegra-se com os que se alegram e chora com os que choram”. Sim, Ele chora com quem sofre a intolerância: da presidente à jornalista, do jovem pobre humilhado na revista policial ao travesti violentado. E se alegra com os sinais de esperança trazidos por seus agentes (profetas), religiosos ou não, que atuam pela superação das ações diabólicas.

Aqui evoco profetas e profetisas do segmento evangélico, justamente este que amarga hoje o emblema da intolerância. Estas pessoas não estão nas manchetes nem são convocadas pelas mídias a serem porta-vozes dos evangélicos brasileiros. Porém, dão a vida em diferentes igrejas e localidades, em organizações sem fins lucrativos, em associações de jovens e de mulheres. Cito simbolicamente alguns nomes de negros. Pastores, pastoras e outras lideranças que representam os tantos evangélicos anônimos que agem pela unidade, pela justiça e pela paz: Joaquim Beato, Melchias Silva, Marilia Schüller, Maria da Fé Viana, Welinton Pereira da Silva, Diná Branchini, Ariovaldo Ramos, Antônio Olímpio Santana, Maria do Carmo Kaká Lima, Marco Davi de Oliveira, Keila Guimarães, Ronilso Pacheco. A lista não é pequena, vocês, leitores, podem completá-la. A paz e a justiça agradecem.

Texto: Magali Cunha

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