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O outro lado da barragem – Jasom de Oliveira

O outro lado da barragem - Jasom de Oliveira

É de conhecimento e de angústia de todos a situação de muitas cidades catarinenses frente às chuvas. Blumenau, Jaraguá do Sul, Guaramirim, Rodeio, Corupá, Massaranduba, Schroeder, Gaspar, entre tantas outras. Até a metade do mês de junho, segundo as notícias veiculadas na imprensa, 42 cidades foram atingidas pelas chuvas, sendo que 30 cidades decretaram situação de emergência. Desespero e incertezas novamente estão presentes, e em pouco tempo.

Nesta triste lista mais um nome precisa ser adicionado e que por inúmeras vezes é ignorado, e que tem papel fundamental para que a tragédia não seja pior: o outro lado da barragem.

A Barragem Norte, localizada no Município de José Boiteux, é uma das três barragens que controlam o forte fluxo de água que entra no Rio Itajaí-Açu. Para minimizar a quantidade de água que chega às cidades do Vale do Itajaí este muro precisa contê-la. A Barragem Norte foi finalizada em 1992, com capacidade de aproximadamente 355.000.000 m³ em uma área de 870 hectares. No entanto, passa despercebida pela mídia e pelas cidades que atrás deste muro têm em torno de 640 famílias que vivem na Terra Indígena Xokleng-Laklãnõ e são afetadas – direta ou indireta – todas as vezes que ocorre excesso de chuvas na região. A Terra Indígena está localizada nos municípios de José Boiteux, Vitor Meireles, Itaiópolis e Doutor Pedrinho, e organizada em oito aldeias Xokleng – Sede, Barragem, Palmeira, Figueira, Coqueiro, Toldo, Pavão e Bugio – e uma aldeia Guarani – Takuaty.

Desde o início da construção, em 1972, os impactos causados pela barragem são imensuráveis e se repetem a cada nova enchente que ocorre na região: interferência negativa nas tradições culturais, pois a comunidade que vivia unida em torno do Rio Hercílio necessitou se separar em diferentes aldeias para fugir das inundações; famílias desabrigadas; casas inundadas e condenadas; falta de água potável e alimentos; estradas interditadas; aldeias isoladas; cancelamento das aulas nas escolas; profissionais da saúde não conseguem fazer o atendimento nas aldeias; riscos de novos deslizamentos; insegurança e angústia pela próxima enchente.

Desde a década de 1980, diferentes convênios foram firmados com os órgãos públicos para que fossem tomadas medidas preventivas, corretivas e compensatórias pela destruição causada na Terra Indígena. O primeiro convênio foi assinado em 1981, o Convênio n.029, entre a Fundação Nacional do Índio – FUNAI e o extinto Departamento Nacional de Obras de Saneamento – DNOS, que foi o executor da barragem. Em 1987 foi firmado o Protocolo de Intenções entre os mesmos órgãos. Em 1992, devido à morosidade e descaso dos órgãos competentes para realizarem o que foi firmado, a comunidade Xokleng fez uma expressiva manifestação que resultou em mais um Protocolo de Intenções, agora assinado pela Secretaria de Desenvolvimento Regional, FUNAI e Governo do Estado de Santa Catarina. Em 1998, o Governo do Estado e o Ministério do Orçamento e Planejamento assinaram o Convênio n.041, referente a mais um Protocolo de Intenções, pois até 1997 o protocolo anterior não havia sido concretizado e a comunidade indígena novamente se manifestou. Em 2007 a Justiça Federal condenou a União e o Estado de Santa Catarina a cumprirem o protocolo de intenções entre os governos federal e estadual, para compensação dos prejuízos à comunidade Xokleng, pois considerou que parte das medidas não foi efetivamente cumprida. Das medidas compensatórias, conforme as lideranças indígenas, até hoje foram construídas 186 casas das aproximadamente 280 casas prometidas, não foram construídas duas pontes pênsil que seriam fundamentais para a ligação entre quatro aldeias e melhorias de estradas que dão acesso às cidades vizinhas e entre aldeias. Segundo João Maurício Farias, superintendente da FUNAI para a Região Sul, em entrevista para Elaine Tavares e postado no Youtube, é urgente a necessidade de um estudo de impacto socioambiental da Barragem Norte na Terra Indígena Xokleng-Laklãnõ.

Conforme o Jornal Santa Catarina, publicado no dia 10/06/14, O diretor de Respostas aos Desastres da Secretaria de Estado da Defesa Civil, James Rides da Silva, assegurou que a comunidade Xokleng já foi indenizada pelo alagamento das terras. No entanto, basta visitar a Terra Indígena para confirmar que as estradas de acesso ficam submersas, casas ficam alagadas, aulas continuam sendo canceladas, aldeias ficam isoladas e outras consequências que atentam a vida da comunidade indígena. Nesta última cheia na Barragem Norte foram contabilizadas quatro aldeias isoladas (Pavão, Sede, Coqueiro e Toldo); sete aldeias sem água potável da rede, somente por poço artesiano e de nascente, quem tiver; famílias que saíram de suas casas por estarem com risco de deslizamento; seis casas inundadas e uma casa que desmoronou; as quatro principais ruas de acesso e ligação entre as aldeias foram danificadas e/ou submersas, sendo que algumas até a metade do mês de junho continuam intransitáveis; com as estradas nesta situação, as crianças não têm acesso à escola; trabalhadores e trabalhadoras têm dificuldades, em alguns casos estão isolados, para irem aos seus empregos nas cidades de entorno. Em relação aos empregos, segundo informações das lideranças indígenas, em situações passadas ocorreram demissões pelo fato de os indígenas não conseguirem comparecer em seus locais de trabalho devido ao isolamento causado pelas chuvas. Segundo a Cacique Presidente da Terra Indígena, Cintia Nubia M. Machado, no ano passado a Aldeia Toldo ficou isolada por 40 dias. Felizmente ainda não foi registrada nenhuma morte.

Referente às casas alagadas, James argumenta que as casas atingidas ficam na área de alagamento da Barragem Norte. Ainda que o volume de água nunca tenha atingido a altura deste fim de semana, quando ultrapassou os 50 metros de altura, as casas dos xokleng foram erguidas dentro da área alagável. Também é importante ressaltar que entre as casas erguidas dentro da área alagável, estão as casas que o próprio Estado ergueu como medida compensatória, ou seja, o planejamento realizado para a construção destas moradias se mostrou falho. Há outras casas, também construídas pelas medidas compensatórias, que já foram condenadas pela Defesa Civil. Oficialmente existem catorze casas condenadas, praticamente a Aldeia Figueira por inteiro, a partir de um estudo de riscos realizado em 2013. No entanto, a insegurança que é visível em outras dezenas de casas assusta os moradores e deixa incerto o futuro da comunidade.

Cerca de 200 pessoas estão mobilizadas, em frente à casa de Máquinas da Barragem Norte protestando quanto ao descaso desta lamentável situação que mais uma vez está se repetindo e à morosidade de décadas para o cumprimento dos Protocolos de Intenções. Mais uma vez o povo Xokleng está se manifestando, pois como nos conta a história, se assim não o fizessem, talvez até hoje estivesse vigorando o Convênio n.029/81 e nada teria sido feito. O objetivo desta mobilização, segundo as lideranças indígenas, é de mais uma vez cobrar o que foi acordado com os órgãos públicos para que sejam cumpridas as reivindicações e sejam sanadas algumas perdas, pois todas não são possíveis. Bazilio Lili Priprá, cacique da Aldeia Barragem, relembra com tristeza momentos de sua infância onde brincava e tomava banho nas margens do Rio Hercílio, que hoje é apenas uma espécie de lagoa suja e cheia de lama. Ainda, segundo o cacique, é preciso deixar claro que a comunidade indígena não é contra a Barragem Norte, pois tem consciência de quantas vidas ela protege no Vale do Itajaí. Mas chama a atenção que outras vidas também precisam ser respeitadas e protegidas, as da Terra Indígena Xokleng-Laklãnõ.

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