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‘Escolas de luta’: um antídoto contra a barbárie

‘Escolas de luta’: um antídoto contra a barbárie
Em tempos de Escola sem Partido, “Escolas de luta” é um antídoto contra a barbárie. O outro antídoto é descer de nossa erudição que julga tudo desde o computador e escutar, deixar espaço de fala a quem não tem e aprender, aprender sempre

Três dias depois de que o presidente Michel Temer assinasse uma Medida Provisória para a reestruturação do ensino médio, foi lançado em São Paulo o livro “Escolas de luta” (Ed. Veneta) sobre o processo de ocupação das escolas paulistas como resposta à tentativa de reorganização escolar do governador Geraldo Alckmin. Sarcasmos da vida, o livro resgata a luta dos secundaristas de ontem que hoje se repete de novo pelo insistente e fastidioso hábito político de reformular a educação sem contar com a comunidade educativa.

A obra, escrita a seis mãos, por Antonia M. Campos, Jonas Medeiros e Márcio M. Ribeiro, faz algo muito simples, mas extraordinário ao mesmo tempo: escuta. O livro escuta. O livro resgata a sabedoria da escuta, tão esquecida estes dias de histerias coletivas e surtos políticos. Uma das mais irritantes obsessões no mundo atual, e mais ainda no mundo “facebookiano”, é opinar sobre tudo compulsivamente desde o alto de uma sabedoria dogmática sem fazer o esforço de descer para o mundo e escutar a aquele que tem algo para falar – e que, com frequência, desconstrói ou pelo menos desafia nossos preconceitos. Em vez de tentar teorizar sobre o significado da ocupação escolar e emitir abstrações desde o conforto de uma sala refrigerada de universidade, os autores se deslocaram até as escolas para fazer outra coisa extraordinária: dar voz. Escuta e fala. Entrevistas, comentários de Facebook, de Youtube. Eles, os alunos, falam e sentem através do livro. O livro é um canal de comunicação dos secundaristas com a sociedade. Não bastava falar sobre eles, era preciso falar com eles, que eles falassem conosco.

Por uma escola crítica e não fordista. Por uma escola onde o aluno tenha voz e não só livros e carteiras

Questões como as primeiras manifestações contra a reorganização, o começo do processo de ocupação e como foi se configurando a cronologia da luta secundarista, a repressão policial, as redes de solidariedade com professores e outras escolas ocupadas, as práticas de autogestão e o recuo do governador são retratadas no livro pela voz dos alunos. Mais do que ficar só no dado, Antonia, Jonas e Márcio, fazem um esforço de sensibilidade ao captar como as ocupações significaram a primeira politização consciente de muitos alunos, seu amadurecimento cidadão e sua inserção no campo da reivindicação. Porque a mobilização social não é uma dinâmica fria e inerte, tem um componente emocional, de experiência, de vida, que pulsa a cada protesto ou ação coletiva.

O livro, portanto, torna-se essencial para entender nossos adolescentes e o desenvolvimento de seu aprendizado político. Um dos fatores mais dramáticos da atual crise política é a incapacidade institucional e partidária de diálogo com a juventude, sua opacidade. “Escolas de luta” nos ensina como é importante fomentar essa interlocução com aqueles que são nosso futuro, se não queremos ficar envelhecidos na falácia de quem pensa que não tem nada a aprender dos jovens porque estes não têm nada a ensinar.

Por último, o livro traz reflexões muito ricas sobre o abismo entre a educação que temos e a que nossos jovens querem. Durante o lançamento no Instituto Pólis, no dia 24 de setembro, um dos secundaristas convidados simplificou com total clareza essa divergência: “escola é uma cadeia, mano, é linha de produção e nós quer pensar, quer ser livres”, ou, como diz um dos capítulos do livro “por uma educação que nos ensine a pensar e não a obedecer”. Por uma escola onde falemos de gênero, de combate ao racismo, de homofobia, de violência, de periferia, de desigualdade. Por uma escola crítica e não fordista. Por uma escola onde o aluno tenha voz e não só livros e carteiras. Outra educação possível, que, como conta um aluno do EE Dr. Eloy de Miranda Chaves, “não pode se limitar ao treinamento para uma prova”. Os jovens do livro pedem, exigem, suplicam por uma escola em contato com o mundo, uma escola dinâmica, que forme cidadãos críticos, autônomos e não meros operadores passivos.

“Escolas de luta” é tudo isso e ainda conta com um conjunto de fotografias sobre as ocupações que têm tanta força e expressividade como as próprias falas dos secundaristas

Em tempos de Escola sem Partido, “Escolas de luta” é um antídoto contra a barbárie. O outro antídoto é descer de nossa erudição que julga tudo desde o computador e escutar, deixar espaço de fala a quem não tem e aprender, aprender sempre.

*Por Esther Solano Gallego é doutora em ciências sociais pela Universidade Complutense de Madri e professora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

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