O problema apresentado a Jesus pelos fariseus é semelhante àquele do imposto em Lc 21, 27-38. A Lei judaica prescreveu a pena de morte para uma mulher casada, pega em adultério (Dt 22, 23-24). Mas, segundo João 18, 31, os romanos tinham retirado dos judeus o direito de condenar alguém à morte. Portanto, se Jesus dissesse que ela deveria ser apedrejada, ele contrariaria a lei civil dos romanos; se ele negasse esta pena, estaria contra a lei religiosa mosaica. É uma cilada semelhante ao dilema sobre o imposto a César em Mc 12 13-17, ou a questão sobre o divórcio em Mt 19, 3-9. Que os seus interlocutores não se interessam pela Lei se manifesta pelo fato de só acusarem a mulher e não o seu parceiro! Uma atitude machista tão comum ainda na nossa sociedade.
Não se esclarece o que foi que Jesus escreveu no chão. Alguns autores veem uma referência a uma frase em Jeremias: “Aqueles que se afastam de ti terão seus nomes inscritos na poeira, porque abandonaram Javé, a fonte de água viva” (Jr 17,13). Assim seria uma indicação que os verdadeiros culpados são aqueles que se davam o direito de condenar a mulher.
Perguntando da mulher se os seus acusadores não a tinham condenado, Jesus deixa claro que ele não se identifica com eles. Ele não veio para condenar, mas para salvar! Por isso a mulher está livre para ir – mas não para pecar de novo!
O texto ilustra mais uma vez o recado central que vimos no evangelho do último Domingo – Deus é um Deus de misericórdia, e não de condenação. Ele condena o pecado, o mal, mas não a pessoa. Como em Lucas 15, 1-2 também no texto de hoje as pessoas que mais deviam se preocupar em manifestar o rosto misericordioso do Pai, se preocupavam mais em condenar, a partir de um legalismo que desconhecia a misericórdia. Jesus, do outro lado, valoriza a Lei (pede que a mulher não continue a pecar), mas tem compaixão diante da fraqueza humana. Aliás, é notável que, nos Evangelhos, Jesus nunca é duro ou rígido com as pessoas que manifestam nas suas vidas sinais da fraqueza humana, mas é contundente com os que não têm compaixão nem misericórdia e que escondem o verdadeiro rosto de Deus através do seu legalismo e autossuficiência.
Quantas vezes nas Igrejas – até hoje – se manifesta muito mais a dureza de uma mentalidade legalista do que a compaixão de um Deus que é “rico em misericórdia?”. Neste tempo quaresmal preocupemo-nos em sermos manifestação do Deus verdadeiro, misericordioso e compassivo, a exemplo de Jesus, que soube distinguir bem entre o pecado e o pecador. “Nem eu te condeno, vá e não peca mais!”
*Por Pe. Tomaz Hughes SVD, e-mail: [email protected]