Segundo o evangelho deste domingo, o próprio Jesus não se deixa impressionar com as pequenas multidões que o seguem, despertadas pelos sinais que realiza. Os discípulos e discípulas que entendem o que significa crer em Jesus e seguir seus passos são poucos, e mesmo esta minoria acaba abandonando-o quando é acusado, preso, torturado e crucificado. Tudo recomeça a partir de um pequeno rebanho fiel e corajoso e nele encontra sua força. Quem crê em Jesus Cristo e segue seus passos tem um tesouro pelo qual está disposto a relativizar tudo o mais: o Reino de Deus.
Jesus continua pedindo que busquemos ‘bolsas antifurto’, pois onde está nosso tesouro também está nosso coração. Para seus discípulos, não há riqueza mais preciosa que o Reino de Deus. Mesmo que o Reino de Deus seja um sonho que só será pleno no futuro, a atitude cristã fundamental é a espera ativa. É isso que Jesus nos ensina hoje, lançando mão de três pequenas parábolas: os empregados que esperam a volta do patrão; o dono da casa que toma precauções contra os ladrões; os administradores que um proprietário encarrega de tomar conta da casa durante sua ausência.
Diante da resistência das estruturas injustas e da força dos hábitos arraigados, somos rondados pela tentação da passividade e da fuga espiritualista. Como não sabemos se o Senhor da história chegará antes da meia-noite ou se o Reino de Deus só se fará ver na madrugada distante e incerta, entregamo-nos ao sono da passividade, da indiferença ou da deserção. ‘Já que o Reino é de Deus, que ele mesmo abra a porta quando resolver voltar… Já fazemos muito entregando-nos à oração…’ Assim pensam alguns, para aliviar a consciência e justificar a própria inércia…
Estamos no mundo à espera de Alguém que está para voltar. Temos que estar acordados para abrir a porta quando ele chegar e bater. Precisamos esperar o Reino de Deus colocando-nos a serviço do povo de Deus. “Ficai de prontidão, em traje de serviço, e com as lâmpadas acesas.” Os que apostamos no caminho alternativo proposto por Jesus somos sim um pequeno rebanho, mas existimos para ajudar no parto da nova humanidade. Não podemos dormir sobre os efêmeros louros de um passado numericamente glorioso. A Igreja é um depósito de sementes que devem ser jogadas na terra.
É triste quando a Igreja esquece sua razão de ser e se preocupa unicamente com seus direitos, poderes e tradições. Missão do povo de Deus é empenhar-se para que a humanidade receba seu trigo na hora certa, seja atendida em seus direitos fundamentais. Festejar com os grandes do mundo, embriagar-se com as falsas liturgias do poder, bater com a vara da excomunhão os próprios irmãos – inclusive porque propõem uma teologia diferente ou reconhecem os carismas ministeriais também nas mulheres – é coisa que nos iguala às figuras mais execráveis da história. E nos faz merecer chicotadas sem número…
Estamos neste mundo como administradores aos quais se confia o cuidado da casa, a quem se pede vigilância e serviço aos irmãos e irmãs. Temos o direito de festejar e celebrar os inúmeros pequenos avanços do Reino de Deus, mas sem deixarmo-nos embriagar pelas ideologias do poder e do sucesso. Nossa condição é a mesma daquela de Abraão: vivemos na história como errantes que ainda buscam uma pátria definitiva, mas que, todos os dias, abrem as mãos no serviço aos irmãos e irmãs. Com Abraão e outras grandes testemunhas da fé, sabemos que não temos aqui morada definitiva, mas apenas tendas leves e provisórias, que podem ser armadas e desarmadas facilmente.